"Não se nasce um pervertido, torna-se num". Marido de Gisèle admite culpa e espera perdão da mulher e dos filhos, "mesmo que seja imperdoável"

17 set, 15:23
Gisèle Pelicot chega a tribunal (Lewis Joly/AP)

Dominique Pelicot é o cérebro por detrás de um caso que está a chocar França: drogou a mulher e convidou outros 72 homens para se juntarem a ele em violações que eram filmadas e colocadas numa pasta chamada "Abuso"

Drogou a mulher e recrutou dezenas de estranhos para a violarem durante cerca de uma década. A história já se conhecia, mas Dominique Pelicot, de 71 anos, confessou tudo em tribunal, onde pediu o perdão da sua família, apresentando uma série de factos que entenderá servirem como atenuantes.

“Sou um violador”, disse o homem, em mais uma audiência do caso de Gisèle Pelicot, a vítima, que está a chocar França e o mundo.

Dominique enfrenta uma série de acusações graves, incluindo violação, violação em grupo e invasão de privacidade, já que também gravou e disseminou as imagens sexuais da mulher que, recorde-se, estava inconsciente durante os atos.

Numa audiência que tinha sido adiada devido à condição de saúde do homem, que chegou mesmo a ser hospitalizado. Por isso mesmo, e antes de começar o depoimento, o advogado de Dominique lembrou que o seu cliente estava sob medicação, acrescentando que era necessário tirar algumas pausas durante a sessão.

“Sou tão violador como os outros que estão na sala”, continuou Dominique, pedindo desculpa à mulher, mas também aos filhos e aos netos, a quem garantiu que se arrepende do que fez. “Peço o vosso perdão, mesmo que seja imperdoável”, até porque a mulher "não merecia isto".

Entre choros, o homem revelou que também ele foi alvo de violência sexual, mas quando era criança - era "difícil de suportar", disse, falando sobre o caso em que foi forçado a assistir, quando tinha 14 anos, à violação em grupo de uma mulher.

"Não nascemos um pervertido, tornamo-nos num", sublinhou.

A assistir estava a mulher, a vítima, Gisèle, que recebeu rondas de aplausos sempre que saía da sala durante os intervalos da sessão.

Foi ela que insistiu que este caso fosse levado a público, decidindo expor o marido, mas também todos os outros homens acusados de a violar, num caso que acabou por se tornar num símbolo da luta contra a violência sexual em França.

“Durante 50 anos, vivi com um homem que nunca pensei que fosse capaz de fazer estes atos de violação”, revelou a mulher, que não teve problemas em assumir-se publicamente.

Questionado se pensa que poderá, um dia, voltar para a mulher, Dominique revelou que “é importante ter esperança, porque senão acabou”. “Eu estava traumatizado. É em parte graças a ela que esqueci estes maus momentos da minha vida”, acrescentou.

Além de Dominique, outros 50 homens com idades entre os 26 e os 73 anos estão a responder em tribunal por acusações de violação na cidade de Avignon. Ao todo, e segundo confissão do marido da vítima, foram 72 os homens que participaram nestes atos.

“Quando vinham, já sabiam de tudo. Todos sabiam disto antes dos encontros”, referiu o homem, que quer provar que a mulher é “vítima e não cúmplice”.

Além da confissão de Dominique há outras provas irrefutáveis dos crimes, nomeadamente cerca de 300 fotogramas e vídeos de atos sexuais encontrados numa pasta chamada “Abuso”.

Gisèle acabou por ser alertada para o que se passava depois de ter notado que estava a sofrer perdas de memória e de dores inexplicáveis na zona genital.

O julgamento deve durar até dezembro deste ano, podendo Dominique enfrentar uma pena até 20 anos de prisão.

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