Jean-Pierre Maréchal é dos 51 arguidos e um dos detidos no caso de Gisèle e Dominique Pélicot, cujo julgamento decorre até dezembro e está a chocar França
Recusou-se a participar nas mais de 90 violações da francesa Gisèle Pélicot, mas Dominique Pélicot ensinou-lhe os seus métodos e convenceu-o a violar também a sua própria mulher. O homem que violou a mulher e convidou dezenas de estranhos a fazer o mesmo tem um 'discípulo', que lhe copiou a tática e agrediu sexualmente a esposa 12 vezes - por vezes acompanhado.
Chama-se Jean-Pierre Maréchal, tem 63 anos e é um antigo camionista de uma cooperativa agrícola. Tudo se soube durante o julgamento de Dominique Pélicot, na quarta-feira. Com a ausência do agressor no julgamento, por motivos de saúde, a audiência focou-se no 'discípulo', depois de uma investigação policial, de acordo com o Guardian.
Maréchal conheceu Pélicot através de um fórum dedicado a encontros sexuais, que foi encerrado pelas autoridades em junho – no qual Maréchal usava o pseudónimo Rasmus. Ali, Pélicot convenceu-o, tal como fez com os outros 51 arguidos, a sedar fortemente a mulher, com quem estava casado há 30 anos, e a violá-la.
Pélicot até forneceu os sedativos a Maréchal para drogar a mulher e foi a casa deste último para a violar também. “Cada vez que viajava, fornecia-lhe a medicação para a próxima vez”, revelaram as autoridades. O facto foi confirmado pelo advogado de Pélicot, acrescentando que o cliente tinha fornecido fármacos para dormir e para a ansiedade a Maréchal por quatro vezes.
A mulher do alegado 'discípulo' foi então violada e fotografada 12 vezes - tanto pelo marido como por Pélicot - entre 2015 e 2020. E Maréchal admitiu as acusações. “Ele admite os factos, diz-se culpado e merece uma pena pesada. Não vem aqui dizer que a mulher está a mentir ou que consentiu nestes encontros. De modo algum. A mulher dele foi agredida, foi violada. Mas agora temos de expor a personalidade de Maréchal em tribunal: alguém que foi violado, abusado, que contemplou orgias em sua casa...”, disse o advogado de Maréchal, ao El País.
Patrick Gontard explicou os acontecimentos com base nas origens do 'discípulo' de Pélicot, que nasceu no seio de uma família pobre, com uma mãe alcoólica e um pai violento. “Foi violado pelo pai, tal como os seus irmãos e irmãs. Um deles, de facto, não aguentou e suicidou-se. É verdade que viveu 45 anos sem reagir a estes problemas, mas houve um catalisador que trouxe tudo à superfície: o encontro com Pélicot”, contou.
O advogado atribui um “papel muito importante” dos atos do cliente ao marido de Gisèle Pélicot, já que “Maréchal era muito impressionável”, falou até em “manipulação”.
A vítima, Cilia M., não denunciou o marido, mas depôs na quarta-feira em tribunal. “Não quero que os meus filhos sofram mais. Eles são tão infelizes agora que prefiro protegê-los. Ele era um homem tão maravilhoso que não consigo esquecer esses anos. Não percebo nada”, confessou.
A mulher de 53 anos viu o marido pela primeira vez desde a detenção na sala do tribunal. “Com o meu marido, tudo era ótimo. Tudo corria sempre muito bem, ele era um pai muito protetor. É inconcebível que ele tenha feito isto. Destruiu-nos completamente”, descreveu.
Cilia M. recordou ainda ter acordado um dia a meio de uma agressão do marido, juntamente com Pélicot, em junho de 2020. A vítima abriu os olhos e encontrou um desconhecido no quarto com o seu marido, ao que se seguiu a fuga de Pélicot, lembrou. O marido justificou-se, dizendo que o desconhecido queria ver as suas cuecas. "Eu não acreditei nele, mas daí a suspeitar de uma violação? Não, era impensável”, admitiu.
Jean-Pierre Maréchal é um dos 51 arguidos no caso de Gisèle e Dominique Pélicot e um dos detidos. O julgamento está a decorrer na cidade de Avignon, no sul de França, e deve prolongar-se até dezembro.