Especialista em marcas questiona se, de facto, tudo é marca.
Há uns anos, num congresso de marketing ouvi “O ISIS é uma marca” e, confesso, entrei em modo error, com dificuldade em processar a informação. Porque “Hoje, tudo é uma marca”, justificou o mesmo orador. Aí, admito, estamos de acordo. A Coca-Cola é uma marca (registada, comercial), tal como Portugal é uma marca (nation branding), Lisboa é uma marca (city branding), e até, cada um de nós, é uma marca (personal branding). Mas, sempre que tento fazer esse exercício, de olhar para o terrorismo ou para um grupo terrorista enquanto marca, continuo, ainda hoje, a dar error. Não processo. Que me desculpem os senhores do marketing e do branding. Eles são os especialistas. Eu apenas uma opinião.
Percebo, em teoria. Do ISIS [o autodenominado Estado Islâmico] ao Hamas… you name it, há todo um trabalho de branding, ou se quisermos, o terrorismo “profissionalizou-se”, nos últimos anos. Tal como as Marcas que consumimos, passaram a cumprir certos códigos associados à Identidade de marca – um Logotipo e Símbolos (tal como o famoso “the swoosh”, aquela espécie de vírgula que nos faz identificar de imediato a Nike); a figura do Líder (tal como um CEO); o Mito à volta da sua criação (como o da Apple em que tudo começou numa garagem); Storytelling e Brand Voice na comunicação; crenças (não consigo chamar valores); e até o Poder de Sedução (admito, até podem ser um love brand para os seus seguidores…).
Também é verdade que nem todas as marcas nascem coletivamente boas, igualitárias, e que hoje são uma co-criação, entre si e a sua comunidade. O que dá espaço à teoria. Por muito perverso que seja, o terror (de regresso a Israel e à Palestina), tem o estranho poder de captar a nossa atenção, até a imaginação de alguns, num tempo em que as redes sociais são a arma de propaganda contemporânea. De marginal, o terrorismo passa, na teoria, a Marca.
Tudo fica ainda mais complexo se pensarmos que as marcas (vamos aqui incluir então as dos grupos terroristas) fazem parte do que se convencionou chamar de mercado. Onde a lei da procura e oferta determina um preço. O mundo já vai estranho, acaba de ficar só mais estranho. O preço é uma fatura pesada. São vidas. Muitas só nos últimos dias. Na Era Pós-Propósito em que vivemos, como apontam os trend forecasters, às marcas exige-se mais do que palavras, mas sim ações concretas que melhorem as nossas vidas. Lembram-se do “I shop therefore I am” de Barbara Kruger, artisticamente insinuando que, enquanto sociedade já não nos definimos pelo que pensamos, mas sim pelo que consumimos? Eu não compro.
É perturbador. Mas real. Há até quem veja o terrorismo como inspiração para o branding de uma Marca. Recentemente, Victoriano Izquierdo, CEO da Graphext-Data Science, usou Pablo Escobar e a assinatura "Data o Plomo" [semelhante ao lema "Plata o Plomo", "prata ou chumbo", ou seja, dinheiro ou morte] para a marca comunicar a importância dos dados (em inglês, "data") nos processos de decisão. À perplexidade do mundo por todas as vítimas de Escobar, pediu desculpa, afinal foi só uma ideia, “uma brincadeira que rimava” e que lhe pareceu “muito cool”.
E é isto. O Mundo. Marcas. Ideias Cool. Mas só compra quem quer.