Os recentes desenvolvimentos nas áreas de Análise de Dados e Inteligência Artificial (IA) têm aberto novas perspetivas para o uso destas ferramentas, nomeadamente, por parte das instituições financeiras. Estas instituições financiam uma multiplicidade de clientes, com uma organização complexa, num ambiente global com riscos geopolíticos crescentes. Mas será que estes desenvolvimentos podem substituir o papel central dos analistas de crédito ou serão antes ferramentas de suporte à análise e decisão?
O risco de crédito define-se como a possibilidade de uma contraparte falhar no cumprimento das suas obrigações contratuais, resultando em perdas financeiras para o credor. Sendo a concessão de crédito uma das principais atividades dos bancos, a avaliação do risco de crédito desempenha um papel central no processo de financiamento por parte destas entidades. Para tal, equipas com especialização em diferentes indústrias e tipos de financiamento dedicam-se a esta análise.
A análise de risco de crédito tem em conta diversos fatores que vão desde as características do próprio credor e do seu desempenho – refletido nas suas demonstrações financeiras –, passando pela indústria onde este se insere, até às condições económicas da região onde opera. A análise, enquanto elemento-chave para a sustentabilidade do credor e tendo em conta os aspetos regulatórios, é realizada periodicamente e culmina com uma notação de crédito que mede o seu grau de risco.
Contudo, a realidade atual acarreta diversos riscos. As próprias empresas atingiram uma dimensão global, estando expostas à incerteza geopolítica, capaz de afetar as condições económicas globais e os próprios mercados financeiros, e impactando a capacidade de estas cumprirem as suas obrigações de crédito. Estas mudanças podem ser repentinas e imprevisíveis. Quantas vezes não fomos já surpreendidos pela falência súbita de empresas quando não havia nenhum indicador nesse sentido? Estes riscos sugerem a necessidade da utilização de novas ferramentas que permitam melhorar a deteção atempada de situações de eventual incumprimento.
Big Data, Machine Learning e Inteligência Artificial são conceitos relativamente recentes e podem ser parte da solução. O desenvolvimento de ferramentas de análise de grande volume de dados e Inteligência Artificial pode melhorar o processo de decisão dada a sua capacidade de processar de forma rápida e eficiente dados que permitam auxiliar a tomada de decisão, desenvolver modelos preditivos mais precisos, identificar padrões suspeitos que podem indicar atividades fraudulentas, entre outros. Estas ferramentas podem também automatizar tarefas repetitivas, libertando tempo para os analistas se focarem em tarefas mais estratégicas.
Finalmente, estas ferramentas permitem, sobretudo, a qualquer momento e em tempo real, analisar diferentes fontes de informação e identificar eventos relevantes e sinais iniciais de aumento de risco, permitindo uma ação imediata.
Mas será que a IA tem potencial para substituir os analistas de crédito?
Ficou claro que estas ferramentas conseguem automatizar tarefas e fornecer inputs para os analistas de risco de crédito, gerando eficiência no uso do capital humano. Contudo, a substituição total dos mesmos parece improvável. O julgamento humano deve prevalecer na validação dos dados gerados por IA, na interpretação tendo em conta o contexto e na quantificação do risco que daí advém e que está também dependente de fatores imprevisíveis como o sentimento e a própria ação humana.
Além disso, estas ferramentas, apesar de conseguirem detetar outliers, podem ter um efeito perverso ao considerar uma variação fora do comum por outlier, ainda que essa possa ser real e perfeitamente justificada na leitura dos restantes dados existentes.
Adicionalmente, a IA não consegue substituir os analistas na relação com os diferentes stakeholders, quer sejam decisores dentro da empresa, quer os próprios clientes que são também uma fonte de insights absolutamente necessária para a compreensão das suas necessidades e da estratégia e saúde financeira da sua empresa, o que é fulcral para o processo de concessão.
A análise de crédito é multidisciplinar, depende de inúmeros fatores e enquadra-se num contexto regulatório complexo em que só a análise humana parece ser capaz de atuar tendo em conta todos os parâmetros necessários, incluindo fatores qualitativos.
Assim sendo, no panorama atual, a análise de risco de crédito a empresas é cada vez mais crítica para as instituições financeiras. O uso de novas ferramentas tecnológicas parece sobretudo complementar o trabalho dos analistas, gerando eficiência, fornecendo dados com maior precisão e tornando mais rápida a análise e a deteção prévia de instabilidade, contribuindo assim para a sustentabilidade do sistema financeiro.