São Francisco pondera indemnizar negros com milhões de dólares por "décadas de escravidão e discriminação"

CNN Portugal , MCP
17 mar 2023, 11:25
São Francisco reparations (AP Photo/Jeff Chiu)

Se a medida avançar, será a primeira grande cidade a indemnizar a comunidade negra pelos erros do passado

A cidade de São Francisco, na Califórnia, Estados Unidos, está a ponderar indemnizar a comunidade negra por décadas de racismo.

Mais de 100 recomendações, incluindo pagamentos de cinco milhões de dólares (cerca de 4,7 milhões de euros) a cada cidadão negro elegível, ou mesmo a eliminação de dívidas particulares e incidências tributárias, foram apresentadas ao Conselho de Supervisores de São Francisco esta terça-feira. Os representantes do conselho aplaudiram as propostas chegando mesmo a afirmar que o dinheiro não deveria ser impedimento para fazer a coisa certa.

Este tipo de indemnizações não se concentram na escravidão, mas na discriminação que levou a que, nos anos 50 e 70, numa requalificação da cidade, fossem demolidos bairros negros e desalojadas cerca de 20.000 pessoas “em nome do progresso económico”. 

Em São Francisco, a comunidade negra já representou 13% da população da cidade, mas mais de 50 anos depois passou a representar 6% dos residentes e ainda 38% dos sem-abrigo. 

Os defensores do plano dizem que é necessário corrigir o histórico de escravidão e de políticas racistas dos EUA que, segundo eles, prejudicaram desproporcionalmente os negros americanos em termos de pobreza, problemas de saúde, questões criminais e situação económica.

Mas existem fortes críticas financeiras às propostas, sobretudo de liberais políticos que rotulam a questão como um pesadelo financeiro e político.

Os críticos dizem que os pagamentos não fazem sentido num Estado (Califórnia) e numa cidade que nunca escravizaram os negros. Os oponentes às propostas dizem que os contribuintes que nunca foram donos de escravos não deveriam ter de pagar, através dos seus impostos, a pessoas que não foram escravizadas.

Do outro lado, argumenta-se que essa é uma visão que ignora evidências históricas que indicam que mesmo depois da escravidão nos EUA ter sido oficialmente abolida, em 1865, as políticas e práticas do governo funcionaram de forma a que várias pessoas negras fossem presas, sofressem taxas mais altas, que lhes fosse negado o acesso a empréstimos residenciais e comerciais e também limitado onde poderiam trabalhar.

De acordo com a NBC News, Justin Hansford, professor da Universidade de Direito de Howard, diz que nenhum plano de reparação municipal terá dinheiro suficiente para corrigir os erros da escravidão, mas que aprecia qualquer tentativa de “genuinamente, legitimamente, autenticamente,” resolver problemas. E isso inclui dinheiro, acredita.

“Se se vai tentar pedir desculpas, precisam de falar a linguagem que as pessoas entendem, e o dinheiro é essa linguagem”, afirmou.

De acordo com as recomendações propostas, os cidadãos elegíveis devem ter pelo menos 18 anos e serem identificados como “negro/afro-americano” em documentos públicos há pelo menos 10 anos.

Mas há mais critérios, como o cidadão ter nascido ou migrado para São Francisco entre 1940 e 1996 e morar na cidade há pelo menos 13 anos; ter sido deslocado da cidade pela renovação urbana entre 1954 e 1973, ou ser descendente de quem o foi; frequentar as escolas públicas da cidade quando havia segregação; e ser descendente de uma pessoa escravizada.

Evanston, em Chicago, tornou-se a primeira cidade dos Estados Unidos a pagar estas indemnizações. 

Em São Francisco, a análise adequada do custo das propostas ainda não foi concluída.

Relacionados

E.U.A.

Mais E.U.A.

Patrocinados