Ao cuidado das cidades de Portugal: peguem em "todo o vosso dinheiro" e leiam isto

9 dez 2022, 22:14
Mau tempo

Portugal tem sido palco de fenómenos climatéricos extremos e as chuvas que deixaram cidades alagadas nos últimos dias (e não só) são prova disso mesmo. Este fenómenos vão repetir-se e vão ser piores

“As mudanças climáticas existem, estão para ficar e Lisboa teve três fenómenos desta dimensão desde outubro", disse Carlos Moedas, presidente da Câmara de Lisboa, durante uma visita aos locais inundados quarta-feira. E facto é que, nesse dia, em poucas horas choveu mais de metade da média do que chove normalmente em todo o mês de dezembro na cidade.

A chuva intensa inundou casas, garagens, lojas e transformou ruas em rios. Uma pessoa morreu (não em Lisboas mas em Algés). "Tivemos mais de 300 ocorrências em Lisboa. Basicamente choveu entre as 17:00 e as 01:00 87 milímetros de água, algo que não se via desde 2014", salientou Moedas. 

E a previsão é que este tipo de fenómenos vai passar a ser mais frequente e mais grave. O motivo? Esse mesmo: alterações climáticas. Ora, segundo explica o investigador e especialista em alterações climáticas Pedro Garrett, por cada grau de aquecimento médio global temos um aumento da humidade da atmosfera de 7%. "Significa isto que uma atmosfera mais húmida - e também provocada por um oceano mais quente - tem mais energia e, quando essas massas mais húmidas chegam à parte continental, transformam-se em precipitação intensa - que dá origem a cheias urbanas. Além disso, o aquecimento global faz com que seja mais difícil de prever e de controlar este tipo de chuvas porque são muito localizadas", aponta.

"Se formos analisar estes fenómenos, verificamos que estão a aumentar. E temos de questionar o porquê. E sim, em termos de frequência e intensidade têm vindo a aumentar e não há dúvidas de que o aquecimento global tem contribuído e amplifica estes fenómenos", afirma Pedro Garrett.  O mesmo defende Luís Miguel Costa: "É um facto - a temperatura média global está a aumentar e isso faz com que os ecossistemas se estejam a alterar". E a prova de que somos nós que estamos a mudar esse ecossistema é quase irrefutável, afirma: "Só os céticos mais extremos é que podem pôr isso em causa. 

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Apesar de estarem por trás das chuvas intensas como as que assistimos esta semana, as alterações climáticas não são as únicas responsáveis pelo resultado calamitoso na região de Lisboa e arredores. Até porque, neste caso em específico, há vários factores a ter em consideração, como o estado da maré e a drenagem da própria cidade.

"As alterações climáticas potenciam um fenómeno que já existia. Depois, a ação humana também tem impacto - e a verdade é que o que tem vindo a aumentar são os danos", indica Pedro Garrett. Na noite de quarta-feira houve uma combinação destes três factores em Lisboa: a maré cheia coincidiu com uma queda abundante de chuva e com uma drenagem que se revelou ineficaz.

"A prevenção é fundamental. Fala-se muito dos túneis de drenagem, mas há também quem defenda o conceito de cidades-esponja, com espaços verdes que façam a drenagem", defende Pedro Garrett, indicando que em Lisboa já há "pequenas florestas" que fazem esse trabalho e que até na Praça de Espanha o jardim foi pensado para responder a esse tipo de fenómenos.

"Hoje, quem não estiver a pôr todo o seu dinheiro nesta área de tentar saber como pôr o nosso mundo a funcionar de uma forma melhor, principalmente nesta área das alterações climáticas, vai estar atrasado. É o grande dilema da nossa geração", defende Luís Miguel Costa.

Ainda assim, a prevenção (apesar de ter melhorado) tem-se revelado insuficiente e, para os especialistas, o resultado não surpreende. "As áreas de maior vulnerabilidade estão identificadas. Não existe um problema de não saber onde é que os maiores impactos vão ocorrer. As zonas onde ocorreram estão perfeitamente identificadas há já algum tempo, por isso não é uma surpresa", afirma Pedro Garrett.

Ora, o plano existe mas ainda não se executou. Depois de uma noite preocupante na capital, Carlos Moedas apontou a soluções futuras e destacou a importância dos túneis de drenagem previstos para Lisboa: são dois túneis, um que irá desde Campolide até Santa Apolónia e outro entre Chelas e Beato, permitindo "escoar toda esta água em caso de chuva, com reservatório de 17 mil metros cúbicos". Uma infraestrutura que irá preparar Lisboa para o futuro, para que "estas situações não aconteçam na nossa cidade", sublinhou.

Mas a sociedade também pode ser um ator ativo na gestão do risco, defende Pedro Garrett. "Apesar dos avanços, tenho convicção que existe espaço para uma melhoria dos sistemas de alerta, tornando a informação dos impactos mais democratizada, para que as varias entidades - como o IPMA, a Proteção Civil, etc - consigam acionar os planos de prevenção e de salvamento", encorajando sempre a prevenção como base. "Por exemplo, na Baixa de Lisboa todas as lojas antigas têm um taipal. Logo aí já estão a prevenir."

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