Já todo o país aderiu aos violentos protestos que se fazem sentir há vários dias
Lixo por todo o lado, ruas em chamas e violentos confrontos. Os protestos contra a idade da reforma em França não param, e o chumbo das duas moções de censura ao governo não veio acalmar os ânimos.
Com a aplicação do artigo 49:3, permitindo que a lei passe sem ser votada pelos deputados, Emmanuel Macron ficou muito mais perto de conseguir mesmo o aumento da idade da reforma de 62 para 64 anos.
Palco de tudo desde o início, Paris atravessa uma greve no setor da recolha do lixo, deixando as icónicas ruas da capital francesa pejadas de sacos pretos em frente a restaurantes, incluindo nos Campos Elísios, a avenida mais requisitada da capital.
Para lidar com a situação a autarquia de Paris ativou uma "célula de crise", depois de cinco noites seguidas de violentos protestos e de caos na capital. Trata-se de uma unidade que também esteve em funções durante a fase mais aguda da pandemia de covid-19 e durante as vagas de calor do último verão. Além da presidente da câmara, Anne Hidalgo, estarão também no grupo os seus vereadores e os responsáveis dos diferentes bairros da cidade.
O objetivo passa por "tomar as decisões necessárias para assegurar a ordem e a continuação dos serviços públicos", explicou a autarquia.
À agência AFP a câmara esclareceu que o grupo tratará dos assuntos mais graves, como a rutura na recolha do lixo, que sofre de problemas há quase duas semanas. Além disso, a "célula de crise" também servirá para ajudar os diferentes estabelecimentos durante os protestos.
J'ai pris la décision d'activer la cellule de crise de Paris qui mobilisera les adjoints, les maires d'arrondissement, le secrétariat général de la Ville et les directeurs concernés. Elle se réunira tous les jours.https://t.co/oD4eu9M8M8
— Anne Hidalgo (@Anne_Hidalgo) March 21, 2023
De um ponto de vista político a câmara referiu ainda que a socialista Anne Hidalgo apelou à calma e pediu ao governo que deixe cair a reforma, entrando num diálogo com os parceiros sociais.
Um cenário que já extravasou as ruas da maior cidade do país. A norte, em Le Havre, cerca de 70 grevistas de vários sindicatos e setores colocaram fogo a paletes em frente ao Centro Técnico Comunitário, que gere o lixo da cidade, bem como as águas residuais. Os manifestantes concentraram-se em frente ao porto e à zona industrial, prometendo que vão continuar a lutar pelos seus direitos.
"Colocámo-nos em posição às 03:30 para que a fábrica da Renault não conseguisse arrancar com o turno da manhã", afirmou um dos responsáveis da CGT local à agência AFP, lembrando que o Estado é um dos acionistas da marca de carros.
Já em Fos-sus-Mer, no sul, foram os trabalhadores de várias refinarias a entrar em paralisação, impedindo o normal funcionamento das operações de transformação de petróleo, bem como o carregamento de vários navios.
A violência dos protestos provocou ferimentos graves em três agentes da autoridade, sendo que dois deles tiveram mesmo de ser levados ao hospital.
O ministro do Interior revelou que já foram detetadas "mais de 1.200" manifestações espontâneas desde quinta-feira. Gérald Darmanin sublinhou que muitos dos protestos são "violentos", confirmando que têm surgido em todo o território. Além de Paris ou Le Havre, também Marselha, Montpellier e outras cidades de maior dimensão têm sido palco de confrontos.
O governante manifestou "total apoio" à polícia, acrescentando que já foram feridos quase 100 agentes. As forças de segurança enfrentaram "um conjunto de ações não declaradas, muitas delas violentas, como tentativas de atear fogo a edifícios das autarquias ou do parlamento", explicou Gérald Darmanin.
Questionado sobre aquilo que muitos dizem ser detenções arbitrárias, o ministro reiterou que existe um "uso proporcional da força necessário para parar de imediato os eventos que possam quebrar as regras".
Só no primeiro dia foram detidas 292 pessoas, a grande maioria delas pela participação no ajuntamento da praça Concorde. Desses detidos, apenas nove foram acusados, com os restantes a saírem em liberdade sem sequer serem ouvidos por um juiz.