Presidente da ANEPC revela que a situação era esperada e discutida pelas autoridades há vários dias
O vasto número de incêndios registados em Portugal, nomeadamente no período noturno, leva as autoridades a suporem que há mais do que fagulhas ou descuidos por detrás da tragédia que afeta o Centro e o Norte de Portugal desde o fim de semana.
O primeiro-ministro disse-o com palavras bem fortes: há mãos “criminosas” em Portugal que respondem a “interesses”. Luís Montenegro não concretizou, mas deixou no ar que o problema tem uma origem maior do que aquilo que se conhece.
O presidente da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) concorda com esta visão. Em entrevista à CNN Portugal, José Manuel Duarte da Costa sublinhou que, perante tamanha dimensão de focos de incêndio, há “alguma preponderância de mão criminosa”.
Sobre o combate e a prevenção dos incêndios, que já provocaram sete mortos e destruíram quase 70 mil hectares em todo o país, além de dezenas de habitações, o responsável admite que esta era uma situação já esperada, até porque vinha sendo referida desde dia 12 de setembro.
“A situação começou a ser gizada, em termos de previsão, desde o dia 12, nos briefings diários que fazemos”, indica, falando também numa coordenação com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).
“Nós tínhamos a consciência do que haveria ou que iríamos atravessar, um período relativamente ao risco de incêndio com uma complexidade muito elevada”, acrescenta, sublinhando que as autoridades decidiram, por isso, subir os estados de alerta para laranja e vermelho, até para garantir maior disponibilidade de meios.
De resto, como diz Duarte da Costa, esses alertas servem mais para dentro do que para fora, já que cabe ao IPMA dar esses alertas à população. Assim, foi também nesse dia 12 que o Governo recebeu a informação de que viria aí uma altura difícil e complexa, até porque a Proteção Civil avisou logo para a necessidade de se elevar o estado alerta, que viria a ser ativada no domingo.
O presidente da ANEPC defende o timing da decisão pelo facto de os meios terem de ser empenhados quando são mesmo necessários. “Foi no domingo que se reuniram as condições meteorológicas necessárias, porque ao elevarmos [o estado de alerta] estamos a disponibilizar mais meios e mais capacidade financeira do dinheiro de todos os contribuintes para meter num dispositivo”, afirma.
Já sobre a decisão efetiva e a sua localização no tempo, Duarte da Costa remete para o Governo. Ainda assim, o responsável sugere que a situação de alerta foi ativada “muito a tempo”.
A mesma lógica que o presidente da ANEPC aplica à ativação do mecanismo europeu, que permitiu a Portugal receber quatro parelhas de aviões Canadair vindos de Espanha, França, Itália e Grécia. “Quando chegamos segunda-feira de manhã e vimos um incremento muito elevado das ocorrências, foi aí que se fez o pedido, que foi prontamente aceite”, explica, referindo que esta possibilidade já tinha sido discutida com Bruxelas.
Duarte da Costa rejeita, assim, que esta ativação tenha sido feita num cenário de esgotamento da capacidade nacional, mesmo que se tenha chegado a uma situação “mais limite”, mas que não implicou perdas de tempo no combate às chamas.
Sete pessoas morreram e pelo menos 40 ficaram feridas, duas com gravidade, nos incêndios que atingem desde domingo as regiões norte e centro do país, nos distritos de Aveiro, Porto, Vila Real e Viseu, e que destruíram dezenas de casas e obrigaram a cortar estradas e autoestradas, como a A1, A25 e A13.
A área ardida em Portugal continental desde domingo ultrapassa os 62 mil hectares, segundo o sistema europeu Copernicus, que mostra que nas regiões Norte e Centro, atingidas pelos incêndios desde o fim de semana, já arderam 47.376 hectares.
O Governo declarou situação de calamidade, nível máximo de intervenção previsto na Lei de Bases da Proteção Civil, em todos os municípios afetados pelos incêndios nos últimos dias.