Falha protocolar ou demonstração de poder? Primeira-ministra da Finlândia "perdida" a olhar para quadros enquanto esperava pelo presidente croata

23 jun 2022, 12:31
Sanna Marin

Especialistas admitem que o presidente croata pode ter aproveitado para demonstrar "desagrado" com a candidatura finlandesa para aderir à NATO

A visita da primeira-ministra da Finlândia à Croácia, na segunda-feira, ficou marcada por uma situação caricata. No momento em que Sanna Marin se preparava para uma reunião com o presidente croata, com a adesão da Finlândia à NATO na agenda, foi surpreendida com o fecho das portas do gabinete de Zoran Milanović.

Um vídeo divulgado por um dos jornalistas no local mostra a primeira-ministra finlandesa visivelmente desconfortável com a situação, deambulando pela sala e observando os quadros que adornavam as paredes para passar o que pareceram uns longos dois minutos até finalmente se abrirem as portas do gabinete presidencial.

Em conferência de imprensa conjunta, logo após a reunião, Sanna Marin foi questionada pelos jornalistas sobre esta situação, ao que respondeu, com a naturalidade que lhe é característica: “Quero focar-me nos problemas. Dois minutos da minha vida não é assim tanto tempo.”

Apesar da resposta peremptória da primeira-ministra, o episódio acabou por se tornar viral e ficaram no ar as dúvidas do que se terá passado.

Demonstração de poder ou falha protocolar?

Questionado pela CNN Portugal, o embaixador Martins da Cruz adianta duas hipóteses: ou foi uma falha protocolar ou uma “demonstração de desagrado” por parte do presidente croata em relação à candidatura finlandesa para aderir à NATO, lembrando que Zoran Milanović é manifestamente contra essa adesão.

“Se [o presidente croata] fez como uma demonstração de desagrado pela candidatura da Finlândia à NATO, isso é useless [irrelevante], não tem quaisquer consequências, porque o presidente da Croácia não tem competências em política externa”, salienta, acrescentando que, se for esse o caso, também é uma demonstração de “falta de educação” por parte do chefe de Estado.

Helena Ferro Gouveia, especialista em assuntos internacionais, considera que este episódio se tratou “claramente de uma quebra protocolar”. “Claramente isto não é uma situação normal, é uma quebra de protocolo”, sustenta, lembrando as imagens em que Sanna Marin surge "um bocadinho perdida".

Ainda assim, a especialista admite a possibilidade de esta “espera relativamente longa” poder ser uma espécie de “castigo” pela candidatura da Finlândia à NATO. Mas este é apenas um “exercício especulativo”, sublinha, acrescentando que não dispõe de dados para fazer uma avaliação nesse sentido.

A semelhança com o "sofagate"

No caso do ‘sofagate’, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, foi obrigada a ficar de pé durante uma reunião com o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, e com o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, que se apressaram a sentar nas duas únicas cadeiras disponíveis.


Charles Michel (à esq.), o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan (no meio), e Von der Leyen (à dir.) (Press Presidential Office/EPA)

Helena Ferro Gouveia insiste que, neste caso, não tem dados para avaliar se este poderá ser um novo ‘sofagate’: “No caso de Von der Leyen, tratou-se claramente de um caso de misoginia. Aqui não tenho elementos para avaliar nesse sentido.”

“Pode haver aqui alguma misoginia e algum castigo pela forma verbal como Sanna Marin tem lidado com as questões internacionais e como se tem afirmado como uma das líderes do momento”, acrescentou, salientando que este conflito na Ucrânia fez sobressair uma “frente unida de líderes femininas”, como a própria Sanna Marin, a primeira-ministra da Suécia, Magdalena Andersson, e a primeira-ministra da Moldova, Natalia Gavrilița.

“Se este atraso tem alguma coisa que ver com isso? É uma leitura que pode ser feita, atendendo à forma como as lideranças femininas são castigadas”, concluiu, lembrando que “há vários estudos” que indicam precisamente isso.

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