Viena começou em Basileia: três anos para preparar o sonho

27 mai 2017, 21:06
Juve-FC Porto, 1984

A ideia é unânime entre quem esteve nas duas finais: o insucesso de 1984 foi vital para construir a equipa campeã de Viena

A distância entre Basileia e Viena?

Para a normalidade das pessoas, depois de uma pesquisa no Google, são pouco mais de 800 quilómetros. Para os portistas, depois de uma pesquisa na memória, são três anos e uma nova postura.

Em 1984, três temporadas antes de erguer a Taça dos Campeões Europeus, o FC Porto estreou-se em finais europeias, na extinta Taça das Taças, em Basileia, na Suíça. É, até hoje, a única derrota portista em finais internacionais, se excluirmos a Supertaça, que tem características distintas. É comum dizer-se que serviu de lição. E a história prova-o.

Jaime Magalhães, por exemplo, esteve nas duas finais. De Basileia guarda a «grande réplica dada à Juventus». «Devíamos e merecíamos ganhar aquele jogo. Não tivemos a sorte do jogo e do árbitro», comenta.

Mas já lá vamos. Antes, as semelhanças com Viena. Pela frente estava um rival superfavorito. «A Juventus era praticamente a seleção de Itália, mais o Boniek e o Platini», sublinha João Pinto, capitão.

No seio portista, a alegria de chegar à final superava o desejo de a vencer. João Pinto assume isso mesmo: «Na final de 84 só o chegar lá, para nós jogadores, já foi uma grande festa. Com o decorrer do jogo e com o que se passou, no balneário já dizíamos que se nos tivéssemos preparado melhor mentalmente, o resultado tinha sido outro. Em 1984 fomos para uma festa, em 87 já foi diferente.»

Eduardo Luís também esteve nas duas finais. Diz que no espaço de três anos mudou «o tempo e a experiência». «Em 84 éramos mais jovens e menos experientes. A equipa da final de Basileia era composta por portugueses, essencialmente, sem contar com o Walsh. Mas todos, ou quase, internacionais», sublinha.

A mesma ideia é partilhada por Jaime Magalhães, que enumera o grupo. «Era quase só portugueses, a começar no Zé Beto e a acabar no Vermelhinho. E também com o Gomes, Sousa, Frasco...», recorda.

De facto, o onze portista na primeira final europeia da sua história tinha sangue 100 por cento lusitano.

O onze da final de Basileia: Zé Beto; João Pinto, Eurico, Lima Pereira e Eduardo Luís; Jaime Pacheco, Frasco e António Sousa; Jaime Magalhães, Fernando Gomes e Vermelhinho.

Quatro jogadores repetiram a titularidade de Basileia em Viena (João Pinto, Eduardo Luís, Sousa e Jaime Magalhães). Frasco passou de titular a suplente utilizado, Zé Beto não saiu do banco. Lima Pereira e Fernando Gomes ficaram de fora por lesão, Jaime Pacheco foi até Viena mas não entrou na lista final, pois também recuperava de uma longa paragem. Eurico e Vermelhinho já não estavam no FC Porto.

Sousa e Pacheco em ação na final de Basileia

Na final contra o Bayern Munique surgiram Mlynarczyk, Celso, Inácio, Quim, André, Madjer e Paulo Futre. Outras armas, outras nacionalidades. O FC Porto começava a ser global.

O onze da final de Viena: Mlynarczyk; João Pinto, Celso, Eduardo Luís e Inácio; Quim, André e António Sousa; Jaime Magalhães, Madjer e Paulo Futre.

Quanto ao jogo, Eduardo Luís explica os motivos do insucesso: «A final não foi vencida porque, além da infelicidade que tivemos pela equipa que defrontámos, tivemos, na altura, uma arbitragem que não foi a melhor e tivemos a infelicidade de ter um Zé Beto muito intranquilo perante algumas situações de jogo que deram os golos da Juventus.»

O resumo do encontro:

«Com o Quim e o André, o FC Porto nem à Taça UEFA vai!»

Apesar da ideia partilhada por todos sobre a importância da experiência de Basileia para o sucesso em Viena, Eduardo Luís vai mais longe. Ou mais atrás, se preferirem.

«No fundo, a equipa começou a construir-se em 1982, depois de Pinto da Costa se tornar presidente e Pedroto reaparecer no FC Porto», defende.

A verdade, porém, é que, mesmo que a ideia do antigo central faça sentido, a transição Basileia-Viena não foi tranquila. Aliás, logo no defeso seguinte, os dragões perdem Jaime Pacheco e Sousa para o rival Sporting. Viriam a recuperá-los a tempo da glória na Taça dos Campeões. Mas, até lá, era preciso remendar a equipa.

André foi um dos que chegaram e lembra-se bem do que ouviu na altura: «Havia muito ruído.»

«Diziam que não era com o Quim do Rio Ave e o André do Varzim que o FC Porto ia lá. Que nem ir à Taça UEFA conseguiria. Fomos campeões com 12 pontos de avanço», atira o antigo médio. André e Quim foram, como se sabe, titulares na final de Viena.

O sucesso interno fez o grupo pensar que poderia ser possível repetir Basileia, com outro desfecho. André diz mesmo que aquele grupo «só pensava em ganhar, ganhar ganhar.» «E se ganhamos ao Benfica ou ao Sporting por que não havemos de ganhar ao Bayern ou às equipas que nos aparecerem em prova?», questiona.

«Em 87 levávamos a lição melhor estudada»

A diferença maior entre Basileia e Viena esteve, em suma, na atitude portista perante o jogo.

António Frasco lembra, por exemplo, que o plano foi semelhante, no pré-jogo: «Não houve muitas mudanças na preparação. Antes até fizemos um jogo treino contra os juniores, onde o Fernando Gomes se lesiona e fica impedido de participar na final. A preparação foi normal. Só que nós éramos uma equipa mais madura e reforçada com jogadores mais fortes, como o Madjer, o Futre ou o André. Também o Celso, outro jogador muito poderoso. Todos juntos estávamos mais fortes.»

Apesar da preparação semelhante, houve diferenças. Jaime Magalhães explica: «Em 87 já íamos com a lição estudada para defrontar um Bayern colossal.»

A diferença foi, enfim, essa perceção de que era possível bater o pé ao gigante. «Nas cabeças deles nunca pensaram em perder contra o FC Porto, que não era conhecido na altura. Começou a ser conhecido desde 1984», acrescenta Jaime Magalhães.

De equipa de bom futebol e perdedor honrado, o FC Porto passou a campeão europeu. Com três anos e 800 quilómetros a separar as duas histórias. E a curiosidade de, pelo meio, quase em linha reta, encontrar o gigante que iria tombar, também, pela experiência da batalha perdida.

 

Patrocinados