«Para mim a questão não está na idade, está na qualidade»

15 mai 2015, 10:24
Fernando Santos (foto: Paulo Sampaio)

Fernando Santos responde aos leitores

Lançámos o desafio e os leitores aceitaram-no. Dezenas de perguntas para Fernando Santos, sobre temas muito diversos, da atualidade da seleção às questões mais estruturais do futebol português. A seleção que fizemos enquadra-se em cinco grandes temas. A filosofia da seleção, a renovação, os critérios para escolher jogadores, a proteção dos jogadores portugueses e o futuro de uma posição muito particular, a de ponta de lança. Ao longo da conversa, Fernando Santos explica as suas ideias de forma aberta. E deixa muitas pistas.

Neste artigo, os leitores perguntam sobre a chamada de novos jogadores à seleção e falam de renovação. Ainda os critérios do selecionador para escolher um jogador em vez de outro. Fernando Santos explica os seus princípios, fala abertamente do seu processo de escolha como selecionador e imagina um mundo em que tivesse cinco ou seis Cristianos Ronaldos.

Pergunta


Gostava de perguntar ao mister Fernando Santos se iremos ter a inclusão de jogadores novos na seleção A nas próximas convocatórias. Digo isto porque Portugal é das seleções europeias mais velhas atualmente.

Rafael Ribeiro


Fernando Santos


«Não sei se é velha. É das seleções cuja média de idades é mais elevada. Daí a velha... Eu não aceito esse conceito de velho. Recuso-me a aceitar esse conceito de velho. A nossa seleção é, em termos de média de idades, talvez uma das que tem média mais elevada.

Depois há outro conceito que eu não consigo entender, o da revolução. As pessoas falam em renovação, mas depois quando expressam a sua opinião falam numa revolução, que é pôr uns fora e outros dentro, trocar um momento por outro. Não aceito, porque a análise não pode ser feita por aí, tem de ser feita pela qualidade.

Não se fazem revoluções, há é todo um trajeto natural, mas também sempre fundamentado na qualidade. Todos percebemos que há um ciclo útil, mas por disponibilidade física, em que a partir de determinado momento o jogador não consegue reunir toda a qualidade, nas várias vertentes necessárias. Isso vai acontecendo naturalmente».

Pergunta


Numa mudança de geração, um Euro Sub-21 e um Europeu, daqui a pouco mais de um ano, em França, algumas mudanças serão vitais. Como pretende introduzir algumas caras novas na seleção, que tanto merecem pelo crescimento seja em clubes nacionais seja em clubes internacionais? E já agora, num processo de «promoção», quais são os detalhes que têm mais atenção ao chamar cada jogador a envergar a nossa camisola?

José Frias


Fernando Santos


«O processo de introdução de novos jogadores é um processo normal. Não sei como é que as pessoas estão a falar de caras novas, quando nesta equipa desde setembro, que me lembre, já entrou o João Mário, já entrou o Adrien, já entrou o Raphael Guerreiro, entre outros. É um processo natural.

Agora, quando me perguntam quantos jogadores desta equipa eventualmente não estarão no Mundial 2018, aí teremos que admitir que há aqui alguns jogadores que teoricamente não chegarão nunca ao Mundial 2018.
(Mas acredita que todos eles podem estar no Euro 2016?)


Neste momento, acredito que sim. Temos pontualmente um ou outro caso que não sabemos como vai correr a próxima época. Mas isso pode acontecer por variadas razões, não só por essa.

Agora, o que é importante é que na seleção haja, e isso há de certeza absoluta da nossa parte, o princípio de estar atento à evolução qualitativa dos jogadores. Se amanhã eu entender que há um jogador com 18 anos que em termos de qualidade me oferece mais garantias do que um jogador com 25, ou com 30 ou com mais de 30 anos, para mim a questão não está na idade, está sempre na qualidade. Se houver um jogador com mais de 30 que me continue a oferecer mais garantias do que qualquer outro será esse.

Eu percebo muito bem a pergunta dos adeptos. Mas os adeptos também têm que perceber uma questão muito simples. É que só se pode escolher 23, não se pode escolher mais. Todos gostavam que fosse chamado o Joaquim, o António, o Manuel, eu também gostava, e tenho pena. Ninguém mais do que o selecionador nacional seguramente tem pena, entre aspas, de não pode convocar alguns jogadores que ele próprio acha que podiam estar ali também. Se não estivessem estes estariam outros. A verdade é que não pode ser assim. É só isso».

Pergunta


Qual é a ordem de importância dos factores que são considerados na seleção de jogadores?

*experiência

*momento de forma

*adequação ao estilo da equipa

*questões disciplinares

*o futuro da seleção

*a necessidade da renovação

*outros factores

Philip Town, São João do Estoril


Fernando Santos


«Desde logo falta aqui um que é o mais importante para mim, a qualidade. Esse é o mais importante de todos. A qualidade técnica, táctica, a qualidade. Pode ter-se muita experiência e não ter qualidade, ou pode ser-se inexperiente e ter essa qualidade toda. Para mim a questão é da qualidade, na conjugação destes aspetos.

Depois o momento de forma. Também é muito importante, seguramente.

Adequação ao estilo da equipa não me parece tão importante, porque ao nível da seleção nacional é mais a equipa que se adapta ao estilo dos jogadores do que os jogadores que se adaptam ao estilo da equipa. O que é que eu quero dizer com isso? É que, se a seleção quer jogar com determinado modelo mas não tem jogadores com características para jogar com esse modelo, quem tem de se adaptar é a seleção. Não há outra hipótese. Uma coisa é um clube. Num clube é possível eu escolher aqui, em Portugal, ou China, ou no Japão, América, ou no Brasil, ou em qualquer lado, eu posso escolher um jogador com estas características para encaixar naquilo que é a minha filosofia. E também na estrutura base como sistema em que eu quero jogar. Agora, se eu não tiver dentro do meu país essas características, fica complicado.

A questão para mim é muito simples, por isso é que a qualidade para mim é o mais importante. Quando eu olho para isto digo, quem são os melhores? Os melhores são estes. Então porque eu gosto mais de jogar assim vou tirar estes? Ou sou eu que vou ter de me adaptar e pegar nestes? Imagine que tenho, sei lá, 3 ou 4 ou 5 Cristianos, ou 6 Cristianos? Vou deitá-los fora? Não vou.

Adequação ao estilo da equipa não me parece, questões disciplinares não sei o que é. Nunca tive problemas disciplinares. Para mim a questão central é que no grupo não haja questões disciplinares. Obviamente, alguém que tenha questões disciplinares dentro do grupo não vai fazer parte desta seleção. Seguramente.

O futuro da seleção? Não sei, não podemos pensar por aí. Penso que esta questão tem a ver com, daqui por uns anos, a necessidade de renovação. Não me parece que estas sejam as questões centrais. Porque não é isto que me leva a tomar decisões. Há obviamente uma necessidade normal, que é decorrente e continua, um processo normal de renovação, agora, este não é um factor».

(Entre dois jogadores de valor semelhantes, dará prioridade ao mais novo?)


«Se a questão for essa, eu diria que depende muito dos timings. Se for um processo de início de preparação para um Campeonato da Europa ou Campeonato do Mundo... O caso do Tiago pesou muito nesse aspeto. Se eu tivesse vindo para selecionador imediatamente antes de um Campeonato do Mundo ou Campeonato da Europa, e o Tiago não estava durante todo o processo de apuramento, não faria nenhum sentido se calhar convocar esse jogador. Agora, quando se inicia o processo, quando se sabe que esse jogador vai até lá, as coisas são diferentes.

Agora já percebo um pouco melhor a questão, passa por isso. Eu vou iniciar o apuramento para o Campeonato do Mundo. Se eu prevejo que este jogador pode chegar ao Campeonato do Mundo, então a minha decisão pode ser outra. Se tenho dois jogadores que são iguais, mas eu entendo que um não vai chegar lá, então naturalmente optarei pelo que lá vai chegar. Só se fosse burro é que não o faria».

 

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