Lei terá de voltar à Assembleia da República para ser "expurgada" das inconstitucionalidades. O Parlamento encontra-se dissolvido e, por isso, só se pode modificar o documento com uma nova legislatura. Ou seja, após as eleições e um novo Governo ser formado
O Tribunal Constitucional voltou a chumbar a Lei da Eutanásia. A informação foi avançada através de um comunicado enviado aos órgãos de comunicação social. Todavia, apesar de declarar inconstitucionais algumas das normas, da lei que regula a morte medicamente assistida, sublinha que a maioria do diploma cumpre a lei fundamental.
O Tribunal Constitucional considera seis normas inconstitucionais, justificando que a decisão agora conhecida responde a dois pedidos de fiscalização sucessiva: de um grupo de deputados do PSD e da provedora de Justiça.
“As demais normas cuja apreciação da constitucionalidade foi requerida - quase todas as que integram o diploma - não foram declaradas inconstitucionais”, lê-se no comunicado. Lembra ainda o TC que "a morte assistida, como questão de princípio, é um problema de ordem política, cabendo ao legislador, no gozo da sua legitimidade democrática, arbitrar a tensão perene entre valores constitucionais de sentido contrário neste domínio de vida caracterizado pelo dissenso persistente e razoável entre os cidadãos".
De forma clara e resumida, os juízes clarificam que o Tribunal "declarou a inconstitucionalidade de vários segmentos da lei que pressupõem que o doente tem o direito a escolher entre os dois métodos de morte medicamente assistida – suicídio ou eutanásia −, quando, na sua atual versão, a lei só consente a eutanásia se o doente estiver fisicamente impossibilitado de autoadministrar os fármacos letais. No entender do Tribunal, estes lapsos do legislador, numa matéria extremamente sensível, podem criar dificuldades desnecessárias ao intérprete e geram um risco evitável de má aplicação do direito, ofendendo o princípio constitucional da segurança jurídica [alínea a) da decisão]".
Ou seja, se só é permitida a sua realização "se o doente estiver fisicamente impossibilitado de autoadministrar os fármacos", na sua versão atual, não será possível ao doente exercer o direito de "escolher entre dois métodos (...) suicídio ou eutanásia".
Em seguida, "o Tribunal declarou a inconstitucionalidade da norma que regula o modo de intervenção do médico especialista na patologia que afeta o doente, ao não exigir que este seja examinado, ao contrário das legislações estrangeiras que consagram regimes de eutanásia mais próximos do português". Dando como exemplo, a Bélgica, o Luxemburgo e a Espanha.
O TC considera mesmo que "a omissão desta exigência comum põe em causa a idoneidade, objetividade, impassibilidade e confiabilidade do juízo médico de verificação das indicações clínicas da morte assistida, o que se traduz numa tutela deficitária da vida humana e na violação da reserva de lei parlamentar".
Por fim, o Tribunal Constitucional, "declarou a inconstitucionalidade da norma que impõe ao profissional de saúde que recusa praticar ou ajudar o ato de morte medicamente assistida o ónus de especificar a natureza das razões que o motivam, por entender que a mesma constitui uma restrição desadequada, desnecessária e desproporcional da liberdade de consciência, na vertente negativa da liberdade de não manifestar a terceiros as convicções pessoais".
Em declarações à CNN Portugal, o advogado Paulo Sá e Cunha explica que agora, a lei, "tem de voltar à Assembleia da República para ser expurgada das normais declaradas inconstitucionais". O que, considerando a atual situação; pode não acontecer brevemente.
"A Assembleia encontra-se dissolvida e não pode decidir nada nesta altura", acrescenta. "E, na verdade, não se sabe como será a composição da próxima legislatura. Podendo, em última análise, cair a lei".
As explicações e indicações dadas pelo Tribunal Constitucional, através do comunicado agora revelado, "não extravasam" de forma alguma "as suas competências".
O Tribunal Constitucional reiterou ainda que a Constituição “não impõe nem proíbe categoricamente” a legalização da morte medicamente assistida, confiando ao legislador “uma margem de ponderação entre os valores da liberdade individual e da vida humana”.