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Economista; Professor Associado e Coordenador na Universidade Europeia; Investigador Integrado no CETRAD

O caos calculado de Donald Trump

14 out, 10:22

A paralisação do governo norte-americano não é um acidente. É uma estratégia. O ponto de situação do Orçamento para 2026, com o chumbo no Congresso, e a ameaça de Donald Trump de proceder a cortes permanentes na despesa pública, são os movimentos calculados de um cenário político em que o caos é o instrumento de gestão preferido.

As consequências imediatas são tão vastas quanto previsíveis. Centenas de milhares de funcionários públicos enfrentam o desemprego, os serviços essenciais definham e a instabilidade institucional atinge um nível ímpar na história recente dos EUA. O Partido Republicano promete insistir na mesma proposta. Os Democratas garantem não ceder. No centro do caos está um Presidente que vê na paralisação uma oportunidade única para reduzir, à força, o tamanho do Estado que lidera.

Mas o verdadeiro problema, mais subtil e potencialmente mais duradouro, é a forma como este caos político está a desnortear por completo a economia. A estratégia de Trump já se tinha tornado evidente na batalha com a Reserva Federal. Durante semanas, o Presidente minou publicamente a autoridade de Jerome Powell, pressionando agressivamente por cortes nas taxas de juro. Ameaças de demissão, mesmo que veladas, abalaram a confiança e criaram um ambiente de tal forma volátil que Powell se viu forçado a ceder, optando pelo que lhe pareceu um mal menor.

Tecnicamente, a balança equilibrava-se. O desemprego a subir puxava para uma descida de juros, enquanto a inflação, projetada em alta, empurrava fortemente para uma manutenção ou mesmo subida. A manutenção era a opção mais sensata. Powell perdeu o braço-de-ferro, possivelmente criando um problema no futuro para atenuar o caos no presente.

Nesta fase, a paralisação do governo dá o golpe final na já desorientada economia norte-americana. Sem Orçamento e com a paragem de alguns serviços públicos, as instituições ficam sem dados. O relatório de emprego não será divulgado. O índice de preços ao consumidor está em risco. Jerome Powell, que já avançava com muitas incertezas, fica agora completamente desnorteado. Sem os indicadores vitais da economia que supervisiona, a Reserva Federal não conseguirá definir uma política monetária adequada.

A maior ameaça à estabilidade americana não vem de um rival externo, mas de uma guerra interna orquestrada a partir do topo. Donald Trump percebeu que a maior resistência à sua visão radical vinha de dentro das próprias instituições dos EUA. E está a desmantelá-las com a arma que melhor domina, criando um caos interno que neutraliza qualquer oposição coesa. O preço desta estratégia, no entanto, será pago pela função pública, pelos mercados, pela confiança na economia americana e, em última análise, pelos cidadãos.

Para os norte-americanos e para a economia global, o caos está longe de ter terminado.

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