"É assim que vou morrer, esmagado a defender a entrada": 365 depois, o ataque ao Capitólio ainda é uma ferida profunda

Agência Lusa , BMA
6 jan 2022, 11:21

Um ano após o ataque que fez dezenas de feridos e cinco mortos, Aquilino Gonell recorda o que sentiu ao ver-se cercado por centenas de pessoa

Um ano depois da tentativa de insurreição no Capitólio dos Estados Unidos, a 6 de janeiro de 2021, as vozes dos protagonistas recordam histórias delicadas. “Senti-me a perder oxigénio e lembro-me de pensar: ‘é assim que vou morrer, esmagado a defender esta entrada’”, disse o sargento da polícia do Capitólio Aquilino Gonell, testemunhando perante o comité da Câmara dos Representantes que está a investigar o assalto. “Muitos polícias têm em mente a possibilidade de que isto seja um evento recorrente a cada ano ou a cada quatro anos e é por isso que agentes como eu estão a falar, porque não queremos voltar a passar por isto”, afirmou. Mais de 700 atacantes foram acusados e até condenados nos tribunais,

O testemunho de Gonell é um dos muitos que têm vindo a público por parte dos polícias que tentaram defender o Capitólio, quando uma multidão de apoiantes do ex-presidente Donald Trump invadiu o edifício para impedir a certificação de Joe Biden como vencedor das eleições. O polícia Daniel Hodges chamou aos invasores “terroristas” e contou, no seu testemunho no Congresso, que muitos tentaram “recrutá-lo” para ajudar na causa, dizendo que o assalto contou com organizações de supremacia branca. Também o agente Michael Fanone, que foi severamente espancado pelos atacantes, falou em detalhe sobre violência que sofreu e acabou por se demitir da polícia do Capitólio em dezembro. 

A violência do ataque resultou em cinco mortos naquele dia, quatro invasores e o polícia Brian Sicknick, que colapsou depois de ser atacado com um spray paralisante. Quatro outros agentes que estavam de serviço suicidaram-se nos meses subsequentes. A líder da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, chamou-lhes “mártires da democracia”

Entre grande parte do eleitorado republicano prevalecem teorias alternativas sobre os factos de 6 de janeiro de 2021, promovidas por destacadas personalidades ligadas ao partido, incluindo o ex-presidente Donald Trump. “Operacionais do FBI organizaram o ataque ao Capitólio”, disse o apresentador Tucker Carlson no seu programa televisivo na Fox News, canal geralmente alinhado com o partido republicano e que apoiou declaradamente Trump durante o seu mandato.

Também o apresentador Sean Hannity fez alegações similares no seu programa de rádio, dizendo acreditar que o ataque foi “encenado”.A inversão de responsabilidades foi espelhada nas opiniões que apoiantes de Trump veicularam numa reportagem recente da CNN: “Não vi nenhum apoiante de Trump envolvido em violência. Vi pessoas que fingiram ser apoiantes de Trump”, disse a republicana Victoria Perry. Outra apoiante, Anita Germano, disse que “todas as notícias sobre isto são uma falsidade gigante”.

Uma outra, Jeanie Johnson, afirmou que “Trump ganhou a eleição”, garantindo que tal já foi comprovado diversas vezes, apesar de todas as alegações de fraude terem sido rejeitadas por instâncias judiciais.  “O ataque de 6 de janeiro não foi feito pelos republicanos nem por Trump. Os democratas é que estiveram por trás de tudo”, opinou ainda uma apoiante chamada Lisa. 

Subtilezas jurídicas

Em paralelo há organizações que estão a trabalhar para retratar o que se passou no quadro da Primeira Emenda da Constituição, que protege a liberdade de expressão, classificando os atacantes como manifestantes pacíficos e alegando que os processos criminais são um abuso do sistema judicial. É o caso da organização Look Ahead America, liderada por Matt Braynard, que em setembro de 2021 organizou a marcha “Justice for J6” e conduz hoje vigílias de protesto junto ao estabelecimento prisional de Washington, D.C. e noutros estados norte-americanos. 

A organização defende que as pessoas que foram identificadas e presas pelas suas ações no Capitólio estão a ser perseguidas injustamente e tem feito várias iniciativas nesse sentido, como o 'podcast' “O prisioneiro político”, no qual são entrevistados arguidos ligados ao assalto de 2021, além de uma base de dados sobre os que foram presos. 

Também a família de Ashli Babbitt, atacante que foi morta a tiro quando tentava entrar no corredor que dava acesso à Câmara dos Representantes, tem em marcha uma campanha para responsabilizar criminalmente o autor do disparo, o tenente Michael Byrd. 

A família de Babbitt criou um fundo legal para “vingar os seus direitos civis”, alegando que ela foi vítima de uso excessivo de força policial e que os seus direitos constitucionais foram violados. A investigação sobre a morte foi encerrada sem acusação pelo Departamento de Justiça, três meses depois da tentativa de insurreição. 

Com a investigação do comité da Câmara dos Representantes em curso, cerca de uma dezena de polícias processaram Donald Trump nos últimos meses, alegando que este teve responsabilidade na invasão.

Os processos mais recentes entraram a 4 de janeiro de 2022, com Marcus J. Moore, Bobby Tabron e DeDivine Carter a pedirem compensações e o pagamento de despesas médicas pelas lesões sofridas durante o ataque. 

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