Foram descobertos 42 genes que influenciam a doença de Alzheimer

CNN , Sandee LaMotte
12 abr 2022, 09:00
Descobertos 42 genes que influenciam a doença de Alzheimer

A descoberta proporcionará aos cientistas novas possibilidades de traçar objetivos para tratamentos, medicamentos e mudanças de estilo de vida que poderão reduzir o risco de doença cerebral mortal

Foram descobertos mais 42 genes ligados ao desenvolvimento da doença de Alzheimer no maior estudo de risco genético de contrair Alzheimer realizado até aos dias de hoje.

"Este é um estudo marcante no campo da investigação de Alzheimer e é o culminar de 30 anos de trabalho", afirmou numa declaração a coautora do estudo, Julie Williams, diretora do centro do Instituto de Investigação de Demência da Universidade de Cardiff, no Reino Unido.

“Os fatores decorrentes do estilo de vida que levamos, tais como fumar, fazer exercício e a nossa dieta, influenciam o desenvolvimento de Alzheimer e, ter estes aspetos em conta o mais cedo possível, é uma forma positiva de procurar reduzir os riscos de virmos a desenvolver a doença,” acrescentou Williams.

“No entanto, 60-80% do risco da doença está relacionado com a nossa genética e, por isso, devemos continuar a procurar as causas biológicas e a desenvolver os tratamentos absolutamente necessários para os milhões de pessoas afetadas em todo o mundo.”

Os genes anteriormente desconhecidos apontam para vias adicionais de progressão da doença para além do conhecido gene APOE e4 ou o desenvolvimento de beta amilóide e tau, duas proteínas importantes que se vão acumulando no cérebro com resultados devastadores à medida que a doença de Alzheimer progride.

"Criar uma extensa lista dos genes de risco da doença de Alzheimer é como tentar juntar os cantos de um puzzle, e embora este trabalho não nos dê um panorama completo, fornece-nos um enquadramento muito útil para desenvolvimentos futuros", afirmou Susan Kohlhaas, diretora de investigação na Alzheimer's Research UK, embora não tenha participado na investigação.

Este estudo concluiu que alguns dos genes recentemente descobertos se concentram em reações muito específicas entre as proteínas do corpo que determinam o modo como a inflamação e o sistema imunitário podem danificar as células cerebrais.

"As novas variantes de risco identificadas no presente estudo estão significativamente associadas à progressão" da doença de Alzheimer, constata o estudo, publicado na segunda-feira na revista Nature Genetics.

A descoberta proporcionará aos cientistas novas possibilidades de traçar objetivos para tratamentos, medicamentos e mudanças de estilo de vida que poderão reduzir o risco de doença cerebral mortal, afirmam os especialistas.

“O futuro da doença de Alzheimer é a medicina de precisão e a prevenção,” afirmou o Dr. Richard Isaacson, diretor da Clínica de Prevenção de Alzheimer no Centro de Saúde Cerebral na Faculdade de Medicina da Universidade Atlântica da Flórida.

Isaacson, que não esteve envolvido no estudo, afirmou ainda que "esta pesquisa nos faculta muito mais meios para adicionarmos às ferramentas de que já dispomos para, eventualmente, combatermos com maior precisão a doença de Alzheimer".

Descoberta de novas vias que levam à doença

O estudo global analisou os genomas de 111.326 pessoas com Alzheimer clinicamente diagnosticado e comparou-os com genes de 677.663 pessoas cognitivamente saudáveis. Os genomas foram fornecidos por clínicas de mais de 15 membros da União Europeia, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, Islândia, Nigéria, Nova Zelândia, Reino Unido e Estados Unidos.

O estudo identificou 75 genes que estão ligados a um risco acrescido de contrair Alzheimer, 33 dos quais já eram conhecidos. Também confirmou anos de investigação sobre o papel dos amilóides beta e tau.

Dos 42 novos genes encontrados que estão ligados à doença de Alzheimer, muitos agruparam-se em várias vias suspeitas, mas não confirmadas, de propiciarem o desenvolvimento da doença. Uma dessas vias é o sistema imunitário do corpo, concebido para nos proteger dos invasores de germes.

Vários genes foram associados a um regulador imunitário de que o corpo necessita para ativar genes e evitar a morte celular, designado como LUBAC. O estudo também descobriu que as microglias, células imunitárias no cérebro que têm a função de "remover o lixo" -- limpando neurónios danificados -- desempenham um papel fundamental em pessoas com diagnóstico da doença de Alzheimer.

Alguns dos genes recentemente descobertos podem fazer com que as células microglia sejam menos eficientes, "o que poderá acelerar a doença", afirmou Williams.

Outra via-chave (para a contração da doença), de acordo com o estudo, envolve genes associados à inflamação. O corpo usa a inflamação como mecanismo de defesa para matar os agentes patogénicos, mas esta também desempenha um papel na remoção de células danificadas.

Uma proteína que se destacou no estudo foi o fator de necrose tumoral-alfa, que é criado pelo sistema imunitário para regular a inflamação. O estudo encontrou um conjunto de genes associados ao TNF (sigla em inglês), como é designado. Embora o verdadeiro papel do químico seja reunir as defesas do corpo para lutar, este é também responsável por muitas doenças autoimunes em que o corpo se vira contra si próprio, tais como a artrite reumatoide e psoriática, a doença de Crohn e a diabetes tipo 1.

O estudo encontrou outras interações genéticas complicadas, todas elas demonstram que "a doença de Alzheimer é uma doença multifacetada, constituída por diferentes patologias, e em cada pessoa ela traça o seu próprio caminho", afirmou Isaacson.

"Os médicos dizem sempre, 'a partir do momento em que se observou uma pessoa com Alzheimer, observou-se apenas um caso de Alzheimer'. A doença apresenta-se e progride de forma diferente em pessoas diferentes", acrescentou.

Uma causa comum?

Uma outra perspetiva-chave do estudo foi que as doenças cerebrais como Parkinson, demência frontotemporal, doença de Lewy body (LBD) e esclerose lateral amiotrófica podem ter a mesma base genética subjacente: "Tomados como um todo, estes dados podem, por conseguinte, destacar a possibilidade de existir um continuum entre doenças neurodegenerativas", disse o estudo.

"A comunidade científica e médica considera os processos neurodegenerativos das doenças como sendo muito diferentes e distintos, e é assim que os estudamos há muito tempo", afirmou a Dra. Kellyann Niotis, uma neurologista especializada na prevenção das doenças de Alzheimer e Parkinson na Weill Cornell Medicine e na NewYork-Presbyterian.

"Isto significa que pode haver uma maior continuidade entre estes processos da doença do que estávamos realmente cientes antes", afirmou Niotis, que não participou no estudo.

"Os jovens podem ter riscos genéticos subjacentes semelhantes, e estes tanto podem numa pessoa dar origem a Parkinson como noutra originar Alzheimer", afirmou ela. "Na verdade, isso não é muito relevante. O que importa é compreender o que começa a correr mal no seu organismo, por isso será melhor começar cedo a explorar esta via".

Ao gerar este panorama mais completo do risco genético - que precisa de ser aprofundado e definido em estudos futuros - os autores do estudo também desenvolveram "um novo sistema de pontuação para prever o risco de contrair a doença de Alzheimer", afirmou Tara Spires-Jones, vice-diretora do Centro de Ciências Cerebral de Descoberta da Universidade de Edimburgo, numa declaração.

"Esta ferramenta será útil para os investigadores, mas provavelmente não será utilizada nos próximos tempos em pessoas que não estejam a participar em ensaios clínicos", informou Spires-Jones, que não participou no estudo.

Investigadores clínicos como Isaacson e Niotis sabem que uma ferramenta como esta é precisamente o que os pacientes que estão preocupados com a saúde do seu cérebro querem.

"As pessoas querem saber, 'quais são as minhas hipóteses?" e depois 'o que posso fazer em relação a isso? " afirmou Isaacson. "Não será para já, mas num futuro próximo, poderemos calcular a probabilidade de uma pessoa desenvolver Alzheimer ou outra doença cerebral de uma forma mais precisa, e isso contribuirá para uma gestão de maior precisão tanto das suas questões clínicas como do estilo de vida ".

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