Uma comunidade do estado norte-americano do Minnesota conseguiu angariar 250 mil dólares numa questão de meses, numa onda de solidariedade que emocionou a nova proprietária da casa
Linda Taylor, de 70 anos, viveu na mesma casa quase duas décadas. Era acarinhada pela vizinhança do bairro de Powderhorn Park, no estado norte-americano do Minnesota, e conhecida como "a pessoa que cumprimentava toda a gente". A sua rotina pacata foi interrompida no início do ano, com um aviso inesperado por parte do senhorio: tinha dois meses para comprar a casa ou seria despejada.
"Senti-me como se o mundo se tivesse desmoronado aos meus pés", disse Linda ao The Washington Post. "A minha casa é tudo para mim."
A norte-americana terá comprado a casa em 2004, mas viu-se forçada a devolvê-la ao proprietário original por não conseguir cumprir os pagamentos devidos. Continuou, porém, a habitar a casa na condição de arrendatária, mesmo quando o senhorio foi apanhado num esquema de fraude imobiliária e a casa foi adquirida por outro proprietário. "A casa é minha", afirma, peremptoriamente.
Ao longo dos 18 anos em que arrendou a casa, Linda contatou diversas vezes os serviços sociais e candidatou-se a programas e subsídios que promoviam a compra de casas por parte dos inquilinos. Sem sucesso. "Sempre que tentava comprá-la, esbarrava contra um muro", conta Linda, acrescentando que o apoio dos cinco filhos e nove netos - apesar de abundante - não permitia que a ajudassem financeiramente na aquisição do imóvel.
A pandemia veio dificultar uma situação já vulnerável, com o aumento sucessivo da renda e o despedimento da organização sem fins lucrativos onde tinha trabalhado nos três anos anteriores. Apesar das dificuldades, Linda continuou a pagar a renda mensal de 1400 dólares (o equivalente a cerca de 1.341 euros), recorrendo à ajuda de familiares, às suas próprias poupanças e a programas e subsídios governamentais.
Foi neste contexto que Linda recebeu a notícia de que o proprietário tencionava vender a casa por 299 mil dólares (cerca de 286,818 mil euros), uma quantia incomportável ao seu orçamento cada vez mais limitado.
A princípio, sentiu-se "derrotada". "Não conseguia dormir, não conseguia comer", confessa. "Foi como se uma pedra tivesse acabado de cair em cima de mim."
Mas o desespero depressa deu lugar à determinação. Ultrapassado o choque inicial, Linda recorda ter pensado: "Esta é a minha casa. Vou fazer algo em relação a isto."
A mobilização da comunidade
Um dos vizinhos com quem mantinha uma relação mais estreita, Andrew Fahlstrom, trabalhava como profissional na área do direito à habitação. Sensibilizado com a situação da septuagenária, o vizinho prontificou-se a ajudá-la e espalhou a palavra pelo resto da vizinhança.
"Trata-se de uma pessoa que está a pagar pela casa há 18 anos", frisa Fahlstrom. "Tem de haver mais intervenção sistémica para que as pessoas possam permanecer nas suas casas."
A consternação de um vizinho deu lugar à mobilização de toda a comunidade de Powderhorn Park, que depressa se organizou e determinou os passos a seguir. Em fevereiro, mais de 400 vizinhos assinaram uma carta endereçada ao senhorio, solicitando que continuasse a arrendar a casa por mais uns meses. O proprietário concordou - e ainda reduziu o preço da casa em cerca de 50 mil dólares.
Confrontada com o novo preço, a comunidade de vizinhos optou por outra abordagem. "Foi aqui que isto se tornou uma angariação de fundos, em vez de uma manifestação contra o despejo de Linda", indica Andrew Fahlstrom.
A angariação de fundos - com um prazo definido até final de junho - ocorreu em múltiplas vertentes: nas redes sociais, em eventos locais e até numa exposição de arte, em que Linda teve a oportunidade de vender quadros originais. O interesse dos órgãos de comunicação social locais também contribuiu para a divulgação e amplificação do caso.
A comunidade doou na medida das suas possibilidades, com montantes que variavam dos 5 aos 15 mil dólares. A doação mais generosa foi a de uma igreja nas proximidades, no valor de 200 mil dólares. Em apenas quatro meses, a solidariedade dos vizinhos permitiu a recolha do valor previsto e, ainda, de um excedente que permitirá cobrir as reparações de que a casa necessita há anos.
"Sabia que os meus vizinhos me amavam, mas não sabia que me amavam assim tanto", emociona-se Linda, ainda incrédula com o movimento de solidariedade gerado na vizinhança. "Tem sido uma jornada incrível, e ainda vai continuar."
Finda esta provação, garante a norte-americana, é a vez de retribuir o carinho recebido ao longo dos últimos meses. Planeia organizar churrascos no seu quintal, agendar noites de cinema para toda a vizinhança e montar bancadas de limonada com os seus netos. "Estou aqui para ajudar o próximo e o próximo e o próximo", garante.
Dia 31 de maio, um mês antes do previsto, Linda Taylor conseguiu finalmente comprar a casa onde residia há quase 20 anos. Agora que o imóvel está em seu nome, a sensação é "diferente". Continua a pintar quadros em casa, como um passatempo apaixonado. Mantém uma pequena biblioteca no terraço, de que os vizinhos podem dispor livremente. Mas algo mudou. Ao fim de 18 anos, afirma orgulhosamente: "Estou salva. Estou segura. Tenho um lar."