Um concurso norte-americano viu sorteada uma sequência de números invulgar que surpreendeu os espectadores - mas não os matemáticos, que garantem não existirem números mais improváveis do que outros. "É uma coisa pessoal, não é uma coisa matemática"
A maior atração dos jogos de lotaria é a revelação da chave vencedora: o momento em que os espectadores acompanham, de olhos fixos no ecrã, os números sorteados aleatoriamente.
O concurso norte-americano Bank a Million não é exceção. Como é habitual aos sábados à noite, a anfitriã Liz Hayes ia narrando os números das bolas sorteadas, até que começou a ser evidente a formação de um padrão numérico.
"O primeiro número é o 16", começou a anfitriã, na mais recente emissão do sorteio. "O nosso segundo número é o 13. O terceiro é o 14. De seguida temos o 18, e depois o 17 e o 15. E o Bola de Bónus desta noite é o 19".
Por ordem crescente? 13, 14, 15, 16, 17 e 18, com o número bónus 19 a encerrar esta sequência imprevisível.
John Hagerty, um porta-voz da Lotaria de Virgínia, confessou ao The Washington Post ser "sempre divertido quando estes números aleatórios são sorteados numa sequência discernível", como já aconteceu diversas vezes na sua carreira. Ainda assim, o sorteio de sábado à noite revelou-se único. "Faço parte da Lotaria de Virgínia desde a fundação do Bank a Million, e não me recordo de alguma vez os números vencedores terem saído numa sequência numérica como esta."
O resultado do sorteio pode parecer ainda mais improvável do que ganhar a lotaria, mas os matemáticos desmistificam o evento. "É improvável que os números tenham saído desde o 13 ao 19? Sim", admite Jordan Ellenberg, professor de matemática da Universidade de Wiscosin. Mas, acrescenta, todas as outras combinações numéricas são "igualmente improváveis".
"Cada vez que os números da lotaria são revelados, acontece uma coisa muito improvável. Cada resultado em particular é improvável. De outra forma, haveria demasiados vencedores", explica.
O que torna, então, este resultado tão memorável? A resposta, de acordo com os matemáticos, reside no cérebro humano - mais especificamente, na capacidade de reconhecimento de padrões.
"É uma coisa pessoal, não é uma coisa matemática", clarifica Ellenberg. "Vemos estes números e pensamos: 'É incrível. Todos os sete, em ordem numérica'. Podemos olhar para outra lista de números e dizer 'Isto não presta'. Mas outra pessoa poderá dizer: 'É o meu aniversário e o aniversário da minha namorada; deveríamos casar-nos!'"
Catalin Barboianu, um investigador romeno que já se tinha debruçado sobre a lógica matemática e estatística por detrás da lotaria, corroborou a explicação.
"É de facto um grande evento", admite, esclarecendo de seguida que esta relevância se deve unicamente à perspetiva do apostador. De um ponto de vista matemático, o sorteiro de sábado foi tão (im)previsível como qualquer outro. "Qualquer combinação de números tem a mesma probabilidade de ser escolhido", explica.
A crença comum de que alguns números tem maior ou menor probabilidade de ser selecionados em sorteio é, segundo o investigador, infundada e "falaciosa". As sequências de números seguidos são frequentemente evitadas pelos apostadores, que optam por números que o cérebro humano interpreta como menos previsíveis. "Ainda assim, têm a mesma probabilidade do que qualquer outro resultado", conclui Barboianu.
O sorteio do Bank a Million premiou dois bilhetes: um no valor de 500 mil dólares, e outro de 250 mil. Embora insignificante em termos matemáticos, o resultado da lotaria percorreu os órgãos de comunicação social e pôs o mundo a discutir as probabilidades dos jogos de apostas... exceto os dois vencedores, que, até segunda feira à noite, ainda não tinham reclamado nenhum dos prémios.
