O valor por turma que o Estado paga aos colégios com contratos de associação sofreu aumentos em 2024 e 2025, depois de 14 anos congelado. Mas, queixam-se os colégios, esses aumentos "não recuperam a perda anterior". A uma pergunta da Iniciativa Liberal, o Governo respondeu com valores de 2022: cada aluno do 3.º ciclo do Ensino Básico custa ao Estado 7.249,80 euros na escola pública. Mais do dobro do que é pago aos colégios com contrato de associação
Há muito que os colégios com contrato de associação com o Estado reclamam um aumento significativo do valor por turma. O valor esteve congelado entre 2010 e 2024, ano em que os colégios passaram a receber cerca de 86.176 euros por turma (um aumento de 5.676 euros em relação ao ano anterior), independentemente do número de alunos. Já este ano, o valor foi atualizado para 88.244,88 euros, um valor que, dizem os colégios “não recupera a perda anterior”.
Atualmente, existem 27 colégios com contratos de associação, que voltam a pedir um aumento significativo do financiamento por turma, sob pena de muitos “não aguentarem” as perdas financeiras e “já não abrirem no próximo ano”.
“Estas escolas estão a prestar um serviço ao Estado. Estão localizadas em regiões onde a cobertura da rede pública é insuficiente. Se um destes colégios falir, o Estado vai ter de construir ali uma escola e arcar com os custos ou levar estes alunos para escolas que ficam a quilómetros de distância, pagando o transporte, e, em muitos casos colocando-os em contentores, porque mesmo essas escolas não têm capacidade física para absorver todos os alunos”, alerta Rodrigo Queiroz e Melo, diretor executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (AEEP).
O exemplo do Colégio de Calvão
Exemplo da importância que os colégios com contrato de associação têm na comunidade é o Colégio de Nossa Senhora da Apresentação, em Calvão, concelho de Vagos, que ainda este ano letivo viu a aprovação total das turmas propostas para abertura arrastar-se até quase ao primeiro dia de aulas. O Colégio de Calvão serve uma vasta população de dois concelhos: o norte do concelho de Mira e o sul do concelho de Vagos.
Luís Oliveira, diretor do colégio, diz que o “problema já é velho”. “Em relação a isso matam-nos pelo cansaço. Fazem de conta que não ouvem. Há escolas que correm mesmo o risco de fechar. São alguns sinais, dos muitos que existem, do desconcerto que existe no Ministério da Educação, Ciência e Inovação”, reforça.
“É impressionante como os nossos governantes vão passando por lá meses e anos e vão deixando as coisas na mesma”, diz ainda.
Rodrigo Queiroz e Melo acrescenta que “a expectativa em reação a este Governo é enorme”. “Se um Governo PSD e CDS, partidos que sempre estiveram ao lado dos colégios com contrato de associação, não faz nada… imagine quando vier outro Governo de partidos que sempre se mostraram contra esta modalidade”, questiona.
Segundo o responsável da AEEP, “neste momento, os colégios estão a receber cerca de 49% do valor que custa um aluno no ensino público”.
Em resposta a uma pergunta da Iniciativa Liberal (IL), o Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) respondeu, a 22 de setembro deste ano, com uma tabela com valores de 2022. Desta resposta, Rodrigo Queiroz e Melo toma por referência o custo anual de um aluno do 3.º Ciclo do Ensino Básico numa escola pública: 7.249,80 euros. “As turmas têm em média 25 alunos. Muitas até têm mais, mas, se tomarmos este número por referência, uma turma na escola pública custa 181 mil euros por ano. Um colégio com contrato de associação recebe 88.244,88 euros. É menos de metade do valor que uma turma custa ao Estado”, contabiliza.
“Estamos numa zona completamente de fim de linha”, resume Rodrigo Queiroz e Melo.
A proposta da AEEP
Rodrigo Queiroz e Melo lembra que muitos colégios sobrevivem à custa de endividamento à banca, “mas haverá uma altura em que os edifícios onde estão instalados já não serão suficientes para dar como garantia para os empréstimos e os bancos vão deixar de emprestar dinheiro”. Mas, continua, “a maioria destes colégios sobrevive à custa dos sacrifícios dos próprios trabalhadores”. E lembra que “os professores dos colégios com contrato de associação recebem quase metade dos seus colegas no público”. “Um professor que entra na profissão recebe 1.714,11 euros brutos, mais 132 euros de subsídio de refeição. O valor de entrada para um professor num colégio é 1.275 euros brutos, mais refeição na cantina”, indica.
Mas há mais desigualdades entre os professores do ensino público e os professores dos colégios com contrato de associação, segundo o diretor executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo: “Os professores no público têm redução de componente letiva a partir dos 50 anos e nos colégios não, a carga horária real nos colégios é maior do que nas escolas públicas.”
A AEEP propõe ao MECI um aumento do valor pago por turma para 100.888 euros para as turmas de início de ciclo já em 2026. Ou seja, para as turmas dos 5.º, 7.º e 10.º anos. Todas as outras se manteriam com o mesmo valor no próximo ano, sendo o valor atualizado à medida que a turma fosse progredindo no grau de ensino. “Ainda assim, muito longe dos 181 mil que custa no ensino público”, atira Rodrigo Queiroz e Melo.
E a associação faz mesmo as contas ao impacto que essa proposta teria no Orçamento do Estado: “Em 2026, teria um impacto de pouco mais de 800 mil euros. Quando todas as turmas estivessem a este valor, em 2029, o impacto no Orçamento do Estado seria de menos de sete milhões de euros.”