Com uma classe envelhecida e aposentações à vista, falta de professores poderá piorar

Agência Lusa
17 dez 2021, 08:10
Regresso às aulas em Lisboa

É no pré-escolar que se encontram os docentes mais idosos, com uma idade média de 54 anos

A falta de professores nas escolas repetiu-se novamente este ano e o problema tenderá a agravar-se na próxima década se os milhares de docentes que entretanto se aposentarem não forem substituídos por uma classe mais jovem.

Em 10 anos, o número de professores nas escolas diminuiu significativamente e, com uma taxa média de crescimento anual negativa, o 3.º ciclo e secundário foram quem mais perdeu, passando de 91 mil docentes para menos de 77 mil em 2019/2020.

Não há apenas uma causa para esta queda, mas entre as explicações estará a evolução da idade dos professores: Desde 2009/2010, duplicou a percentagem de docentes com pelo menos 50 anos de idade e há dois anos a maioria cabia nessa categoria.

Segundo dados da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, é no pré-escolar que se encontram os docentes mais velhos, com uma idade média de 54 anos entre 8.657 que trabalhavam na rede pública em 2019/2020. Desses, apenas oito estavam abaixo dos 30 anos.

Nos outros níveis de ensino, a média de idades também está acima dos 50 anos, à exceção do 1.º ciclo, onde os professores têm em média 49 anos. Nas escolas do 2.º ciclo, a média é 52 anos e no 3.º ciclo e secundário situa-se nos 51 anos.

Só este ano, os sindicatos estimam que se aposentem mais de dois mil professores e, considerando o cenário de uma classe cada vez mais envelhecida, uma parte significativa dos atuais docentes já não dará aulas daqui a 10 anos.

Por isso, se não se equilibrar a balança e o número de novos professores não for suficiente para substituir aqueles que saem, a falta de docentes nas escolas, que neste 1.º período deixou milhares alunos sem aulas, só pode agravar-se.

Um estudo da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa, divulgado recentemente pelo Ministério da Educação, confirma precisamente essa urgência, ao apontar que até 2030/2031 será preciso contratar cerca de 34,5 mil profissionais.

Até lá, o estudo projeta que a evolução do número de alunos e dos atuais docentes seja decrescente, mas em graus muito distintos: Se o número global de alunos entre o pré-escolar e secundário deverá passar de um milhão para 960 mil (menos 15%), dos 120 mil docentes em funções no ano letivo 2018/2019 deverão aposentar-se 39%.

Contas feitas, para assegurar que não há falta de professores nas escolas em 2030/2031, seria necessário recrutar 34.508 novos docentes, o que corresponde a 29% da totalidade de docentes de 2018/2019. Por ano, deveriam ser contratados em média 3.451 docentes.

As necessidades serão maiores no 3.º ciclo e secundário (15.663 novos docentes), seguindo-se o 1.º ciclo (6.926), o 2.º ciclo (5.655) e o pré-escolar (4.419 educadores).

Por regiões, as projeções apontam que é no Norte, onde se nota mais o envelhecimento da classe docente, que as escolas terão maior carência, ao contrário do que se verifica atualmente, sendo necessário recrutar um total de 12.057 docentes.

Até 2030, as escolas da área metropolitana de Lisboa precisarão de 9.265 novos docentes, 8.678 para o Centro, 2.737 para o Alentejo e 1.771 para o Algarve.

Cerca 10 mil alunos terminam o 1.º período sem todos os professores

O 1.º período letivo termina esta sexta-feira e ao final de três meses de aulas há ainda cerca de 10 mil alunos sem professor a todas as disciplinas, refletindo um problema antigo que volta a preocupar diretores.

O ano letivo 2021/2022 é o terceiro em plena pandemia, mas além dos constrangimentos impostos pela covid-19, neste 1.º período as escolas voltaram a ser confrontadas com um problema antigo, que preocupa diretores escolares e sindicatos: os horários que ficam por preencher.

De acordo com um balanço feito pela da Federação Nacional dos Professores (Fenprof), há cerca de 10 mil alunos que entram agora nas férias de Natal sem terem tido aulas a todas as disciplinas por falta de professores.

Horários ainda a concurso

Olhando para a contratação de escola, o regime a que as escolas recorrem quando não conseguem ocupar todos os lugares através das reservas de recrutamento, na quarta-feira estavam ainda a concurso 196 horários, correspondentes a 1.933 horas.

São menos de metade dos horários a concurso há duas semanas, mas em resposta à agência Lusa Vítor Godinho, da Fenprof, explica que enquanto alguns podem ter sido preenchidos através da atribuição de horas extraordinárias aos docentes já colocados, noutros casos as escolas podem não ter colocado os horários a concurso, uma vez que o 1.º período está a terminar.

As disciplinas mais afetadas são as habituais: Português com 27 horários por preencher (13,8% do total), Inglês (24 horários), Física e Química (18) e Informática (17).

Por regiões, e à semelhança do que aconteceu em anos anteriores, as escolas com mais dificuldade em preencher todos os horários são em Lisboa, que na quarta-feira tinha a concurso 90 horários, o equivalente a 46,6% do total, seguindo-se Setúbal (53) e Faro (14).

Falta resposta sobre task force 

Em novembro, o Governo anunciou a criação de uma ‘task-force’ para ajudar as escolas que ainda têm falta de professores, por não conseguirem preencher todos os horários mesmo depois de recorrerem à contratação de escola.

A Lusa pediu ao Ministério da Educação um balanço do trabalho dessa equipa, mas até ao momento não obteve qualquer resposta. Já os diretores escolares, falam num contributo residual.

A task-force pode ter surtido efeito num ou noutro caso, mas nós não precisamos de uma task-force, precisamos de um investimento estrutural”, defendeu o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP).

Recordando que a existência de turmas sem todos os professores não é um problema de agora, Filinto Lima defende que a sua resolução é cada vez mais urgente, sob pena de “voltarmos aos anos 80”, quando o sistema recorria a profissionais com habilitações mínimas.

No mesmo sentido, Manuel Pereira, da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDE), refere que as escolas conhecem bem estas carências e as formas para as resolver, mas o problema está em não terem mais soluções disponíveis.

Diretores pedem incentivos para fixar professores

Uma das alternativas que têm vindo a ser encontradas é a atribuição de horárias extraordinárias a professores que já estavam colocados. Muito criticada pelos sindicatos, a opção também não é ideal para os diretores.

“Essa é uma solução rudimentar e muito provisória”, considerou o presidente da ANDAEP, admitindo que, dessa forma, os professores, que já estão cansados, são ainda mais sobrecarregados.

Além da necessidade de mais financiamento, Filinto Lima defendeu também a abertura de um concurso extraordinário para os professores contratados, num sinal de valorização dos docentes, e Manuel Pereira acrescentou ainda o papel das autarquias.

Os professores fogem de ir trabalhar para escolas onde mal ganham para as despesas que têm”, relata o presidente da ANDE, afirmando que as autarquias das zonas mais afetadas podem criar incentivos à fixação dos docentes.

Apesar deste problema, que se junta às contingências impostas pela pandemia da covid-19, os dois representantes dos diretores escolares fazem um balanço positivo do 1.º período letivo, sobretudo em comparação com as experiências dos últimos dois anos.

Relativamente às questões sanitárias, os casos de infeção pelo SARS-CoV continuam a ser o principal desafio das escolas, obrigado ao isolamento de turmas inteiras, sobretudo nos 1.º e 2.º ciclos, em que os alunos ainda não foram vacinados.

As aulas regressam a 10 de janeiro e, com o processo de vacinação das crianças entre os 5 e os 11 anos a arrancar a partir de sábado, os diretores esperam que no 2.º período letivo a normalidade possível já seja mais próxima do pré-pandemia.

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