Entrevista com Luís Vicente, antigo Diretor de Inovação e Transformação da FIFA, sobre a influência da inteligência artificial, da realidade aumentada e do mundo virtual no futuro do futebol.
Luís Vicente foi o primeiro português a integrar o Conselho de Administração da FIFA, tendo sido Diretor de Inovação e Transformação Digital. Numa longa carreira de 28 anos em inovação e crescimento comercial, também trabalhou com algumas das maiores marcas mundiais e ocupou cargos de liderança no Manchester City e no Valencia.
Começou por se tornar conhecido quando trabalhou com Luís Figo e Ronaldo Fenómeno, tendo também prestado orientação estratégica a clubes como o Real Madrid ou o AC Milan, a organizações como a Premier League ou a Liga Espanhola e outras grandes marcas do desporto, como são a Red Bull, a Ferrari ou a Lotus.
Agora está de regresso a Portugal para ser chairman da Apex e o Maisfutebol falou com ele sobre o futuro da indústria do futebol. No dia em que o FC Porto anunciou a entrada no mundo dos fan tokens, tal como o Sporting já tinha feito, e numa altura em que Mark Zuckerberg nos pôs a falar de metaverso e do desafio de criar um mundo virtual.
Uma das coisas que se diz é que a inteligência artificial, a realidade aumentada e o NFT’s vão ser disruptivos no futuro do futebol. Que papel vão ter estes conceitos afinal no futebol?
O desporto é uma das maiores indústrias, gerou sempre muitíssimo dinheiro, mas na realidade tem o mesmo modelo de negócio há mais de trinta anos. Um modelo de negócio muito dominado pelos direitos de media. Depois há os partners comerciais, os patrocínios, o ticketing, a hospitality, mas a fonte de financiamento dominante são os direitos de media. Ora os direitos de media, tal como os conhecemos, poderão ter volatilidade no médio prazo. Isto não tem a ver com a qualidade do trabalho das instituições, é uma trend mundial: cada vez mais se vai direto ao consumidor.
Certo.
Todos os negócios hoje em dia têm essa perspetiva, de conhecer a sua comunidade e de interagir com essa comunidade. O desporto tem a maior comunidade do mundo, mas isso não quer dizer que a conheça, porque no meio, entre o desporto e o consumidor, houve sempre um intermediário que estabelecia a relação: ou uma empresa de media, ou um sponsor, qualquer coisa. Esse é um problema que a indústria tem que resolver num espectro dos próximos dez ou quinze anos, porque vivemos num mundo em que a relação com o consumidor é essencial. Não pode haver terceiras partes que controlam a relação do desporto com o usuário.
Até para poder mais facilmente recolher os dados, não é?
Exatamente. A parte de dados vem com a vertente tecnológica e está relacionada com conhecer a comunidade. Muitos dos grandes negócios mundiais que existem hoje em dia são negócios que vivem da exploração de dados: a Amazon, o Facebook, agora Meta, o Twitter, etc. Estes foram negócios que cresceram muito rapidamente porque conhecem os seus usuários e têm os dados dos seus usuários. Sabem onde moram, a que hora do dia acordam, a que hora do dia conectam com a plataforma, como interagem com os seus amigos. Isto é algo que permite monetizar a relação, e muitas vezes até indiretamente, porque o usuário não percebe que está a ser monetizado. Quando olhamos para o poder que têm as data companies, era bom que o desporto também pudesse ter essa capacidade de conhecer os seus consumidores.
Mas como o pode fazer, não sendo uma empresa de dados?
O negócio do desporto é no fundo uma grande data company, talvez até a maior do mundo. Simplesmente não está a ser explorada pela entidade que gera o espetáculo. Quando olhamos para o negócio da música, vemos que o negócio dos promotores de concertos mudou muito, porque têm acesso a uma comunidade. Quando querem vender uma entrada, sabem que determinada pessoa já esteve em nove concertos este ano, deste tipo de música, e que por isso estará mais disponível em ir ao décimo concerto. Da mesma forma que sabem que outra pessoa não quer deslocar-se pessoalmente, mas está disponível para ver o concerto online.
O futebol não faz ainda esse trabalho, portanto?
Faz um trabalho mínimo. Os clubes a nível global, não estamos a falar só dos clubes portugueses, podemos falar do Real Madrid, do Manchester United, do PSG, a base de conhecimento da sua comunidade andará à volta de dez a quinze por cento. Há todo um potencial ainda por conquistar.
Uma empresa de dados conhece melhor os adeptos de determinado clube do que o próprio clube?
Para controlar o ecossistema tem de se controlar a plataforma e hoje em dia as plataformas onde os fãs se conectam, onde criam a sua interação e muitas vezes até o seu próprio conteúdo, não são controladas pelos clubes, nem pela FIFA, nem pela UEFA, nem pelas federações. São controladas pelo Facebook, pela Google, pelo Twitter. Portanto, o ecossistema tem um proprietário externo.
E qual será o papel por exemplo dos NFT’s ou dos tokens nesse caminho a percorrer?
O blockchain dá a possibilidade de gerar uma interação direta entre as entidades desportivas e os seus fãs, mas acima de tudo cria oportunidades de monetização. O que é uma evolução no negócio do desporto. Todos nós falamos do digital há muitos anos, mas até hoje foi muito difícil criar um modelo escalável e contínuo de monetização digital no desporto. Os clubes têm a suas plataformas e têm alguma monetização com elas, mas no essencial o digital acaba por ser acessório, é algo que se usa com o sponsor A ou o sporsor B, algo que se usa para potenciar determinado produto e não algo que por si só gera monetização contínua em tempo real.
Os tokens são exatamente isso, um produto de interação.
Os tokens foram criados para ser um meio do fã estar mais próximo e apoiar remotamente. Os clubes têm sempre uma primeira linha de adeptos, que são aqueles que vivem na cidade, vão aos jogos e acompanham continuamente o clube, e depois têm uma comunidade enorme virtual, de fãs que vivem na Ásia, na América do Sul, em África, sejam essas pessoas estrangeiras ou nacionais a viver no estrangeiro. A maior parte dos clubes pouco ou nada conhece desses fãs. Os tokens permitem que uma pessoa em qualquer parte do mundo possa conectar-se com o clube que gosta, ou com o jogador que gosta, e permitem à entidade desportiva poder recolher os dados dessas pessoas. Agora temos de criar uma forma de essas pessoas poderem participar nas decisões, sendo que há clubes que já dão essa faculdade aos proprietários de tokens.
Sim, mas são coisas básicas ainda...
É a possibilidade de decidir o terceiro equipamento, qual é a música com que a equipa entra no campo ou qual é a cor do autocarro. É um início, mas vejo um grande potencial da tokenização. Até porque é uma forma de os fãs poderem ter alguma equidade nas decisões do clube que gostam. Eventualmente podemos chegar a ter um dia um clube completamente tokenizado, totalmente detido pelos fãs, que não será algo muito diferente do que acontecia há uns anos quando os clubes não eram Sociedades Anónimas Desportivas.
E como caracterizaria os NFT’s?
A parte dos NFT’s tem um interesse, penso eu, brutal porque permite grandes margens de retorno por exemplo para quem investe, e muito através da exploração do mercado secundário, que é um mercado em que há muita especulação. Mas acima de tudo os NFT’s são um produto que permite à indústria monetizar algo a que não se dava valor, que é o arquivo.
Como assim?
É considerado arquivo dois dias, ou doze horas, ou dezoito horas após ter acontecido, depende das Ligas. Portanto o arquivo tanto pode ser uma coisa muito antiga, como uma coisa muito recente. Durante muitos anos esse património foi um peso morto, que só servia para ser cedido a empresas de media, para fazer um filme sobre um momento importante, para interagir com os fãs nas redes sociais, mas não tinha um valor económico percebido. Sempre achei que o arquivo talvez fosse um dos ativos mais importantes de uma organização desportiva e hoje, através dos NFT’s, vemos que tanto o arquivo fotográfico como o arquivo de vídeo têm realmente um valor. Temos exemplos muito interessantes de monetização dos NFT’s e o desafio agora é fazer NFT’s near live ou live. A empresa Socios fez uma experiência na semana passada, no Roma-Milan, em que criou NFT’s de algo que estava a acontecer no jogo quase em tempo real, o que criou uma competição entre as pessoas para ficar com um dos cem NFT’s desse jogo.
A dificuldade será convencer os velhos do Restelo que a inovação digital já é o presente.
Claro que no mundo da geração que se calhar eu represento, porque já tenho mais de 50 anos, isto pode criar alguma confusão. Porque é que eu vou pagar por algo que posso conseguir na internet grátis? Eu posso ver o vídeo desse golo, por exemplo, grátis. Na realidade o que muda é que há um mercado em que esse NFT tem um valor único, porque através do blockchain passa a ter um registo de autenticidade, em que se pode certificar se num determinado marketplace existe um exemplar daquele momento, existem cem ou existem mil, e isso é que cria o valor do NFT. Esta é uma boa notícia para a indústria, já é uma fonte de rendimento muito importante para certos clubes, em alguns casos até superior ao valor do patrocínio principal da camisola.
Isso já acontece?
Sim, sim, já acontece em alguns casos do futebol europeu. É uma importante fonte de rendimento para os clubes e tem também a particularidade de dar aos fãs a possibilidade de realizarem uma mais-valia financeira, seja através da compra e venda no mercado secundário, seja através da criação dos seus próprios NFT’s, que é uma nova oportunidade que se abre aos co-creators.
Mas há uma coisa que para muitas pessoas será difícil de entender: quando se investe num quadro, por exemplo, pode-se pendurá-lo na sala. Um NFT não...
Hoje há pessoas que investem dez, quinze ou vinte milhões de euros numa peça de arte digital. Pode ser uma réplica de uma peça original ou pode ser uma criatividade que se criou especificamente só para aquela peça. E há muitas pessoas que expõem estas obras em casa num screen digital. E é basicamente como estar a olhar para um quadro do Picasso ou do Van Gogh.
É o futuro da arte, então?
Temos de nos recordar de uma coisa. A nossa geração vai madurar e desaparecer. As gerações que vêm a seguir, e sobretudo a Geração Z, que é muito preponderante, já é 40 por cento da população mundial, e a Geração Alpha, que são os miúdos nascidos após 2010, são completamente diferentes. Quem tem filhos de seis, sete ou oito anos sabe isso. A forma como eles interagem com a tecnologia e percebem o valor é completamente diferente. Para nós o que tinha valor eram assets físicos, era o carro A ou B, era viajar para determinado destino. Para as gerações mais jovens passou a ser importante outras coisas: ter flexibilidade de escolha, personalização da experiência.
E são gerações que já vivem muito digitalmente...
Hoje em dia está na moda falar do metaverso. Não existe um metaverso maduro como vai existir daqui a sete, oito ou dez anos, quando existir uma realidade imersiva em que vamos confundir o que é real e o que é virtual, mas hoje já existe um mundo virtual com fenómenos muito interessantes. Por exemplo, o jogo FIFA tem uma comunidade de 250 milhões de pessoas, que passam parte do seu tempo a jogar. Quando trabalhei na FIFA, tentámos trazer essas pessoas para a prática do futebol. Conseguimos capturar quase 50 por cento dessa comunidade. Mas se não fosse o FIFA, essas pessoas não iriam praticar futebol. Outro exemplo, há pessoas que gastam cinco ou seis milhões de dólares a comprar um terreno virtual, um terreno que não existe. E constroem lá a sua casa virtual, com a sua sala virtual, onde estão a conversar com os seus amigos de forma virtual. Perguntamos: como é possível? Mas acontece e tem um valor. Neste caminho para o metaverso tem um valor cada vez maior. Por exemplo, numa simulação de Miami, o metro quadrado no mundo virtual estava superior ao metro quadrado no mundo real. Se isto tem lógica? Se o entendemos? Todos nós podemos ter uma opinião. Mas há um processo que está a acontecer e que não podemos parar, só podemos conduzir e influenciar. Basta pensar que hoje praticamente já não usamos dinheiro físico, usamos cartões ou fazemos pagamentos online. Já vivemos num mundo financeiro digital. O próximo passo são as criptomoedas, que ainda exigem um caminho, sobretudo em termos de legislação, mas que também são um fenómeno imparável. Até o Banco Nacional de Inglaterra, super tradicional, vai emitir criptomoedas.
Falou que ainda existe um caminho em termos de legislação e esse pode ser um problema para toda esta transformação digital, não?
A velocidade a que os governos se vão adaptar a esta transformação é uma questão importante. Mas, por exemplo, visitei recentemente Andorra, conheci o governo local e vão criar legislação sobre NFT’s já em dezembro. O que dá uma ideia de como o mundo está a evoluir. As organizações que gerem o desporto, os clubes, os atletas vão ter de se adaptar. É impossível dizer qual vai ser o caminho, se vamos mais por aqui ou por ali, mas é um fenómeno de mudança altamente radical.
O futebol moderno roubou o sentimento de comunidade que existia, por exemplo, no tempo dos nossos pais. Os clubes são cada vez mais fechados e distantes das pessoas. Até que ponto os tokens podem compensar isso?
O futebol profissionalizou-se, os atletas precisam de mais tempo para se preparem física e psicologicamente, os clubes tornaram-se negócios e há uma falta de personalização da experiência de ser adepto. Sobretudo para os adeptos que estão mais distantes. Os clubes não perguntam o que os fãs querem, não sabem e o fã não pode ter a experiência que quer. Isso tem que mudar, porque esta geração não admite não ser ouvida e não fazer parte de um sentimento de pertença. O token permite uma comunicação bidirecional, que é algo que não existia no desporto. Agora depende de como construirmos algo que possa ser personalizado e possa responder às necessidades da comunidade. Eu contacto muito com clubes e a perceção que tenho é que os clubes começam a perceber a relação que podem construir a partir dos tokens e da variação de tokens.
Mas não é um processo que vai demorar muito tempo?
É um processo que precisa de tempo, sobretudo porque tem de ser autêntico. Não vale a pena criar um produto que parece fabricado. Não vai funcionar. Tem de ser autêntico, tem de ser personalizável e tem que dar acesso ao contacto com o clube. Hoje em dia já temos experiências muito interessantes em termos de realidade aumentada e realidade virtual. Que é o que os jovens querem. Mas acho que tem de haver uma mescla de experiência remota virtual com a conversão em experiência pessoal. Por exemplo, se alguém é fã do Ronaldo, pode ter uma interação muito grande, pode ter acesso a conteúdos especiais, mas o clique excecional em termos de relação vai acontecer quando o puder conhecer ou receber uma camisola com uma dedicatória personalizada.
Hoje fala-se muito do metaverso por causa do Facebook. Com todas as dúvidas que ainda existem sobre o metaverso, como é que acha que pode influenciar a indústria do futebol?
Eu acho que mais do que uma transformação radical, vai ser uma otimização da perspetiva do mundo e das experiências que as gerações mais jovens já têm. O mundo nos próximos dez ou quinze anos vai mudar muito, o próprio trabalho como o conhecemos está a ser fortemente mudado, já trabalhamos remotamente, já existem países que impõe um máximo de dias de trabalho inferior ao tradicional, portanto vão surgir novas formas de utilizar o tempo, vai haver mais disponibilidade para o mundo virtual, acho que vai haver um marketplace de dados pessoais.
E como é que isso pode impactar no futebol?
O impacto do mundo digital vai claramente influenciar toda a indústria do desporto, seja nos seus modelos de monetização, na forma como interagimos ou na forma como promovemos práticas de vida saudável. Por exemplo, quando estava na FIFA, criámos com a EA, com a Adidas e com a Google uma sola conectada, que qualquer um podia ter no seu sapato, e tudo aquilo que fazia no mundo real, caminhar, correr, marcar golos nos jogos com os amigos, era convertido em vantagens no jogo FIFA. Portanto, é possível através do virtual influenciar as pessoas a ter uma vida mais saudável, porque ninguém quer que o mundo virtual venha criar hábitos de sedentarismo que provoquem graves problemas de saúde pública.
Isso significa que...
É um game changer. Vai mudar o desporto tal como o vemos hoje em dia. Mas vai ter um lado muito positivo. Acima de tudo vai permitir ter um reequilíbrio de forças, porque se calhar um desporto pequeno ou um clube pequeno no mundo real, pode ser uma referência no mundo virtual. Já tivemos alguns fenómenos interessantes. Por exemplo, há pessoas da velha guarda que acham que é impossível criar um desporto, mas outro dia o Piqué, na Cosmos, resolveu criar um campeonato do mundo de balões de ar. Toda a gente achou que não ia funcionar, mas ele sabia que o denominador comum tinha de ser colocar seleções nacionais a competir entre elas. Criou 16 seleções nacionais, fez a produção do evento, angariou patrocinadores, teve milhões de pessoas a ver esse conteúdo e hoje tem uma base que lhe permite, se ele quiser, criar um desporto novo a partir daí. Nós, com a nossa idade, achamos que isto ou aquilo nunca vai existir, mas hoje é possível criar uma série de coisas novas pela digitalização, pela disponibilidade de conteúdos e pela geração de um modelo de negócio que conecte com o que certo público quer. É um mundo incrível de oportunidades e eu tenho uma visão muito positiva do que pode vir a acontecer.
Será possível daqui a uns anos imaginar uma pessoa a assistir virtualmente a um jogo no estádio?
Isso hoje em dia já é possível.
Sim, já é possível, mas quase numa vertente experimental.
Sim, mas já é possível. Embora a qualidade da experiência tenha de ser melhorada e tenha de ser mais personalizada. Ter um dispositivo que possibilite uma realidade imersiva é caro, a qualidade do conteúdo ainda não é a melhor. Portanto temos de trabalhar muito nesse aspeto. Mas temos uma componente que é importante, porque no espectro de um jogo de noventa minutos já existe uma comunidade que é diferente, não está a ver o jogo todo, não está a ver sequer 45 minutos, está apenas a ver momentos que lhe interessam, um golo, um momento de grande burburinho dos fãs, uma decisão de penálti do árbitro. Já existe uma comunidade muito grande de adeptos que vê quatro ou cinco momentos de um jogo.
Mas em diferido...
Não, não. Em near live. Infelizmente ainda é feito muito em termos de pirataria, mas, por exemplo, nos dez segundos a seguir à celebração de um golo há milhões de conteúdos que são feitos por pessoas que estão a milhares de quilómetros desse local, a criar o seu próprio conteúdo desse golo. Essa é uma comunidade completamente diferente e as entidades do desporto têm de perceber que é necessário criar conteúdo para essas comunidades. Essas comunidades não canibalizam a comunidade que já existe e que vai aos jogos todos os fins de semana, porque são comunidades diferentes. Estas novas comunidades vão ter uma relação diferente com o clube, mas são valiosas. São comunidades que não só consomem, mas também criam, e criam conteúdo sobre conteúdo, que vai perpetuar um golo ou um momento de um jogo no tempo.
Certo.
Quando olhamos para o metaverso e para aquele ecossistema digital de grande escalabilidade, nós hoje em dia ainda temos problemas tecnológicas complicados. Muitas vezes as pessoas não se apercebem, mas continuamos a ter problemas de concorrência, quando muita gente tenta conectar-se ao mesmo conteúdo digital em simultâneo. Isso cria uma pressão enorme sobre as operadoras de telecomunicações e a infraestrutura existente. Mesmo no espectro de e-sports, é muito difícil cem pessoas em cem países diferentes, com níveis de conectividade e níveis de latência diferentes, conseguirem jogar em tempo real um mesmo jogo, seja um Fortnite, um League of Legends ou outro. Conseguimos fazê-lo em teste, não se consegue escalar em termos industriais. Portanto, é fácil falar do metaverso mas outra coisa é o desafio tecnológico que vai ser criar um mundo virtual escalável para toda a população que existe no planeta. Não é só o 5G que vai resolver isso.
Voltando ao futebol no fundo a digitalização vai trazer vários novos públicos?
Existem vários consumidores para vários tipos novos de produto e tudo isso cria oportunidades de monetização e oportunidades de engagement. Mas é preciso que os clubes pensem estrategicamente a médio e longo prazo. Infelizmente no desporto pensa-se apenas no curto prazo. Isso é algo que temos de mudar.
O desporto já percebeu que está a competir neste campeonato digital com outras indústrias que são fortíssimas nesse aspeto?
Pois, as pessoas têm de perceber que o futebol já não está a competir com o ténis ou a Fórmula 1, está a competir com os e-games, com as plataformas digitais... O futebol, o ténis, a Fórmula 1, o râguebi, todos têm de perceber que têm de competir e para competir precisam de trabalhar juntos. Por isso aprecio muito o trabalho que as ligas profissionais estão a fazer dando importância aos pequenos e médios clubes e à faculdade de colocar todos a trabalharem juntos, por exemplo na centralização dos direitos televisivos. No Man. City conseguimos criar um Comercial Working Group. Começámos a trabalhar com o Arsenal, depois com o Chelsea e no final todos se juntaram. No futebol há um grande medo de falhar. Toda a gente acha que não pode falhar. Mas falhar faz parte do processo. Os negócios milionários de tecnologia mostram que falhar é normal. É preciso ter a coragem de experimentar e de testar. Algumas vezes vamos acertar, outra vamos falhar.