«Este Benfica talvez seja a melhor equipa que vi de Schmidt»

20 out 2022, 17:21
V. Guimarães-Benfica (LUSA)

José Boto, em entrevista ao Maisfutebol, fala do seu futuro e dá opinião sobre a Liga 2022/23

Quase a completar o primeiro ano como diretor desportivo do PAOK, José Boto concede uma entrevista ao Maisfutebol. Aproveitando uma curta viagem a Portugal, o dirigente português faz um balanço do trabalho em Salónica, fala dos vários portugueses que jogam no clube e olha também para a Liga portuguesa.

Neste excerto aqui apresentado, Boto fala dos convites que tem recebido ao longo dos últimos anos, é questionado sobre a possibilidade de voltar a Portugal em breve, e faz ainda uma análise da edição 2022/23 da Liga portuguesa.

MF: A meio do ano falou-se da possibilidade de ir para o Flamengo? Houve conversas nesse sentido?

JB: Aquilo que eu soube, soube pela imprensa. Tenho algum cartaz no Brasil, pelos anos no Shakhtar, a recrutar lá jovens, alguns sem jogar na Serie A, e que depois apareciam na Liga dos Campeões. Alguns a chegar à seleção brasileira, embora já tivessem um historial nas seleções jovens. Isso abriu-me mercado no Brasil. Fez com que olhassem para mim como alguém que via para além do que lá viam. Jogadores que não jogavam no Grêmio, como o Tetê, ou no At. Paranaense, como o Marcos Antônio, que nem jogavam na Série A, e depois passam a jogar Champions League a um nível elevado. Isso abriu-me algumas portas, inclusive a nível da imprensa. E cada vez que precisam de alguém para pensar um pouco o futebol, é normal que mesmo os adeptos ou a imprensa falem de mim.

MF: Também já foi algumas vezes sondado para um regresso a Portugal. Isso está no horizonte próximo? Pode ser uma realidade?

JB: Pode. Como todos os portugueses… temos este espírito de emigrante, mas gostamos sempre de voltar à nossa terra. Mais ano, menos ano, vou pensar nisso, em voltar a Portugal. E mais do que pensar em questões financeiras, pesará o projeto que tenha a minha cara. E isso pode acontecer nos próximos anos.

MF: Tem acompanhado a Liga portuguesa? O que destaca?

JB: Acompanho quase todas as boas ligas, e a nossa é boa, e é nossa. Tinha curiosidade especial por causa da chegada de um treinador estrangeiro a um clube grande. Um treinador que eu já conhecia bem, com ideias completamente diferentes, e ver como resultava. Dá gosto ver este Benfica, pelo menos até agora. É excelente para o futebol português. Temos muito uma ideia - errada para o desenvolvimento dos nossos treinadores e do nosso futebol -, que não temos nada a aprender com os estrangeiros. Mas nós gostamos de ir para o estrangeiro e mostrar o nosso trabalho. Tem sido excelente a influência do Schmidt, pois tem ideias novas, coisas novas a nível tático. A longo prazo isso vai fazer evoluir o futebol português e a capacidade dos treinadores portugueses. Não devemos ter medo de abrir as portas a pessoas de fora. Isso, a forma como o Benfica joga, como se tem apresentado na Liga e na Champions, é excelente para o Benfica e para o futebol português. Não podemos cair no erro de pensarmos que somos os melhores e não temos nada a aprender com os outros. Como acontece no Brasil com os treinadores portugueses. Somos muito bons, mas temos sempre algo a aprender e a beber dos outros.

MF: Já era um admirador de Roger Schmidt, portanto?

JB: Sim, sobretudo os tempos dele do Bayer Leverkusen. A pressão alta, sobretudo. No PSV também. No Benfica mudou um pouco algumas coisas, para melhor, devido às características dos jogadores. Dá um pouco mais de pausa. No Leverkusen e no PSV tinha um pressing muito intenso, muitas vezes corria riscos desnecessários. Aqui tem um pouco mais de pausa, mantém mais a bola. Era muita vertigem quando recuperavam a bola, e agora têm um pouco mais de pausa. Tem a ver com jogadores como João Mário, Enzo, o próprio Neres. Isso demonstra uma grande inteligência da parte dele. Talvez seja a melhor equipa de Roger Schmit, desde que o acompanho.

MF: Um dos destaques tem sido o Enzo. Era o médio que o Benfica precisava há alguns anos?

JB: Talvez. Mas isso depende muito das ideias do treinador. Visto de fora, achamos sempre que aquele jogador encaixava ali. É um jogador com um talento e umas características de top. Infelizmente não me parece que fique muito tempo, como é natural em Portugal. É isso também que faz os clubes portugueses terem o sucesso que têm. Antecipam-se, vão buscar primeiro, depois vendem. Isso também explica o sucesso de Portugal. Mas se era o médio que o Benfica precisava há alguns anos… depende do encaixe nas ideias do treinador. Se calhar com outro treinador não teria o sucesso que está a ter com este.

MF: E como tem visto a afirmação do António Silva?

JB: Quando eu saí do Benfica ainda ele tinha 13 anos (risos). É uma surpresa, não o conhecia bem. É uma surpresa a maturidade que apresenta. Por acaso temos também um miúdo com a mesma idade, o Konstantinos Koulierakis, a jogar desde o início da época. Um central esquerdino, que na minha opinião não fica nada a dever ao António. Talvez até seja um pouco mais rápido. Isto prova que, quando os treinadores têm coragem, e só olham para a qualidade, a idade não importa nada. Fico sempre contente com isso, quando alguém não olha para o bilhete de identidade. E fico contente por ter alguém na minha equipa já a despertar curiosidade dos grandes clubes europeus. O nosso guarda-redes (ndr. Dominik Kotarski, croata, 22 anos) também já está a despertar muita curiosidade. Neste jogo com o Olympioakos havia muitos scouts, o que até foi muito comentado, pois na Grécia não há muita aposta em jovens, e por isso a Liga não alicia tantos scouts. Nós temos cinco jogadores abaixo dos 22 anos. Isso provoca maior afluência de scouts nos nossos jogos.

MF: E, voltando à Liga, o que diz de FC Porto e Sporting?

JB: O FC Porto surpreende sempre pela capacidade de se reinventar. Perde jogadores importantes, como o Vitinha e o Fábio Vieira, e depois parece que é desta que vai cair, mas não. Mérito total do Sérgio Conceição, que consegue sempre arranjar soluções para a equipa continuar competitiva. Começou mal na Liga dos Campeões, mas a forma como jogou com Leverkusen, por exemplo, mostra que ainda vai dar mais do que está a dar. Embora muita gente pensasse que o FC Porto podia ser mais fraco, pelas perdas que teve. O Sérgio tem mostrado que consegue sempre arranjar soluções para aliviar essa situação, o que também diz muito da sua qualidade como treinador. O Sporting não tenho visto tanto, confesso. Acompanho mais pelo que leio do que propriamente por ver os jogos. Não estou tanto à vontade para falar. Mas digo que, muitas vezes, menosprezamos uma coisa no futebol. Queremos explicação para tudo, mas menosprezamos o fator sorte. Se calhar a sorte que o Ruben teve naquele primeiro ano, nos jogos em que as coisas não estavam a correr tão bem, e depois aparecia um golo do Coates… Se calhar agora, mais do que a falta de certos jogadores, ou o Ruben não ter encontrado a melhor forma de montar a equipa, se calhar tem faltado ali uma pontinha de sorte.

MF: E algum destaque mais, entre as outras equipas?

JB: Dos menos conhecidos não posso falar, pois pode existir lá algo que me interesse (risos). Dos mais conhecidos, como não são para a bolsa do PAOK, é que posso falar. Gosto muito do Vitinha do Sp. Braga, que tem uma equipa muito interessante, um projeto muito interessante. O Famalicão tem sempre jogadores muito interessantes, embora não esteja a fazer um campeonato muito bom.

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