João Almeida: «Acredito que posso vir a vencer uma grande Volta»

22 jan 2022, 09:36

Entrevista Maisfutebol/CNN ao ciclista português que assinou pela equipa do fenómeno Tadej Pogacar e que quer o pódio na próxima edição do Giro. O Tour? Quando se sentir preparado, mas uma garantia: «Quando for, é para discutir a corrida»

Em 2020, A-dos-Francos vestiu-se de rosa pelo filho da terra quando este andou 15 dias com a maglia rosa vestida no Giro.

Um ano e dois meses depois daquela Volta a Itália que foi tarde para a estrada devido à covid-19, não há rosa no 'dress code' das gentes da pacata vila do concelho das Caldas da Rainha, mas no alcatrão da rua estreita, de subida curta mas pendente assinalável onde vive a família de João Almeida, ainda estão pintadas duas (pelo menos) bicicletas rosas que vão resistindo à passagem do tempo.

Em janeiro de 2022, João está hoje consolidado no pelotão internacional. Depois do quarto lugar no Giro’2020, um 2021 com um sexto posto nesta prova (com o mesmo tempo do quinto) e as primeiras vitórias no World Tour (Volta à Polónia e ao Luxemburgo) provaram que nada foi por acaso. É que João não tem queda para acidentes: nem para estes do destino nem, «graças a Deus», para os outros.

No arranque de 2022, encontrámos João Almeida em A-dos-Francos dias após um estágio de pré-época em Espanha com a nova equipa: a UAE Team Emirates, que tem nas fileiras os portugueses Rui Costa, os gémeos Oliveira e, também, Tadej Pogacar, o maior fenómeno da atualidade no ciclismo e, com os mesmos 23 anos de João, já bicampeão do Tour. «Se não os podes bater, junta-te a eles», brinca.

Em entrevista conjunta ao Maisfutebol e à CNN, o melhor ciclista português da atualidade justificou a troca da Quick-Step pela nova equipa, olhou para o ano que passou e projetou 2022, no qual vai ser chefe de fila da Team Emirates na Volta a Itália e tem como objetivo terminar no top-3 e tornar-se no segundo português, depois de Joaquim Agostinho, a fazer pódio numa das três grandes. «Terei sete colegas que me vão ajudar só a mim e não posso falhar», diz quem gosta deste tipo de pressão e acha que tem o que é preciso para ser os dos maiores da história do ciclismo português

A esta conversa nem Deus faltou. Não falte você também.

Maisfutebol/CNN – Acabámos de o acompanhar num treino de hora e meia e tudo isto, esta tranquilidade absoluta, contrasta com aquelas imagens das estradas cheias de adeptos a incentivarem-no e as câmaras em cima de si. Ser ciclista profissional também é este trabalho solitário?

João Almeida – Sim. Mas eu gosto de treinar sozinho. Desfruto disso, de ir ao meu passo e fazer o meu treino concentrado. Mas, de facto, a loucura do ciclismo é incrível, algo do qual eu gosto e que não trocava por nada.

MF/CNN – Quem é que o fez querer ser ciclista profissional? Quem foram os seus modelos?

JA – Sempre fui fã do [Christopher] Froome. Desde que vejo ciclismo, sem dúvida que foi um dos meus ídolos para me focar no que eu queria. As primeiras memórias que tenho do ciclismo profissional são do Froome a ganhar a Volta a França. Já comecei a ver ciclismo na televisão um pouco tarde. Tinha 13, 14 ou 15 anos.

MF/CNN – E a pedalar?

JA – Desde os cinco anos que pedalo e comecei a fazer provas aos 12 ou 13 anos.

MF/CNN – Mas era em Froome que pensava quando fazia todas estas subidas que existem perto de A-dos-Francos?

JA – Sim, tal e qual! Eu fazia séries no Montejunto – e ainda faço – e lembro-me de ter 16 ou 17 anos e subir a serra a imaginar o Froome na minha cabeça. Dava motivação e força.

MF/CNN – Froome foi uma referência, mas considera-se parecido a ele ou a algum outro ciclista da atualidade ou do passado?

JA – Identifico-me com o Tom Dumoulin. Acho que somos corredores similares. Claro que ele tem um palmarés maior do que o meu, mas também o tenho como ídolo e temos características similares.

MF/CNN – Em que aspetos?

JA – Somos bons no contrarrelógio – se calhar, ele melhor do que eu, porque já foi campeão do mundo – temos o Giro em comum [n.d.r.: Dumoulin obteve os melhores resultados da carreira no Giro, que venceu em 2017], somos bons trepadores e fazemos as subidas ao nosso ritmo. Acho que é isso.

MF/CNN – Aos 23 anos, o João é forçosamente alguém com uma vida diferente daquela que é o padrão de um jovem com a sua idade. Do que é que tem mais saudades?

JA – Tenho saudades da escola e do convívio com os meus amigos. São alturas que nunca vou esquecer. Tive uma adolescência diferente, mas não mudava nada.

MF/CNN – Teve uma adolescência diferente porque queria ser ciclista profissional?

JA – Sim. Eu sempre fui muito focado no que fiz. Com 15 anos, eu saía da escola e ia treinar. Depois, tinha de me deitar cedo para descansar. Foquei-me nisso ao máximo.

MF/CNN – Nunca sonhou ser outra coisa?

JA – Também nunca imaginei que viria a ser ciclista profissional. Fazia isto porque gostava, do ciclismo e do convívio em si. Mas, com 17/18 anos, quando era júnior comecei a ver que tinha potencial e que tinha qualidades. Mas tem de se trabalhar muito, porque sem trabalho não chegamos lá. Aí comecei a meter na cabeça que era isto que eu queria para a minha vida.

MF/CNN – E quedas? Nunca o fizeram questionar porque é que decidiu ir para cima de uma bicicleta?

JA – É normal ir de vez em quando ao chão. A primeira queda que tive foi quando ainda praticava BTT. Foi a minha primeira ida ao hospital, com 13 ou 14 anos [risos]. Em competição também já caí várias vezes. Numa, em competição, foi mais grave: não parti nada, mas fiquei todo esfolado e demorei algumas semanas a recuperar. Mas, graças a Deus, nunca tive nenhuma lesão. Esta profissão tem um risco muito elevado e em competição há riscos em todas as curvas. Há que ter muito cuidado, porque podemos perder a vida num instante.

MF/CNN – Mas depois de uma queda, para além da recuperação física, há que recuperar a confiança, certo?

JA – Normalmente as nossas quedas não dependem de nós e são provocadas por fatores externos, por isso a confiança que temos em nós próprios não é posta em causa. Claro que temos de voltar a ganhar a confiança na estrada, mas o mais duro é vermos os nossos adversários a treinar, a competir e nós no sofá a recuperar.

MF/CNN – Mas isso não o faz travar um pouco? Quando estava da Quick-Step teve colegas que sofreram quedas graves.

JA – Faz-me travar um pouco e tenho de ter noção da realidade. A vida não é só ganhar dois segundos numa curva, embora isso possa fazer a diferença em competição. Mas há que ter noção da realidade. O Remco [Evenepoel] e o Fabio [Jakobsen] tiveram quedas muito graves e o Fabio foi por um triz. E isso dá-nos noção de que temos de ter responsabilidade.

MF/CNN – Reza?

JA – Sou católico não praticante. Não costumo rezar, mas acredito em Deus e acho que ajuda. Peço proteção e que as coisas corram sem azares, que é o fundamental. Desde que não me magoe, acho que vou estar sempre feliz.

MF/CNN – Acaba de chegar à UAE Team Emirates, que é garantidamente uma das melhores equipas do pelotão internacional. O que pesou mais na decisão de ir para esta equipa?

JA – Tive a possibilidade de poder escolher qualquer equipa do World Tour graças ao meu trabalho e aos meus resultados. Mas o que pesou foi o desenvolvimento para o futuro, o longo-prazo. A equipa tem bons treinadores, bons nutricionistas e boas condições. E tem um ambiente familiar onde me vou sentir bem. Estando longe de casa o ano inteiro, acho que é muito importante sentir-me como se estivesse em casa e sinto que fiz a escolha certa.

MF/CNN – O que é que lhe podem dar de diferente na UAE Team Emirates que não lhe dariam outras equipas que manifestaram interesse em si?

JA – A Emirates acredita em mim a 200 por cento, de corredores a diretores. Daí também o contrato de cinco anos. E ser chefe de fila nas corridas e ter uma equipa ao meu redor mostra também isso e dá-me motivação e responsabilidade para fazer melhor.

MF/CNN – Ter outros portugueses já na equipa, como Rui Costa e os irmãos Oliveira, também pesou nesta escolha?

JA – Os gémeos e principalmente o Rui, que vai estar mais em contacto comigo e vamos fazer corridas juntos, pesou na minha decisão. É um corredor com muita experiência e poderei aprender com ele.

MF/CNN – Aconselhou-se com ele antes de tomar uma decisão?

JA – Sim. Perguntei-lhe com era a equipa e o ambiente.

MF/CNN – E ter um antigo campeão do Mundo a trabalhar para si…

JA – Sim [risos]. E vencedor de etapas da Volta a França, da Volta à Suíça… É um corredor de excelência, um senhor, e quero aprender muito com ele. É alguém muito inteligente, que sabe estar no sítio certo à hora certa. No ciclismo há que ter sangue frio e saber o timing certo para se atacar, porque a força que se gasta não se recupera.

MF/CNN – O João parece ter quase sempre o rosto cerrado a correr. Como se muitas vezes não se passasse nada mesmo quando está sujeito a grandes esforços.

JA – Já me disseram isso. Posso ir a 200 de pulso e ainda consigo pensar na corrida.

MF/CNN – Duzentos de pulso é mau?

JA – É bom. Quer dizer que estou no limite [risos].

MF/CNN – Terminou há poucos dias um estágio de pré-época em Espanha com a nova equipa. Quais foram as sensações que teve deste contacto com os novos colegas?

JA – Bastante boas! Gostei bastante de toda a equipa: massagistas, mecânicos, corredores e sinto-me bastante bem na equipa. Somos como uma família e tem tudo para correr bem.

MF/CNN – E deu para perceber porque é que Tadej Pogacar anda tanto e já ganhou o que ganhou com apenas 23 anos?

JA – Tem uma pedalada forte, força nas pernas [risos]. Acho que a força dele é algo natural, que vem da sua própria fisiologia.

MF/CNN – A força nas pernas também vem muito da alimentação?

JA – Temos um acompanhamento diário e para todas as refeições. Posso comer o que quiser. Ou melhor: não é bem o que eu quiser, mas temos um plano para seguir. Podemos trocar refeições e temos uma lista de alimentos para poder saber o que trocar e em que quantidades ingerir.

MF/CNN – Alimentos proibidos?

JA – Grandes gorduras, no fundo. Mas há alturas em que se quiser um KFC ou um Taco Bell não há problema. Mas costumo seguir o plano e acima de tudo gosto de segui-lo.

MF/CNN – E sobre Pogacar. Vai ser bom não ser adversário dele?

JA – Sim. Como se costuma dizer, se não os podes bater, junta-te a eles. E foi o que eu fiz [risos]. É muito complicado conseguir ganhar-lhe. É muito forte, inteligente e há muito poucos ciclistas no mundo que podem fazê-lo.

MF/CNN – Vê-se a trabalhar para ele eventualmente numa Volta a França, que ele já venceu duas vezes?

JA – Gostava muito! Este ano vamos estar os dois na Vuelta, se tudo correr normalmente.

MF/CNN – E o normal é o João ganhar o Giro, o Tadej o Tour e na Vuelta…

JA – Sermos primeiro e segundo [risos]. É indiferente quem é o primeiro. Mas é um orgulho estar na mesma equipa que ele.

MF/CNN – E vê Pogacar a trabalhar para si?

JA – Também vejo. Trata-se de uma pessoa muito boa e um atleta excelente. Mas gostava muito de trabalhar para ele e fazer parte do sucesso dele.

MF/CNN – No Giro vai ser chefe de fila e ter uma equipa a trabalhar para si. Neste momento, a vitória é o objetivo traçado?

JA – O objetivo é o pódio, que já é um objetivo bastante ambicioso e vai ser bastante complicado.

MF/CNN – Quem serão os alvos a abater?

JA – Neste momento estou mais focado em mim, no meu treino. Quando chegar a altura, logo veremos, também pela forma dos atletas ao longo das corridas que faremos até lá. Mas haverá corredores muito fortes.

MF/CNN – No último Giro, a primeira semana correu-lhe mal e depois foi de menos a mais. Onde terá de estar mais forte neste ano?

JA – Infelizmente, no ano passado tive um mau dia na primeira semana, mas faz parte do ciclismo. Mas obviamente que a terceira semana, que é a última, é a mais importante. As energias começam a escassear e claro que é aí que vamos tentar manter o foco a 100 por cento e ganhar tempo aos adversários.

MF/CNN – Teve um dia mau, mas também teve de trabalhar, numa equipa belga, para Remco Evenepoel, um ciclista belga. Onde sente que poderia ter chegado sem esse dia mau e se tivesse ficado definido logo desde o princípio que o João seria chefe de fila na prova?

JA – Sem o dia mau, acho que conseguiria o terceiro lugar. Penso que o pódio seria alcançável, mas nunca vamos descobrir isso. Mas vamos lutar este ano por um pódio.

MF/CNN – Mas essa indefinição que havia na equipa relativamente ao chefe de fila também contribuiu para a sua decisão de sair da Quick-Step?

JA – Acho que o meu lugar, pelo menos, no futuro próximo, não seria a Quick-Step. Pelo facto de não ter uma equipa ao meu redor. Senti que a melhor decisão passava por sair e esses aspetos têm sempre um peso. E com o Remco, que também tem aspirações nas grandes voltas, seria sempre mais difícil. Estou muito contente com a decisão que tomei. Apesar de só ter estado dois anos na Quick-Step, acho que precisava de uma mudança. Sinto-me muito bem e acho que estou no caminho certo, seja para os próximos cinco, dez anos ou o que for.

MF/CNN – Falou há pouco sobre responsabilidade. O Joxean Matxin, diretor desportivo da UAE Team Emirates, disse que o João ia ter uma super-equipa à sua disposição no Giro. Isso coloca sobre si mais pressão do que a que tinha no ano passado?

JA – Coloca pressão, mas no bom sentido, o da responsabilidade. Terei sete colegas que me vão ajudar só a mim e não posso falhar. Vou tentar não falhar e fazer as coisas da melhor maneira possível.

MF/CNN – E que chefe de fila vai ser o João?

JA – Vou sempre respeitar a tática do diretor. Ele está fora da corrida e consegue ver melhor o que se está passar. Mas gosto de sentir aquele ‘bichinho’ da competição e as coisas imprevisíveis que acontecem.

MF – Vê-se mais como um ciclista estratégico e meticuloso ou alguém que é levado por sensações do momento e que o fazem tomar uma determinada decisão num dado momento da corrida?

CNN – Um Froome ou um Contador?

JA – Diria que sou uma mistura dos dois. Mas, obviamente, sou mais Froome: mais racional e conservador.

MF/CNN – No último ano e meio tudo tem acontecido muito depressa na sua carreira. No Giro’2020 era um desconhecido para muita gente e em 2021 confirmou-se definitivamente um dos grandes talentos do ciclismo. Foi mais difícil ser João Almeida em 2021 do que em 2020? Sentiu que as outras equipas já não o deixavam saltar do pelotão de ânimo leve? Houve mais marcação cerrada?

JA – Em 2021 já foi diferente, sim. Em 2020 eu era mais desconhecido e no ano passado os adversários já me tinham mais em conta. Mas foi um grande ano, assim como foi 2020. E vamos ver como será 2022. Já não me deixarão sair tão facilmente, mas espero estar mais forte.

MF/CNN – Onde se vê a atacar no Giro? Nas subidas ou nas descidas? É que hoje em dia parece por vezes que se faz mais a diferença a descer do que a subir…

JA – É verdade. Hoje em dia é mais difícil descer do que subir. Mas depende da situação da corrida, se temos ou não corredores da nossa equipa na frente. Mas eu sinto-me mais confortável a subir.

MF/CNN – Precisa de melhorar na descida?

JA – Acho que tenho uma boa descida, mas não vou correr riscos desnecessários.

MF/CNN – Onde sente que mais cresceu em 2021 face a 2020?

JA – Acho que a minha capacidade física esteve superior e isso permite-me escalar melhor e ter melhores resultados.

MF/CNN – Apesar dos bons resultados que já vinha a obter no pelotão internacional desde 2020, só em agosto de 2021 ganhou pela primeira vez uma prova do World Tour. Estava a mexer de alguma forma consigo não conseguir ganhar uma prova ou uma etapa apesar das boas indicações deixadas?

JA – Sim. Já batia na trave há quase um ano. Já tinha feito segundos e terceiros tanta vez que começava a ficar um bocado frustrado porque não conseguia alcançar a tão esperada vitória. Mas assim que a primeira veio, felizmente vieram mais depois e mais vale tarde do que nunca.

MF/CNN – Quando é que gostava de ir ao Tour pela primeira vez?

JA – Quando me sentir preparado para tal. O Tour tem um nível um bocadinho mais alto do que o Giro e a Vuelta. Quando for para ir, é para fazer o melhor possível e para discutir a corrida. Quem sabe se no próximo ano ou se daqui a dois anos…

MF/CNN – Quando diz que o Tour tem um nível mais alto, refere-se concretamente a que aspetos? É que olha-se para o percurso do Giro e vê-se que talvez até seja mais duro…

JA – Sim. Normalmente, o Giro tem um percurso bastante duro. [João Almeida sopra] Itália tem as subidas mais duras de sempre, mas acho que no Tour há outra pressão, atenção mediática e os atletas têm sempre um nível um pouco mais elevado. E é o nível que faz a corrida dura, embora o percurso também seja um fator. Mas é mesmo o nível dos atletas e o ritmo que torna uma corrida mais dura.

MF/CNN – O que acha do percurso do Giro para este ano?

JA – Não tem muito contrarrelógio e podia haver mais alguns quilómetros [n.d.r.: 26 quilómetros distribuídos pelas etapas 2 e 21]. Mas no fundo a corrida é decidida nas montanhas. Teremos subidas muito duras: Zoncolan, Etna, Mortirolo… tudo e mais alguma coisa. Vai ser um Giro muito duro, com sempre.

MF/CNN – Mas sente que o percurso vai ao encontro das suas características, apesar de não ter tantos quilómetros de contrarrelógio que poderiam permitir-lhe fazer a diferença relativamente a outros favoritos que não são tão fortes nessa especialidade como por exemplo Egan Bernal, vencedor do Giro no ano passado?

JA – Acho que o Bernal vai fazer o Tour. Mas adapta-se às minhas características.

MF/CNN – Tema incontornável do ciclismo. Muitos amantes da modalidade cresceram a ver as conquistas de Lance Armstrong, que depois ficou sem todas as suas sete vitórias no Tour devido a doping. Essa desconfiança ainda existe quando se olha para este desporto?

JA – Infelizmente é o que é, e nada vai mudar isso. Mas tenho a certeza de que é coisa do passado.

MF/CNN – E os ciclistas são muitas vezes apontados como os desportistas mais controlados de todos. Quantos testes faz por ano?

JA – Em competição faço bastantes. Por exemplo, no Giro’2020 fazia controlo antidoping todos os dias. Nuns dias sangue, noutros sangue e urina e noutros só urina. Mas também havia controlos de medicamentos específicos que são proibidos. Em 20 dias de Giro, fiz talvez uns 30 controlos antidoping. O ciclismo é dos desportos mais controlados e há o fator-surpresa. Todos os dias, das 6 da manhã às 11 da noite podem vir a minha casa e fazer um controlo antidoping. De segunda a domingo, 365 dias por ano e seja qual for a minha localização. Não tenho nada a esconder.

MF/CNN – Já lhe vieram bater à porta aqui em A-dos-Francos?

JA – Sim. Aqui e em todo o lado. Espanha, Estados Unidos, Andorra. Já fui controlado em todo o lado.

MF/CNN – Para terminar. Joaquim Agostinho: um dos melhores ciclistas portugueses de sempre. Rui Costa: fez o que ninguém tinha feito por Portugal, que foi ser campeão do Mundo. O João, com a idade que tem (23), já é colocado pelos especialistas da modalidade num patamar perto destes dois. Isto não é uma grande responsabilidade para um menino de 23 anos saído de A-dos-Francos?

JA – É uma grande responsabilidade, sim. Ainda tenho de percorrer um longo caminho até chegar perto do que eles fizeram. Acho que tenho o que é preciso, mas lá está: é preciso muito trabalho, muita sorte e tenho um caminho muito longo pela frente para ganhar corridas e chegar ao nível deles.

MF/CNN – Acredita, no seu íntimo, que pode ser o primeiro português a ganhar uma grande corrida por etapas?

JA – Sim. Se não se acreditar, nunca se alcança o objetivo. Acredito que um dia posso vir a vencer, mas o caminho é muito difícil e vai ser duro conseguir isso. Mas vou dar tudo o que tenho e logo descobrimos.

MF/CNN – Qual tem sido a chave do seu sucesso até agora?

JA – As pessoas dizem que eu tenho algum talento. Acho que tenho, mas o segredo está no trabalho e no profissionalismo. Treinar, descansar, saber comer, etc. É aí que está o esforço e o sacrifício.

Patrocinados