Fazer o mínimo à segunda-feira. A nova tendência que ajuda a compensar a semana de trabalho e a controlar o stress

12 mar 2023, 18:00
Stress (Pexels)

É um método criado por uma produtora de conteúdos após entrar em burnout e implica trabalhar o mínimo possível às segundas-feiras. A solução pretende reduzir o stress e a ansiedade, mas a psicologia alerta que a solução pode não surtir efeito se a fonte do problema não for abordada

O fenómeno nasceu nas redes sociais, mas rapidamente se está a alastrar para o mercado laboral. Chama-se ‘bare minimum mondays’ e é o mais recente movimento a surgir no seguimento do ‘quiet’ ou ‘loud quitting’. O conceito, que em português equivale, sensivelmente, a ‘segundas-feiras mínimas’, representa uma ideia nascida em 2020 como resultado de um ‘burnout’.

Por ser uma ideia relativamente recente, as recrutadoras admitem dificuldade em avaliar o seu impacto no trabalhador e no local de trabalho. Já do ponto de vista da saúde mental, as segundas-feiras mínimas lançam um debate relevante sobre o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, mas esta solução em particular pode não ser adequada para todos.

O que é?

Segundo o senior manager na Hays, Mário Rocha, ‘bare minimum mondays’ consistem em fazer o mínimo possível às segundas-feiras de modo a “compensar” a semana de trabalho que ainda está pela frente. Para Mário Rocha, esta técnica permite assim evitar altos níveis de stress e a ansiedade de iniciar a semana.

Já Pedro Amorim, Managing Director Experis e Corporate Clients Director do ManpowerGroup Portugal, acrescenta que a tendência também engloba começar a semana devagar, sem marcar reuniões e a garantir que as duas primeiras horas de trabalho são longe das tecnologias e sem acesso ao email, de forma a promover o bem-estar e não acumular pedidos.

Nas restantes horas do dia, o trabalhador realiza ainda as suas tarefas principais, sem distrações ou multitasking, terminando o horário mais cedo do que nos restantes dias da semana. Desta forma, o trabalhador pode reduzir o stress do início da semana e do próprio domingo anterior.

Ricardo Carneiro, Senior Director de Recrutamento e Seleção Especializado na Multipessoal, sublinha haver quem descreva um início de semana mais lento como algo “extremamente positivo” para a performance dos colaboradores. Nestes casos, entre as vantagens apontadas estão o evitar da sensação de esgotamento, bem como da redução de produtividade no final de semana.

Qual a origem e a quem se destina?

Mário Rocha e Pedro Amorim explicam que a tendência nasceu nos Estados Unidos, pelas mãos de Marisa Jo Mayes, criadora de conteúdos digitais no tiktok, plataforma esta onde igualmente ganhou popularidade, à semelhança de fenómenos como o quiet e loud quitting.

Marisa criou o conceito após ter sofrido um burnout, em 2020, devido ao ritmo de trabalho excessivo na área de vendas numa empresa de dispositivos médicos. O objetivo do conceito foi garantir o seu bem-estar e manter a produtividade, algo que a criadora de conteúdos assegura ter ajudado.

Bare minimum monday é um fenómeno que tem vindo a ganhar particular tração entre os membros da geração Z, em início de carreira, sendo que Pedro Amorim defende que o interesse desta geração na tendência é um reflexo da sua postura e expectativas para com o trabalho.

Mário Rocha, responsável da Hays, também segue esta linha de pensamento:

Estamos perante um mercado liderado pelo candidato, o que significa que as suas necessidades, ambições e objetivos estão a ditar as tendências. Na perspetiva do empregador, é preciso analisar estes fenómenos com atenção e pensar, de facto, sobre eles”, Mário Rocha, senior manager na Hays.

Mantendo a ótica do empregador, Ricardo Carneiro, da Multipessoal, indica que o conceito das segundas-feiras mínimas deve ser seguido, em particular, pelas empresas com dificuldades no recrutamento para certos postos (por escassez de pessoas, por exemplo), além das empresas mais jovens e com maior consideração pelos aspetos associados à “felicidade organizacional”, como o work-life balance.

No entanto, contrapõe, existem modelos de gestão, inclusive em funções relacionadas com a gestão de equipas, que asseguram às segundas-feiras um conjunto de reuniões cujo objetivo é preparar a semana de trabalho. Esta prática, sustém, colide diretamente com o conceito de bare minimum mondays.

Sendo que a ideia-base por detrás do conceito de bare minimum mondays é um melhor equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, Mário Rocha salienta que um bom ponto de partida para os empregadores passa por ouvir o feedback dos colaboradores. No entanto, destaca que já existem empresas a apostar neste equilíbrio, nomeadamente, através da semana de trabalho de quatro dias, mais dias de férias, regimes de trabalho híbrido, bem como outros benefícios além do salário.

Quais as consequências?

Por ser uma tendência muito recente e com pouca expressão, tanto Mário Rocha da Hays, como Pedro Amorim do ManpowerGroup, defendem ser ainda difícil perceber as consequências desta nova maneira de abordar a semana de trabalho.

Amorim partilha que, ao adotar-se esta postura, parece surgir o risco de as perspetivas dos trabalhadores, em relação às segundas-feiras, se desalinharem com as necessidades dos empregadores. Havendo a possibilidade de o trabalho “ficar para trás”, atrasando subsequentemente o trabalho dos dias seguintes, tudo isto pode impactar a relação de confiança entre empregadores e profissionais, o que deve ser uma preocupação de ambos, adverte.

Por outro lado, os empregadores também devem olhar estes movimentos como sinais de que poderão não estar a responder às necessidades das equipas.

De acordo com o estudo “What Workers Want to Thrive”, desenvolvido pelo ManpowerGroup, os trabalhadores esperam que os seus empregadores os ajudem a prosperar no trabalho e na sua vida pessoal, proporcionando-lhes uma maior flexibilidade, juntamente com fatores como a confiança, propósito e bem-estar", Pedro Amorim, Managing Director Experis e Corporate Clients Director do ManpowerGroup Portugal.

O que diz a psicologia?

Para a psicóloga Catarina Graça, o bare minimum mondays representa uma de muitas iniciativas que se podem adotar no sentido de reduzir a carga horária. Neste caso, falamos da segunda-feira, mas psicóloga defende que até podia ser uma sexta-feira. No entanto, alerta, este é um fenómeno que deve ser analisado caso a caso, pois podemos estar a “empurrar o mal para a frente”.

Catarina Graça defende que um dos passos mais importantes consiste em analisar o porquê dessa necessidade de haver alguma alteração à segunda-feira. “Há pessoas que vão perfeitamente motivadas à segunda-feira, porque acham que a segunda-feira é um recomeço, uma nova semana, novas oportunidades... Para algumas, é exatamente o oposto”, esclarece.

Quando surge a necessidade de fazer o mínimo no início da semana, a psicóloga suscita a importância de questionar o que não está a correr bem, o que é que está a fazer com que a pessoa olhe para o trabalho à segunda-feira como algo pesado, ansiogénico ou até angustiante. Por outro lado, Catarina Graça sublinha que também pode estar em causa uma questão da cultura empresarial do próprio local de trabalho, chefias, excesso de tarefas atribuídas ao próprio funcionário, ou até um problema de estruturação da empresa.

Esta “síndrome da segunda-feira”, como descreve a psicóloga, também pode advir da mudança de rotina de fim de semana para a rotina de dias úteis de trabalho. “Efetivamente, quebramos muito o ritmo [no fim de semana], até o nosso próprio metabolismo acaba por desacelerar e, depois, naturalmente, é mais difícil à segunda-feira voltarmos ao mesmo ritmo”.

A solução? Implementar hábitos de fim de semana durante a semana laboral

Se o problema for uma questão de mudança de rotina, a psicóloga recomenda a implementar nos dias úteis de trabalho alguns “elementos tranquilizantes” que são concretizados ao fim de semana.

“Vamos imaginar que a pessoa ao fim de semana gosta de estar sentada ao sofá a ver televisão, ou a ler um livro, ou a dar um passeio”, exemplifica a psicóloga, esclarecendo que nestes casos, pode ajudar a implementação destes hábitos durante a semana de trabalho. “Isto pode ajudar a não se ressentir tanto com essa mudança de rotina”, garante.

Se formos plantando algumas coisas durante a semana, alguns elementos do fim de semana que ajudam a descontrair e a quebrar um bocado o estado, naturalmente a semana vai decorrer com muito mais tranquilidade e flui muito melhor”, Catarina Graça, psicóloga da Clínica da Mente.

Esta solução permite evitar que alguém chegue a sexta-feira sem energia, além de evitar ainda que a pessoa chegue ao fim de semana com o desejo de viver tudo “de uma forma muito sofrida”, mas sem tempo para fazer tudo o que gostava. Se equilibrarmos as coisas durante a semana, isto equilibra muito a balança do bem-estar, admite Catarina Graça.

A psicóloga explica também que a preparação da semana de trabalho seguinte pode igualmente ajudar, até porque não saber o que se vai enfrentar na segunda-feira pode acarretar “muita ansiedade e muita pressão". Se esse equilíbrio não for encontrado, muitas pessoas podem acabar em situação de burnout, sendo esta uma realidade já “muito diferente da síndrome da segunda-feira”, contrapõe a psicóloga.

Neste sentido, se o problema a provocar a inquietação não for abordado, “até pode trabalhar só um ou dois dias”, que a redução da carga de trabalho não irá surtir efeito. Se continuar a haver “o mesmo número de tarefas atribuído, a mesma quantidade de ritmos, os mesmos problemas, não é por se aliviar a segunda-feira que vai deixar de haver esse preço”, explica.

No entanto, existem formas diversas de abordar o tema. Catarina Graça destaca que há empresas que já praticam o casual day às sextas-feiras, havendo inclusive uma discussão em vigor sobre a semana de quatro dias. Para a psicóloga, as bare minimum Mondays são mais uma tentativa de diminuir a carga de trabalho, uma ideia com mérito, já que a psicóloga ressalva que “em Portugal temos estudos que dizem que somos os que trabalhamos mais horas e nem por isso somos mais produtivos”.

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