“São as mais decisivas desde que o Brasil voltou a ser uma democracia”. O que pensam os brasileiros a viver em Portugal sobre as eleições?

27 set 2022, 22:00
O ex-presidente brasileiro Lula da Silva e o atual presidente, Jair Bolsonaro (AP)

Remover Bolsonaro do poder parece ser a prioridade, mas não aparenta haver grande entusiasmo em torno de um potencial sucessor

Os brasileiros vão a votos já no dia 2 de outubro para eleger o presidente da república. Os mais de 156 milhões de eleitores irão decidir se pretendem a recondução de Jair Bolsonaro no cargo ou se desejam o regresso de Lula da Silva, os dois candidatos que disputam a vitória.

Do lado de cá do Atlântico, mas com a terra-natal bem no coração, os cerca de 250 mil brasileiros que vivem em Portugal olham atentamente para os desenvolvimentos no país de origem. A CNN Portugal falou com quatro brasileiros residentes em Portugal para saber o que pensam destas eleições, e parece haver um consenso.

“Vão ser essenciais para o futuro, as mais decisivas que o Brasil teve nos últimos anos, talvez desde que o país voltou a ser uma democracia”, afirma Renan Araújo, de 30 anos.

Natural de Curitiba, está em Portugal há um ano para fazer um mestrado em Ciências da Comunicação e não tem dúvidas que este momento é importante para a reafirmação da democracia. “As eleições acontecem num momento em que as coisas estão divididas entre os que defendem o governo atual e os que se opõem. É o momento em que o Brasil vai ter a oportunidade de reforçar a democracia, porque o governo atual fala muito em ‘rutura democrática’ e acompanha uma onda da extrema-direita que vemos pelo mundo e que teve um dos episódios mais notáveis, a invasão ao Capitólio nos Estados Unidos”, sublinha.

“Enfrentar o Jair Bolsonaro e derrotá-lo nestas eleições vai ser um momento de reafirmação democrática para o Brasil. É essencial para o futuro do país”, até porque “nos últimos anos construiu-se um projeto muito tenebroso e complicado de destruição em diversas áreas”, conclui o estudante de mestrado.

Opinião semelhante tem Juliano Picussa, de 40 anos, diretor de uma empresa multinacional de tecnologias de informação. “Esta é sem dúvida a mais importante das seis eleições presidenciais que já participei. Estive nos últimos três anos no exterior e foi clara a evolução negativa que o Brasil teve nos últimos anos, com aumento da fome, dos miseráveis e um aumento da desigualdade social.”

Jonata Nassula, informático de 31 anos, residente em Portugal há cinco, é mais lacónico, mas também considera estas eleições essenciais num aspeto. “2022 será a maneira de corrigirmos o erro de 2018, ter elegido Bolsonaro”, refere.

Tirar Bolsonaro do poder é prioridade

Todos os ouvidos pela CNN Portugal criticaram a forma de estar do presidente Bolsonaro, o contributo que deu para o desprestígio internacional e aumento das dificuldades internas do país.

“Espero que aconteçam mudanças significativas. Não somente a nível económico, mas em outras áreas como a segurança e até mesmo a forma que um líder se porta diante das reais necessidades do seu povo”, afirma o psicólogo Jaylson Dantas.

“O Brasil vive uma situação delicada no que diz respeito à representação de um líder na área política. Algumas pessoas deram conta, de forma tardia, que a pessoa não compactua de pensamentos e comportamentos compatíveis com a forma que a sociedade se está a desenvolver”, assegura o psicólogo.

Jonata também tem como prioridade a saída do atual chefe de Estado. “Bolsonaro não reflete o povo brasileiro. Uma pessoa rude, grosseira, que está sempre a procura do conflito. O brasileiro é totalmente o contrário disso. Espero ver o Brasil tornar-se novamente no Brasil.”

Por sua vez, Renan sublinha que “a eleição de outro candidato reafirmaria a confiança na democracia, no sistema político, e na própria civilidade entre as pessoas. É um momento de grande importância, muita coisa piorou nos últimos tempos e precisa de mudar. Estamos com uma inflação enorme e muita gente na pobreza, a passar fome”.

Renan lembra ainda que a questão da pandemia “foi traumática para muitos” e recorda que vivia no Brasil durante a pandemia, um período que foi “muito complicado”.

“É uma eleição essencial para isso, para que o governo Bolsonaro não consiga ganhar essa força como aconteceu noutros países como a Hungria, Polónia ou Turquia. É importante fazer frente a esse movimento e esse autoritarismo”, conclui.

Lula é um mal menor

O entusiasmo em remover Jair Bolsonaro da presidência não parece ser o mesmo colocado no apoio ao seu principal opositor, Lula da Silva.

O ex-presidente do país tem liderado quase todas as sondagens e está em boa posição para voltar ao cargo. No entanto, Juliano votará em Lula não por ser do PT, “mas porque tirar Bolsonaro do poder é uma questão de humanidade”.

Um sentimento partilhado por Jonata. “Não é de todo o meu agrado, mas quero ter o Lula no poder. Hoje, qualquer um que fizer frente e tirar o Bolsonaro do cargo merece o voto”.

Renan Araújo destaca que Lula pode ser já eleito presidente na primeira volta, mas deseja uma mobilização geral da população contra Bolsonaro. “As pessoas têm de se mobilizar. O Lula é o candidato mais forte, mas é importante votar em quem quer que seja. Penso que o essencial é a oposição ao governo do Bolsonaro”, elenca.

As mudanças desejadas

“Há questões, como as relações diplomáticas, o ambiente, a segurança, a educação, em que percebemos que houve uma redução do investimento e uma desestruturação geral. É preciso retomar não só o investimento como a normalidade democrática, em que não exista radicalização do discurso, violência política”, destaca Renan.

Juliano também deseja reforçar o investimento em várias áreas, e quer um Brasil governado de forma pragmática, e sem grande influência ideológica. “Privatizar o que seja preciso privatizar, não privatizar o que não faz sentido, reduzir a máquina do Estado em setores que não é necessário, e aumentar o investimento na saúde, educação e segurança. Precisamos de defender os nossos bens naturais, mas explorá-los de forma inteligente, como fazem países desenvolvidos. Quero ver o Brasil novamente com relevância no contexto mundial, a comandar ações com outros países da América Latina e dos Brics”, deseja.

Apontando para a bandeira do Brasil, Jaylson deseja que o país caminhe com ordem e progresso.

“De coração, o Brasil necessita de uma linha sucessória coerente com suas deficiências. Longe da visão única de empresários, mas que converse com todos aqueles que tenham fome, sede, necessidades. O panorama deve ser diverso, deve ser entendido de modo sistemático e acolhedor na sua totalidade. Temos um povo caloroso, que gosta de trabalhar e para isso são necessárias novas perspetivas de gestão, não ditadores”, conclui.

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