Família, amigos ou causas? O que influencia os jovens que vão votar pela primeira vez

24 jan 2022, 07:00
Tiago Salteiro

Este ano 43.488 portugueses vão votar pela primeira vez. A CNN falou com seis jovens de 18 anos, sobre como se preparam para ir às urnas dia 30, os temas que mais os preocupam e o que consideram urgente os partidos mudarem para chegar a esta geração

Maria Viela tem estado a acompanhar as notícias sobre os partidos que andam em campanha eleitoral para conseguir tomar uma decisão. Já a irmã Sara já tem mais certezas. As gémeas de 18 anos vão votar pela primeira vez no dia 30 de janeiro e, apesar de irem juntas à freguesia de São Domingos de Benfica, em Lisboa, a bagagem que levam é diferente.

Atualmente a tirar um curso profissional de desporto, Maria confessa que ainda não sabe bem em quem votar. E, por isso, os próximos dias vão ser decisivos para a sua escolha. Contudo, se nenhum lhe “piscar o olho”, a jovem admite que poderá mesmo votar em branco.

“É importante votarmos, mesmo que seja em branco. É uma obrigação e um direito. Se nos dão essa oportunidade temos de ir”.

Maria e Sara Viela, 18 anos. Foto Rodrigo Cabrita

A irmã Sara tem mais certezas em quem pretende votar. Para isso contribuiu a pesquisa que andou a fazer. Ter lido, por exemplo, o programa eleitoral do Partido Socialista foi fundamental, mas não só. A jovem, que se assume “tendencialmente como centro esquerda”, diz confiar em António Costa para um novo mandato e elencou a gestão da pandemia como um bom exemplo de governação: “Entre Costa e Rio? Costa. Acho que Rio não tem capacidade para governar. Não digo que Costa seja perfeito, mas neste momento é o que tem mais capacidade”.

Sara, assumidamente feminista, diz ser a favor da barriga de aluguer, do aborto até às dez semanas e a favor da eutanásia. São algumas das medidas que considera fundamentais serem debatidas pelo próximo Parlamento. “Choca-me que outros partidos com pessoas mais novas no poder, como o CDS e o Chega, não defendam isso”.

“Não me cabe na cabeça que alguém da minha idade vote no Chega. Não cresceram num ambiente assim e vão votar. Só podem ser influenciados pela família”.

A influência familiar é um dos fatores que parece ter peso na decisão de quem vota pela primeira vez. Tiago Salteiro, de 18 anos, confessa sentir a influência da cor partidária da família, que tendencialmente vota no PSD. Mas garante que a sua opinião pessoal e o que tem visto sobre cada um dos partidos também têm peso na decisão. Para se informar, o estudante de Contabilidade  adianta que foi ler o programa eleitoral dos partidos mais à direita. Contudo, há um dado que está a pesar no seu sentido de voto e este tem um nome: António Costa.

Ao contrário de Sara, o voto de Tiago é assumidamente pela negativa: “Nestas eleições em específico sinto-me mais anti-Costa do que de direita. É preciso mudança. Costa tem muito o habito de passar uma mensagem positiva - mesmo quando está tudo mal - e é preciso mais sinceridade. Rio parece-me mais franco, não diz apenas coisas que queremos ouvir e confio nele. Quero um voto útil para mudar o rumo”.

“Voto PSD porque considero que Rui Rio é o único que tem hipótese de ganhar a Costa. Não gostei da gestão de António Costa neste mandato e isso pesou bastante”, afirma Tiago.

Para o jovem, a gestão da pandemia foi a gota final. “Há medidas que simplesmente não fazem sentido – agora quem está em isolamento pode ir votar e isso para mim não faz sentido, pode pôr em risco a saúde pública”.

Tiago Salteiro, 18 anos. Foto Rodrigo Cabrita

Também a TAP é um dos temas que preocupa Tiago - sobretudo desde que um familiar perdeu o emprego durante a reestruturação da companhia –  talvez por isso não discorde dos sucessivos apoios à companhia. Mas mesmo que não partilhe da mesma solução do candidato do PSD, tal não o demove do voto. “Não há o candidato perfeito. A visão do Rio sobre a TAP não é uma medida em que concorde, mas neste momento, no global, parece-me a melhor opção”.

Tal como Tiago, a família foi o ponto de partida para Diogo Falcão começar a formular a sua opinião. Fez 18 anos há pouco mais de uma semana e pretende ingressar na universidade no próximo ano. Ainda indeciso entre Fisiotecnologia, Mecânica ou Engenharia Informática, afirma gostar muito de física.“ Mas o meu pai é engenheiro informático”, refere, acrescentando logo de seguida: “A família influencia em tudo,  até na política. O meu pai é mais centrista que a minha mãe, que é mais de direita, e há uma grande influência". No entanto, quer também pensar por si. "Já tenho idade para ter a minha opinião”,. diz, adiantando que se identifica como sendo de Direita: “Sou apologista que as pessoas que recebem mais porque trabalham mais, têm direito a ter mais”.

Contudo, tal como no caminho profissional, ainda não se vincula a um partido."Impostos Mortágua fazem-me um bocado de confusão", admite.

Porém, em certas medidas, assume “fugir para a esquerda”: “Uma coisa que acho bem são os vouchers na educação e o PS defende isso, mas acho que devia ser apenas para quem realmente precisa”.

Apesar de afirmar que não há nenhum programa eleitoral com que se identifique a 100%, Diogo considera que agora "existem outros partidos como a Iniciativa Liberal, com novas abordagens”, que acredita serem mais apelativas ao seu voto. “Uma das principais medidas da Iniciativa Liberal tem a ver com a parte da educação e da saúde, sendo que estas são as que mais me tocam”, exemplifica o jovem, que também defende maior liberdade e autonomia administrativa para as escolas, que considera serem diferentes e, por isso, têm necessidade de respostas diferentes: “Sinto que ao tentar igualar tudo, iguala-se por baixo”. O jovem estudante apoia também a comunicação entre o serviço de saúde público e o privado: “Um negócio pode ser bom, como diz o Rio. Podíamos aproveitar mais o privado e não o ver como o inimigo e aproveitá-lo para melhorar”.

 “Quando as pessoas não têm essa possibilidade, temos de dar meios para melhorar. E a base é a educação e a saúde”, defende, afirmando que esta é uma posição partilhada pelos amigos mais próximos.

É a primeira vez que vou votar por isso vou votar no que realmente acredito", defende Diogo Falcão.

O jovens e a política

Em casa das gémeas não se fala muito de política, mas Sara, que optou pela disciplina de Ciência Política no 12º ano, gosta de levar o assunto para ser discutido no grupo de amigos. Entre os temas que mais debatem estão o ambiente e as alterações climáticas, a identidade de género e a igualdade. Falam dos partidos, do que defende cada um e o estigma que existe associado ao lado do espectro político, que a jovem assume que pode levar a preconceito. “Uma vez fizemos um teste para saber se nos enquadrávamos à Esquerda ou à Direita e saímos da aula a discutir se enquadrámos bem ou mal". E continua: "Um dizia: 'ah eu sou direita, mas isso não significa que seja machista e preconceituoso". E outro respondia: 'e eu sou à esquerda, mas não sou radical”'.

Sara Viela, 18 anos. Foto Rodrigo Cabrita

O combate ao preconceito é uma das bandeiras que Sara carrega. Segundo ela, este é um tema cada vez mais abordado entre os jovens, a par da identidade de género. Assuntos que querem ver debatido nestas eleições. “Hoje em dia crescemos com o pensamento que tenho de ser rapaz ou rapariga. Nós podemos ser elas ou eles, ou os dois. Tenho uma amiga que não se identifica com o corpo que nasceu e eu respeito-a por isso. Trato-a como “ela” porque é assim que ela se identifica”, relata. “Sei o que é viver neste país com preconceito, com racismo e ponho-me na pele deles. E é isso que quero ver combatido neste próximo Parlamento”.

Também Carolina Leite, de 18 anos, tem amigos de Esquerda e de Direita. Entre si partilham todos opiniões e conversam sobre as últimas notícias e o que dizem os políticos. A jovem estudante de Matemática Aplicada e Computação vai votar pela primeira vez no próximo dia 30 e , para o seu sentido de voto, pesam as respostas dos partidos "à crise ambiental e ao grave problema de habitação que Portugal enfrenta". Para a jovem, os partidos mais à esquerda respondem melhor a estas questões: "O PAN foca-se mais nisso". Contudo, sente que falta mais visão ao partido sobre outras matérias além do ambiente, da natureza e dos animais para ter o seu voto garantido. Por sua vez, aponta, o Bloco de Esquerda aborda um dos temas que considera essencial: a saúde e uma melhor gestão do SNS. "Não concordo com a privatização, acho que se deve fortalecer o SNS e não os privados". 

Frisando que, a contrário de alguns amigos, "ainda não tem um partido", Carolina procura nos programas eleitorais respostas a nível da habitação: construções mais eficientes que retenham o calor e combatam a pobreza energética para não se desperdiçar energia é uma delas - "É um problema social, há quem morra isso". A recém-eleitora, que vive no centro de Lisboa com os pais, também procura um partido que defenda mais acessibilidade dos jovens à habitação, sobretudo nas cidades, onde existe problema da especulação imobiliária. Este é uma situação que a preocupa, sobretudo na hora de sair de casa dos pais: "Eu gostava de continuar a viver em Lisboa e percebo que isso vai ser difícil".

Muitos destes temas, garantem estes jovens, foram esquecidos nos debates televisivos.

"Se precisasse dos debates para me sentir esclarecido, não ajudaram muito"

Rafael Matias Ribeiro, também de 18 anos, está a estudar Engenharia Informática no Instituto Superior Técnico. Assume não estar tão a par sobre política em relação a estas eleições como queria, mas como é a primeira vez que vota, diz que vai procurar mais informação nos dias que antecedem o sufrágio. "Vi excertos dos debates, mas não senti interesse. Se tivesse em casa via todos? Não. Talvez um ou outro, pelos mais conhecidos ou aqueles com ideais mais opostos. Contudo, do pouco que sei e do que vi, não aprendi muito".

Este é um sentimento comum a muitos jovens, que consideram que os debates televisivos entre candidatos não foram esclarecedores para a tomada de decisão no dia 30. Apontam críticas ao comportamento dos candidatos, que consideram privilegiar os insultos, ao invés da troca de ideias: "Não consegui mesmo perceber o que cada um defende", lamenta Maria. "Eles falam muito, mas não dizem nada, como se costuma dizer", afirma Sara, prosseguindo: "Desviam sempre o assunto a acabam a falar de que cor é que é o céu. Se a ideia é apresentar os programas, acabam sempre por fazer o contrário”, afirma a jovem. “Em vez de dizer 'O Sr. fala disto”, deviam dizer 'eu acredito isto'”, aponta Diogo.

Carolina, por seu lado, considera que a duração dos confrontos não ajudou: "São muito curtos. Não têm tempo para falar de propostas, é mais ataques pessoais", considera. Já Tiago afirma mesmo recorrer às redes sociais. "Não vi os debates todos, mas dou um olhinho nas redes sociais porque tenho noção que é preciso acompanhar. Mas se precisasse dos debates para me sentir esclarecido, não ajudaram muito”.

Carolina e Tiago são namorados e, apesar de não irem juntos votar no domingo, nem no mesmo lado do espectro político, convergem na opinião de que a comunicação dos partidos devia estar mais voltada para os jovens: "Os partidos deviam defender os nossos interesses. Nós somos o futuro do país", sublinha Tiago, sem saber que a companhia afirmou precisamente o mesmo durante a sua entrevista à CNN Portugal.

A solução para estas falhas de comunicação pode estar na abordagem dos partidos nas redes sociais e nas escolas, sugerem. Para o estudante de contabilidade, a política devia ser um tema mais abordado nas escolas: "Eu pelo menos não tive nada disso na escola e sinto que fez falta”. Para Maria, também o vocabulário deve ser adaptado aos mais novos: "Acredito que não deviam usar vocabulário tão complexo e usar menos palavras caras e explicar melhor as coisas".

A dias da decisão, ultimam-se os preparativos e procura-se esclarecer dúvidas. Quer já saibam em quem vão votar ou ainda não, a consciência cívica é comum a cada um destes jovens, que deixam um apelo em uníssono: é muito importante ir votar - e estar bem informado para o fazer.

“Eu sei que não é o meu voto que vai definir tudo, mas é um direito e voto com consciência", conclui Diogo Falcão.

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