Dois estranhos conheceram-se no rio Nilo. Estão casados há 25 anos

CNN , Francesca Street
20 mai 2023, 09:00
Dois estranhos conheceram-se no rio Nilo. Estão casados há 25 anos. Foto: cortesia de Christina Kandil

Christina tinha 28 ano e estava desesperada por conhecer o mundo. Wahid tinha 26 anos e geria um barco de turismo no Egipto

Christina Ward conhecia Wahid Kandil há apenas seis meses quando ele a pediu em casamento. 

Uma noite, o casal estava sentado num banco com vista para o rio Nilo, com o antigo Templo de Luxor iluminado atrás deles. 

Wahid virou-se para Christina. "Então, vamos casar-nos ou não?", perguntou.  

Christina quase se riu. A pergunta era, ao mesmo tempo, tão inesperada quanto aguardada. 

Desde que se tinham conhecido como colegas num barco de turismo no Nilo, Christina, do Reino Unido, e Wahid, do Egipto, passavam todos os momentos possíveis juntos. 

"Poder dizer que me apaixonei enquanto navegava sob a lua e as estrelas pelo Nilo parece muito romântico, mas foi exatamente isso que aconteceu", conta Christina à CNN Travel. 

Christina chegou ao Egipto em Outubro de 1996, impulsionada pela sua, como diz a própria, "comichão nos pés". Tinha 28 anos e estava desesperada por conhecer o mundo, pelo que a experiência de seis meses como guia turística no Egipto para uma empresa de viagens de aventura lhe pareceu a oportunidade perfeita. Basicamente, seria paga para viajar. Além disso, adorava o Egipto e estava fascinada pela história antiga do país. 

Como guia turística, Christina era responsável por conduzir grupos de 25 viajantes em viagens de duas semanas pelo país. 

"Visitávamos Luxor, Assuão, Hurghada e Cairo e fazíamos muitas viagens secundárias, como andar de burro ao nascer do sol até ao Vale dos Reis, andar de camelo em mosteiros abandonados no deserto, jantar em casas de famílias núbias", recorda Christina. 

Parte de cada viagem teve lugar naquilo a que Christina chama "o barco dos mochileiros do Nilo". 

Tratava-se do Kimo, um pequeno barco de turismo com uma série de cabines cheias de beliches, onde Christina e os seus colegas dormiam a bordo, bem como uma sala de jantar e um terraço, onde se realizavam festas ruidosas enquanto o barco navegava rio abaixo.

Christina Kandil fotografada no Kimo no rio Nilo. Foto: cortesia de Christina Kandil

Na sua primeira noite no Egipto, Christina apresentou-se à tripulação do Kimo. Queria estabelecer uma boa relação com os seus novos colegas. Estava especialmente interessada em conhecer o diretor do barco, Wahid Kandil, de 26 anos, uma vez que iriam trabalhar juntos. Como gerente, cabia a Wahid assegurar que tudo a bordo corria bem –  o que muitas vezes não acontecia – , bem como cuidar da tripulação, das provisões, do orçamento e ajudar Christina a garantir que os turistas se divertiam. 

Wahid, nascido no Cairo, tinha-se licenciado em horticultura e trabalhava como engenheiro agrícola numa grande quinta no deserto, mas achou o trabalho no barco de turismo muito mais divertido. Gostava de conhecer pessoas de todo o mundo –  e continuava a abraçar o seu amor pela jardinagem quando levava os turistas em viagens secundárias às ilhas espalhadas pelo Nilo, ensinando-lhes sobre as espécies de plantas locais. 

Na sua segunda noite no Egipto, Christina sentou-se ao lado de Wahid à porta de uma das cabinas do Kimo. Os dois fumaram juntos e "namoriscaram um pouco", como diz Christina. 

O Kimo ancorado em Aswan, no Egipto. Foto: cortesia de Christina Kandil

Ela gostou logo de Wahid e, mais tarde nessa noite, escreveu uma ou duas linhas sobre ele no seu diário. 

Wahid também gostou de Christina, mas estava desconfiado. Durante o tempo em que trabalhou no Kimo, notou uma tendência: as jovens mulheres vinham do Reino Unido para trabalhar temporariamente no turismo egípcio e tinham um breve caso com um local. Ele achava que elas procuravam namorados egípcios mais por uma questão de novidade do que por qualquer outra coisa, por isso, normalmente, afastava-se dos romances a bordo. 

"Sempre rejeitei isso", conta ele hoje. 

Mas, à medida que os dias passavam, Wahid e Christina começaram a aproximar-se um do outro. Claro, ambos estavam ocupados com as digressões –  e não havia privacidade no Kimo, por isso "não havia conversas profundas", como diz Wahid. Mas aproveitavam todas as oportunidades que tinham para conversar e namoriscar. 

Apaixonar-se no Nilo

Wahid e Christina rapidamente se sentiram atraídos um pelo outro. Foto: cortesia de Christina Kandil

Desde o primeiro dia, Christina adorou trabalhar como guia turística. Ela gostava de viajar pelo Egipto, mas adorava especialmente os dias passados a bordo do Kimo. 

"Navegar no Nilo é mágico", diz. 

Uma noite, Christina deixou o seu grupo de turistas para jantar em terra, na cidade egípcia de Assuão. Depois, voltou ao barco para ver se conseguia apanhar Wahid. Avistou-o, foi cumprimentá-lo e perguntou-lhe o que iria fazer mais tarde. 

"Não queria insinuar nada com isso", diz Christina hoje. 

"Querias, sim", diz Wahid, rindo. 

"Bem, talvez eu estivesse a namoriscar um pouco", admite Christina. 

Wahid disse que iria ficar por ali nessa noite e, por isso, ele e Christina combinaram encontrar-se num bar de um hotel próximo. Mas, depois, Christina foi chamada de volta às suas funções de guia turística e acabou por chegar 45 minutos atrasada ao encontro. Não tinha forma de contactar Wahid para o avisar, pois nenhum dos dois tinha telemóvel. Por isso, depois de terminar o trabalho, dirigiu-se para o hotel o mais depressa que pôde. 

"Quando entrei, ele tinha uma cara de trovão", conta Christina. 

Wahid estava na receção, a escrever um bilhete para a sua futura companheira, que tencionava deixar com os funcionários. 

"Era um bilhete bastante zangado", diz Wahid, recordando o que tinha escrito: "Nunca ninguém me deixou pendurado desta maneira". 

Mas quando Christina explicou que o seu atraso não tinha dependido dela, Wahid cedeu. Os dois entraram juntos e encontraram uma mesa no terraço do bar. Estavam no Old Cataract Hotel, um estabelecimento de cinco estrelas nas margens do rio, famoso por ser o local onde a escritora inglesa Agatha Christie escreveu o seu romance policial "Morte no Nilo". 

"Era um terraço muito bonito, muito romântico, com vista para o Nilo", diz Christina. "Era simplesmente fantástico." 

"Mas muito caro", acrescenta Wahid. Na altura, não disse a Cristina, mas o custo das várias bebidas e snacks consumiu uma parte significativa do seu salário mensal. 

Mesmo assim, naquele momento, ele não se importou. Estava apenas feliz por passar tempo com Christina – especialmente porque a conversa que tiveram nessa noite foi para além do barco e das trocas de piropos, para algo mais profundo. 

"Foi a primeira vez que falámos realmente sobre uma grande variedade de assuntos", diz Wahid. 

Discutiram as suas ideias sobre a família, a fé e os seus objetivos de vida. 

"Acho que ficou claro que nos damos muito, muito bem", diz Wahid. 

"Foi uma noite longa", diz Christina. 

No dia seguinte, os dois estavam de volta ao trabalho no Kimo e o brilho da noite anterior desvaneceu-se ligeiramente quando tiveram uma pequena "luta de poder" no local de trabalho, como diz Christina. 

Wahid planeou uma paragem não programada do barco e Christina questionou a logística da decisão – ela estava preocupada com o atraso da excursão. 

Eu estava ali a dizer: "Não podes fazer isto! Por isso, acabámos por ter uma pequena disputa de poder, o que é bastante engraçado", recorda. 

Foi um pouco aceso, mas ainda assim leve. Era óbvio que, mesmo quando estavam a discutir, Christina e Wahid gostavam da companhia um do outro. 

Ainda assim, nenhum deles pensava que a relação que estava a nascer iria dar em alguma coisa. 

Do ponto de vista de Christina, a sua estadia no Egipto tinha uma data-limite e, por conseguinte, a sua relação com Wahid também. Depois de trabalhar no Egipto, planeava passar seis meses como guia turística na Turquia. 

"Pensei: «Esta é apenas a minha primeira viagem. São só seis meses no Egipto e depois vou para outro sítio qualquer, por isso isto é só uma coisa temporária»", diz Christina. 

Quanto a Wahid, tinha outras pressões a pesar-lhe na cabeça. Pouco antes de Christina entrar na sua vida, tinha sido diagnosticado um cancro à mãe de Wahid. Esta notícia mudou o seu mundo, levando-o a questionar todos os aspetos da sua vida. 

"A minha mãe era obviamente uma parte muito importante da minha vida", diz ele. "Na altura, fiquei bastante dividido. Foi muito duro." 

Quando soube da doença da mãe, Wahid estava numa nova relação. Embora soubesse que não fazia sentido, acabou por associar a namorada ao diagnóstico da mãe e, consequentemente, pôs fim à relação. 

"É uma superstição, por assim dizer... ela tinha trazido esta praga para a minha vida, pensei que era má notícia, por isso ignorei-a, deixe de falar com ela e pronto", diz ele. "E depois veio a Christina e eu apaixonei-me por ela." 

No início, Wahid não contou a Christina sobre esta ex-namorada muito recente. Mas é claro que Christina acabou por descobrir, e sentiu-se enganada e zangada. 

Quando esta notícia se espalhou, o casal estava a bordo de outro navio no Nilo. O Kimo tinha-se avariado inesperadamente e, por isso, a empresa de viagens de aventura tinha alugado alguns camarotes num grande e luxuoso navio de cruzeiro. 

Sentindo-se magoada e traída, Christina ignorou Wahid durante o resto do dia e concentrou a sua atenção no gerente do navio de cruzeiro, com o objetivo de fazer ciúmes a Wahid. Ela conseguiu, e Wahid entrou em pânico por ter perdido Christina para sempre. 

Enquanto discutiam sobre o que tinha acontecido, tanto Christina quanto Wahid reconheceram pela primeira vez que seus sentimentos um pelo outro eram profundos. As suas respetivas reações de ciúmes diziam muito – isto não era apenas um caso. Era real. 

"Esse foi provavelmente o catalisador e o ponto de viragem", diz Christina. 

A partir daí, tanto Christina como Wahid decidiram: "Isto é sério e vamos levar isto mais longe". 

Comprometer-se com o casamento

A relação entre os dois acabou por crescer em pouco tempo. Foto: cortesia de Christina Kandil

Foi assim que o casal acabou por se sentar junto ao Nilo, em Luxor, a falar sobre a perspetiva de casamento. 

Nessa altura, Christina tinha a certeza de que ela e Wahid iriam partilhar um futuro. Mas havia muitas incógnitas nesta equação. Onde iriam viver? O que pensariam as suas famílias? Deveriam esperar um pouco mais antes de se comprometerem? 

"Não disse que sim, não disse que não –  fiquei a pensar no que fazer", diz Christina. 

Questionou-se se não deveria regressar ao Reino Unido por uns tempos, para "fazer um afastamento lógico e ver se esta seria a coisa certa a fazer". 

Mas, quando chegou a altura, Christina não conseguiu voltar. 

"Eu sabia que não podia deixar o Egipto sem ele", diz. 

Christina estava com um grupo turístico no Cairo quando tomou a decisão. Tinha sido um dia longo e stressante, e ela deu por si a desejar que Wahid estivesse ao seu lado. 

"Sou a «Miss Independente», sou forte e sei defender-me. Mas, de vez em quando, quero que alguém me defenda", diz ela. 

Por isso, dirigi-me a um telefone público, peguei nele, liguei-lhe e disse: «Certo, em que data é que nos vamos casar?» E planeámos o casamento literalmente uma semana após o fim da digressão." 

Casar, diz Wahid, foi uma promessa de que "esta é a pessoa com quem queremos passar a vida". 

Para Christina e Wahid, o casamento foi o início de um novo capítulo. Decidiram que não iriam viver no Egipto e também não iriam viver em Inglaterra – iriam começar de novo, num lugar novo. 

"Ambos queríamos começar uma nova vida algures juntos", diz Christina. "Sabíamos que o queríamos fazer juntos." 

A família de Wahid foi encorajadora, dizendo-lhe que tinha de fazer o que era melhor para ele – embora uma das suas irmãs tenha manifestado algumas preocupações. 

Entretanto, Christina telefonou à mãe, no Reino Unido. "Tens de vir ao Egipto visitar-me", disse ela. "Há uma pessoa que quero que conheças." 

Quando a mãe de Christina conheceu Wahid, soube-o de imediato. 

"Vais casar com ele, não vais?", disse ela na primeira noite da sua viagem, com lágrimas nos olhos. 

"Ela tinha muito a atitude de que o Oriente e o Ocidente - não vai resultar", diz Christina. "Fiquei zangada e chateada no início, mas depois ela ficou presa num barco connosco durante dois dias inteiros. Foi interessante. Mas ela mudou de ideias, de certeza." 

Wahid brinca que a "subornou" cozinhando uma comida ótima. 

"Olhando para trás, apercebemo-nos de que tudo veio de um lugar de amor e preocupação, só isso", diz Christina. 

"Não acho que tenha sido uma resistência desagradável", concorda Wahid. 

Talvez mais preocupante tenha sido a reação que Christina recebeu da embaixada britânica no Egipto. Lembra-se de os ter contactado para discutir a questão dos vistos e de ter sido imediatamente desaconselhada a casar com Wahid, tendo os funcionários dito que ele provavelmente a estaria a usar para obter um passaporte britânico.

Eis Christina e Kandil no dia do seu casamento. Foto: cortesia de Christina Kandil

Mas Christina e Wahid ignoraram estes negacionistas e a data do casamento foi marcada: 26 de abril de 1997. 

O plano era manter as celebrações "pequenas e simples", mas acabou por ser uma "festa muito grande", como diz Wahid. 

Os pais e a irmã de Christina vieram de avião do Reino Unido e a mãe e a irmã de Christina levaram-na a comprar um vestido de noiva no Cairo. 

A família de Wahid reuniu-se para a ocasião e a tripulação do Kimo apareceu. Os colegas guias turísticos de Christina coordenaram as suas viagens para que terminassem no Cairo, de modo a poderem também estar presentes, o que implicou a presença de muitos turistas. 

"Havia provavelmente cerca de 50 pessoas que não conhecíamos no copo-de-água do nosso casamento", diz Christina, rindo. 

"Todos a dançar, todos a festejar", recorda Wahid. 

 O casal não se importou, só contribuiu para a atmosfera de celebração. 

"Foi uma festa muito boa", diz Christina. 

"Não é costume a maioria dos egípcios beber álcool nos casamentos", diz Wahid. "No entanto, os meus amigos tinham duas garrafas de uísque num dos seus carros, por isso estávamos sempre a sair para beber uns copos discretos e a voltar a correr para a festa." 

Depois do casamento, Christina adotou o apelido de Wahid, passando a chamar-se Christina Kandil, e o casal viajou para a cidade portuária de Alexandria para a sua lua-de-mel. 

Começar um novo capítulo

Christina e Wahid decidiram mudar-se juntos para o Canadá, mas os trâmites burocráticos demoraram mais tempo do que o previsto. Entretanto, o casal instalou-se em Portsmouth, a cidade natal de Christina, na costa sul de Inglaterra.  

Pouco tempo depois de chegarem, organizaram uma grande festa para os amigos de Christina que não tinham ido ao Egipto para o casamento. Estavam entusiasmados por conhecer Wahid – tinham ouvido falar muito dele nas cartas efusivas de Christina nos seis meses anteriores. 

Mas Wahid debatia-se com a vida em Inglaterra. Falava bem inglês, mas não era fluente e sentia-se constrangido com o seu sotaque quando comunicava com estranhos. 

Também se preocupava com a sua mãe, que ainda estava a ser tratada a um cancro. Telefonava regularmente para casa para pedir informações ao pai e ao irmão. 

Cerca de nove meses depois de se mudarem para Inglaterra, Wahid e Christina regressaram ao Egipto para visitar a família e os amigos de Wahid. Quando o pai de Wahid os foi buscar ao aeroporto, tinha notícias chocantes e preocupantes: a mãe de Wahid tinha falecido há alguns meses. 

Wahid não conseguia acreditar. Christina recorda que "as suas pernas desapareceram literalmente debaixo dos pés". 

"Eles estavam preocupados que, se ele viesse, isso iria arruinar a residência dele no Reino Unido ou algo do género, e não se aperceberam de que não haveria problema. Por isso, não lhe disseram", conta ela.  

Wahid acredita que a decisão foi menos prática e mais emocional – um ato de proteção mais do que qualquer outra coisa. 

"Quando estamos longe da nossa família, eles não querem que fiquemos perturbados. Eles querem estar lá para nos proteger quando estamos perturbados", diz. 

Seja qual for a razão, a realidade é que Wahid mudou-se para o Reino Unido e nunca mais voltou a ver a mãe. 

"Estava tão ansioso por voltar a vê-la", diz. 

Do Canadá para o Dubai

Uma fotografia recente de Christina e Wahid com os filhos, Yasmine e Tariq. Foto: cortesia de Christina Kandil

Em Julho de 1999, os vistos canadianos de Wahid e Christina foram finalmente aprovados e o casal mudou-se para Calgary. Estavam entusiasmados, embora quando chegaram a Calgary, com uma tempestade de neve fora de época, começaram por entrar em pânico por terem tomado a decisão errada. 

"Mas o Canadá acabou por ser muito, muito bom para nós", diz Christina. "Foi fantástico viver lá, construímos uma casa lá e tivemos os filhos."  

O casal viveu no Canadá durante nove anos, primeiro em Calgary e depois em Edmonton, tendo tido dois filhos, Yasmine e Tariq. 

A mãe de Christina ia visitá-los com frequência. Apesar das suas reservas iniciais, ela estava feliz por Christina e Wahid. 

"Ela nunca lho diria, mas amava-o, sem dúvida", diz Christina. "Infelizmente, ela já faleceu, mas achava que ele era um diamante." 

No Canadá, Christina trabalhava numa empresa de contabilidade, enquanto Wahid subia na hierarquia de uma empresa de consultoria agrícola. Estavam bastante bem instalados, mas Wahid sentia que nunca estava exatamente onde queria estar profissionalmente. Tinha períodos de depressão que Christina tentava ajudar a ultrapassar. 

"Era sempre eu que dizia: «Temos uma casa, temos um carro. Temos dois filhos maravilhosos. É suficiente, está tudo bem»", recorda. 

Depois, em meados dos anos noventa, Wahid foi contactado para abrir uma empresa no Dubai. Depois de mais algumas voltas e reviravoltas, ele e Christina acabaram por investir todas as suas poupanças nessa empresa. E, depois de um início difícil, o negócio arrancou. 

"Uma parceria"

O casal de férias na Grécia. Foto: cortesia de Christina Kandil

Atualmente, Wahid e Christina ainda vivem no Dubai, que, segundo eles, funciona bem como um "meio-termo" entre as suas duas culturas. 

"Temos o lado muçulmano das coisas, por isso, quando estamos a fazer o Ramadão, estamos rodeados por todos os que o fazem. Mas também estamos tão ocidentalizados aqui", diz Christina. 

Wahid é de uma família muçulmana e Christina foi educada como cristã. Antes de os seus filhos nascerem, o casal decidiu que os criaria na fé muçulmana, mas que continuaria a celebrar os feriados cristãos da Páscoa e do Natal. Estavam conscientes de que, sendo um casal internacional e multiconfessional, era importante estarem em sintonia sobre a religião dos seus filhos desde o início. 

Mas algo que Christina e Wahid não previram foi o que seria para os seus filhos serem aquilo a que se chama "crianças de terceira cultura" – crianças que crescem num país, com pais de dois países diferentes. Foi só quando Yasmine e Tariq se tornaram adolescentes que os pais se aperceberam de que se tratava de uma experiência com a qual nunca se poderiam identificar. 

"Não é fácil quando não se tem raízes", diz Wahid. "Eu cresci no Egipto, ela cresceu em Inglaterra e continuamos a ter algumas raízes, mesmo que as tenhamos deixado. Mas os "Third Culture Kids" não sabem quem são e penso que se debateram um pouco com isso quando eram jovens." 

Nos últimos anos, Yasmine, que tem agora 22 anos, e Tariq, que tem 19, têm vindo a formar e a abraçar as suas próprias identidades culturais, aprendendo mais sobre as suas famílias e a sua dupla herança. 

Yasmine, que é apaixonada por cinema, realizou recentemente uma curta-metragem sobre a mãe de Wahid, a avó que nunca conheceu. No filme, ela imaginou como seria voltar atrás no tempo para a conhecer. Para Christina e Wahid, ver isso acontecer no ecrã foi incrivelmente comovente. 

"Estávamos sentados no cinema, a ver o filme e a chorar", diz Christina. "É um legado tão bom para essa história." 

As ambições cinematográficas de Yasmine também incluem um dia fazer um filme sobre a história de amor dos seus pais. Wahid e Christina podem ser tendenciosos, mas acham que poderia dar um filme muito bom. 

Afinal, como diz Wahid, "foi uma montanha-russa, houve muitas reviravoltas – mas eu adoro, acho que é suposto ser assim". 

"Eu também adoro", diz Christina. "Já passámos por muita coisa, mas ele é a minha rocha. Gostava de pensar que também sou a rocha dele." 

"E és", diz Wahid. 

"Se um de nós está em baixo, o outro puxa pelo outro – é uma parceria", diz Christina. 

Já passaram mais de 25 anos desde que Christina e Wahid se apaixonaram, aos vinte e poucos anos, no rio Nilo. Estão ambos na casa dos 50 anos, mas Wahid insiste que "ainda são um pouco jovens de coração". 

"Continuamos a divertir-nos muito, a dançar e a beber. Sinto que ainda temos quase a mesma idade, o que é um pouco disparatado, mas não acho que tenhamos mudado muito." 

"Gostamos da companhia um do outro", diz Christina. Ela diz que adoram "sentar-se no jardim, beber uns copos, jogar às cartas juntos – não precisamos de muita gente". 

Hoje em dia, o casal vê o seu encontro improvável como a base para o mantra que têm levado ao longo da sua vida partilhada: "Tudo acontece por uma razão." 

"Acreditamos muito nisso, devido à forma como tudo começou para nós", diz Christina. "Olhando agora para trás, estávamos ambos no caminho um do outro antes mesmo de darmos por isso." 

"Havia tantas razões para que isto não acontecesse", diz Wahid. "Mas, contra todas as probabilidades, aconteceu."

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