Manuel Pinho diz que perdeu "uma fortuna incalculável" ao ir para o governo

18 dez 2021, 00:10
Manuel Pinho

Ex-ministro da Economia garante que não beneficiou a EDP e até diz que recebeu da Universidade de Columbia metade do que o Ministério Público alega

Manuel Pinho foi ministro da Economia na primeira legislatura do governo de José Sócrates, entre 2005 e 2009. Olhando para trás, o ex-governante está arrependido. É isso que diz em entrevista ao semanário Expresso, concedida na mesma semana em que foi detido na sequência do caso EDP.

"Se eu fiz bem em ter aceitado um lugar no Governo? É óbvio que não fiz bem. É evidente que me prejudiquei imenso em todos os aspetos. Não só perdi uma fortuna incalculável, como agora estou nesta situação. Uma pessoa tem de reconhecer quando erra", sublinha.

O Ministério Público suspeita que Manuel Pinho terá recebido uma avença mensal de 15 mil euros do Grupo Espírito Santo GES, através do chamado “saco azul”, no tempo em que era ministro de Economia, em troca da concessão de benefícios ao grupo liderado por Ricardo Salgado. O dinheiro, enviado sob ordens do banqueiro, seria depositado na conta da Tartaruga Foundation no Banque Privée Espírito Santo.

As autoridades suspeitam, também, que Manuel Pinho foi corrompido por António Mexia, presidente da EDP, no valor de 620 mil euros. De acordo com os procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto, a EDP terá pagado o salário de Manuel Pinho enquanto este lecionava na Universidade de Columbia, nos Estados Unidos.

Sobre as suspeitas das autoridades, Manuel Pinho garante que agiu de forma independente e que não beneficiou a elétrica: "Pelo contrário. Não foi por eu ter nada contra a EDP, mas fazia parte do programa do Governo criar mais concorrência. Foram tomadas várias decisões que prejudicaram a EDP, no sentido de lhes criar um ambiente mais competitivo. Uma das primeiras iniciativas foi atribuir uma profusão de licenças para construção de centrais a gás. A segunda medida foi um grande concurso eólico internacional totalmente aberto à concorrência estrangeira. E houve o plano para construção de novas barragens. Outra coisa é a garantia de potência. Muitas vezes a EDP tentou influenciar-me no sentido de aprovar um mecanismo de garantia de potência [um mecanismo que remunera a disponibilidade para produzir]. E eu achava isso uma tolice total".

Relativamente aos valores recebidos da Universidade de Columbia, o ex-governante diz que são metade do que diz o Ministério Público, e explica que nem pensava ir para aquela instituição: "Eu sabia que a EDP estava à procura de um parceiro estratégico a nível académico nos Estados Unidos. Eu não estava a pensar ir para a Universidade de Columbia, estava a pensar ir para outras. A minha mulher não gostava muito das cidades onde estavam as outras universidades e conhecia lá uma senhora que era mulher do professor Stiglitz, que nos apresentou a uns responsáveis numa altura em que a Universidade de Columbia era muito fraca na área da energia. Foi um casamento natural. Do que é que eu beneficiei disso? Eu nunca tive mais do que lugares temporários, contratos renovados anualmente e muito mal pagos".

Sem referir diretamente o nome de Ricardo Salgado, o antigo ministro diz que está a ser prejudicado "por várias relações de proximidade", referindo que se quis desligar do Banco Espírito Santo numa altura em que aquela entidade ainda existia.

Manuel Pinho está em prisão domiciliária, decretada pelo juiz Carlos Alexandre, uma medida de coação aplicada depois de o ex-ministro ter afirmado que não tinha dinheiro para pagar os seis milhões de euros da caução (a mais alta de sempre).

A mulher do ex-governante, Alexandra Pinho, terá de depositar uma caução no valor de um milhão de euros, além da apreensão do passaporte e a obrigação de apresentações quinzenais numa esquadra da PSP, confirmou o advogado do casal, Ricardo Sá Fernandes, à saída do Campus da Justiça.

Manuel Pinho foi constituído arguido no âmbito do caso EDP no verão de 2017, por suspeitas de corrupção e branqueamento de capitais, num processo relacionado com dinheiros provenientes do Grupo Espírito Santo.

O caso EDP está relacionado com os CMEC (Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual) no qual António Mexia e Manso Neto são suspeitos de corrupção e participação económica em negócio para a manutenção do contrato das rendas excessivas em que, segundo o Ministério Público, terão corrompido o ex-ministro da Economia Manuel Pinho e o ex-secretário de Estado da Energia Artur Trindade.

O processo tem ainda como arguidos o administrador da REN e antigo consultor de Manuel Pinho João Conceição, Artur Trindade, ex-secretário de Estado da Energia de um Governo PSD, e Pedro Furtado, responsável de regulação na empresa gestora das redes energéticas.

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