Começou a cair e nunca mais parou. Nem o recuo de Trump nas tarifas, nem a recuperação das bolsas, travaram a queda. Em seis meses, a moeda perdeu mais de 10% face às principais divisas. Há um sinal a piscar nas entrelinhas: o mundo já não olha para os Estados Unidos como antes
Mesmo depois de Donald Trump recuar nas ameaças de tarifas e de Wall Street ter sacudido o pó, o dólar continua a cair. Desde o início do ano, já perdeu mais de 10% face a um cabaz de moedas dos principais parceiros comerciais dos EUA — uma quebra que não se via desde o tempo em que Nixon desligou o dólar do ouro.
Desta vez, o abalo vem da Casa Branca. Trump quis redesenhar a ordem global: tarifas altas, uma política externa mais fechada, uma América menos disposta a jogar em equipa. E os mercados sentiram isso.
Entre a incerteza sobre a inflação, o peso da dívida pública e um clima de desconfiança crescente sobre o papel dos EUA no centro do sistema financeiro, o dólar foi perdendo tração.
Para os americanos, tudo isto se traduz em viagens mais caras e em menos apetite estrangeiro para investir nos EUA — precisamente quando o Governo quer endividar-se mais. Para os exportadores, a queda do dólar até podia ser boa notícia. Mas com as tarifas em cima da mesa, até os efeitos clássicos do câmbio estão em suspenso.
No início, a reeleição de Trump entusiasmou os mercados. Soava a crescimento, a negócios, a dólares a entrar. Mas o entusiasmo esmoreceu. O índice do dólar atingiu o pico em janeiro e começou a escorregar. Vieram os receios com a inflação, os juros altos, as tarifas inesperadas — e o sentimento virou.
Os investidores temem agora que as tarifas prolonguem os juros altos, apertem ainda mais a economia e desencorajem o investimento em ativos americanos. Há quem fale já numa mudança de paradigma: uma fuga lenta ao dólar como ativo de refúgio.
Mesmo assim, convém lembrar: o dólar partiu de um patamar elevado. E apesar da queda, não está historicamente fraco. Mas o sinal está dado. Como sublinhou Steve Englander, do Standard Chartered, “a questão não é ter um dólar forte ou fraco. A questão é o que isso diz sobre como o mundo vê as tuas políticas.”
E o que o mundo vê, hoje, é uma América que promete gastar mais, endividar-se mais, e exigir mais dos investidores — precisamente quando estes começam a olhar para outros portos.