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Desde sempre os bebés e as crianças começam a explorar o mundo ao seu redor, procurando novas experiências e desafios. É algo natural.
Entre essas experiências, uma das mais universais e inevitáveis é a frustração.
É desafiante e doloroso quando o filho reage de forma negativa cada vez que é contrariado! Fica triste, fala mal, chora, grita, vira as costas, bate com a porta. Há uma variedade de reações que mudam ao longo da vida e que impactam significativamente na dinâmica familiar.
Os pais sentem-se perdidos e, frequentemente, facilitam situações que evitem a frustração entrar dentro de casa. É comum o deixar ganhar, o dar um doce antes de comer ou permitir horas no telemóvel, muitas vezes porque os próprios adultos gerem com dificuldade a frustração educativa que acarreta esta reação dos filhos.
Muitos pais procuram a ajuda de um psicólogo porque os filhos (crianças, adolescentes e por vezes jovens adultos) têm dificuldade em lidar com as situações adversas. A expressão “o meu filho, ou a minha filha, não sabe lidar com a frustração” é recorrente.
No acto de educar acreditam, naturalmente, que a melhor forma é proporcionar ao longo da vida experiências repletas de emoções positivas, evitando situações que provoquem mal-estar ou desagrado. No entanto, evitar frustrações não elimina o problema. Pelo contrário, pode limitar o desenvolvimento emocional saudável. Muitas vezes antecipam situações para que a criança ou o adolescente não se sinta triste, desanimado ou insatisfeito, mas permitir que sofram de forma controlada é crucial para que aprendam a lidar com as frustrações e as perdas inevitáveis ao longo da vida.
O Nico de 4 anos quer descer as escadas sozinho, mas o medo de que ele caia é tão grande que não o deixam. A Luísa de 7 anos fica furiosa quando perde um jogo e a família decide deixá-la ganhar, para ela não chorar. A Isabel de 9 anos chora porque os colegas não a deixaram jogar à bola e um dos progenitores decide ir falar com os pais da turma para solucionar o problema. O Xavier de 15 anos quer umas chuteiras novas, seria o seu presente de Natal, mas para ele não sofrer, decidiu-se pela compra imediata. Estes são exemplos em que se evita a possibilidade de vivenciar uma situação de frustração ou em que se tenta “corrigir” a frustração sentida. Embora bem-intencionada, esta abordagem pode trazer consequências negativas. Aos pais dói muito sentirem o filho ou a filha triste ou desesperado por não conseguir os seus objetivos e, por isso, muitos fazem as coisas pelos filhos como estudar por eles, ajudá-los nos trabalhos, antecipar as necessidades, dar a resposta sem lhes dar tempo para a descoberta e quando saem frustrados rapidamente arranjam estratégias para diminuir o nível de desagrado deste ser tão amado, porque a dor dele é também a dor dos pais.
Mas o que acontece quando se superprotege um filho? Na realidade são retiradas possibilidades de experimentar o ficar frustrado. Todos precisam de momentos de frustração para aprender e gerir recursos. Por exemplo o Manel, de 21 anos, era um excelente aluno, mas desistiu da faculdade após um insucesso pontual. Tem medo de rejeições e por isso não quer ir a entrevistas de trabalho. Cresceu num ambiente onde tudo era facilitado sem nunca ter aprendido a lidar com desafios e frustrações. É importante, ao longo do crescimento, lidar com o desapontamento para um desenvolvimento emocional e psicológico saudável.
A frustração é uma emoção que surge quando alguém se depara com obstáculos ou impedimentos que dificultam ou impossibilitam a realização de desejos, expectativas ou necessidades. Acontece quando há uma discrepância entre o que se espera ou deseja e o que realmente acontece. Desde o primeiro momento em que um bebé chora por não conseguir algo, ele aprende limites e desafios. Ao encontrar dificuldades, ele vai compreendendo, pouco a pouco, que nem sempre tudo será feito ao seu gosto e que, muitas vezes, é preciso tentar várias vezes ou procurar novas soluções. Esta é uma forma de aprender.
A sensação de insatisfação frente à frustração pode variar de leve desconforto a raiva intensa, dependendo da situação e da importância do objetivo frustrado. Para crescer é importante sentir esta e diferentes emoções, que vão da tristeza à alegria e satisfação, passando pelo medo, raiva e outros sentimentos. São essas emoções que ajudam a enfrentar desafios e a dar sentido à vida.
Frustrações associadas aos erros tornam-se catalisadoras poderosas para o desenvolvimento pessoal. Além de se aprender a ser tolerante e a perceber que as ações têm consequências, a criança adquire ferramentas e tornar-se-á num adulto capaz de lidar com as adversidades e frustrações, evitando chegar à situação do Manel. Por isso, há momentos em que é importante deixar que o filho ou a filha resolva o seu problema. Claro que é difícil lidar com a tristeza do filho que perde num jogo, mas há que preparar os petizes para o futuro, nomeadamente um futuro em que os pais não estarão sempre presentes.
Viver envolve adversidades com as quais é preciso lidar para preparar o futuro e ajudar a crescer com alternativas. Isso contribui para o desenvolvimento da resiliência, que é a capacidade de se adaptar e superar dificuldades ao longo da vida.
Ao conviver com a frustração aprende-se a reconhecer e controlar as emoções, o que ajudará no desenvolvimento da inteligência emocional, permitindo gerir situações emocionais de forma mais equilibrada.
Quando se enfrenta a frustração, desenvolvem-se competências de resolução de problemas e aprende-se a ser mais criativo e perseverante. Superar frustrações aumenta a autoestima, a autonomia e a confiança para enfrentar novas situações. A frustração faz parte da vida, e aprender a lidar com ela desde cedo prepara a criança para o mundo real.
Em resumo, enfrentar e superar frustrações desde cedo é crucial para o desenvolvimento saudável de uma criança, tanto ao nível emocional quanto cognitivo. Isso prepara-a para ser um adulto mais equilibrado, mais resiliente e mais capaz de lidar com desafios futuros.
Percebendo que a frustração é importante os pais deparam-se com um novo problema: como ajudar o filho ou a filha a lidar com esses contratempos da vida?
Como ajudar este pequeno ser que parece sofrer horrores apenas porque não foi ao parque brincar. Ajudar a lidar com a frustração é essencial, é uma das formas de incentivar a autenticidade nas crianças, adolescentes, jovens e adultos, permitindo que sejam genuínos e fiéis a si mesmos.
Educar é um propósito árduo, muito gratificante, mas árduo. Ensinar a lidar com a frustração exige persistência e resiliência até porque muitos de nós, adultos, também nem sempre sabemos como lidar com a contrariedade.
Pais experientes sabem que é impossível conversar com a criança quando ela se frusta. Os mais pequenos choram sem parar, enquanto os mais velhos podem chorar, gritar, atirar com coisas, bater as portas, ou ficar apenas parados com um ar triste. Em momentos de crise não há conversa ou raciocínio lógico que resulte. O cérebro e o corpo estão em modo de alarme, sentem algum tipo de perigo e reagem de forma desajustada.
Eis algumas recomendações que poderão ajudar pais e mães:
- Para ajudar as crianças a lidar com a frustração é fundamental conter a própria frustração ou irritação sentida pelo adulto, acalmando e mantendo a compostura para conversar com a criança. Por vezes é apenas esperar que o comportamento acalme, e para acalmar poderão utilizar alguma estratégia previamente ensinada ou usada ou, simplesmente, estar presentes, dar uma mão ou um colo.
- É importante mostrar empatia e validar os sentimentos, sem minimizá-los. Por exemplo dizer algo como “Eu percebo que estás zangado porque não conseguiste o que querias, e isso é normal." Esta simples frase ensina que o sentir-se desanimado é uma emoção válida e natural. Ajude-o a entender o que está a sentir: se raiva, ansiedade, nervosismo, tristeza, são todos sentimentos que formam a frustração. Mostre que compreende o que ele está a passar e que também já teve momentos assim.
- É preciso ajudar a criança a perceber o que gerou a frustração, a identificar a causa. Com uma boa pergunta poder-se-á clarificar o sucedido do ponto de vista de criança ou adolescente (o que aconteceu? o que te deixou neste estado?). Esta atitude incentiva a reflexão e o autoconhecimento. É importante ouvir, perguntar, mas evitar comentar, aceitando os sentires do desapontado.
- Os pais são o modelo, pelo que podem mostrar como lidam eles com a frustração. Por exemplo: "Eu também fico frustrado às vezes, mas respirar fundo ajuda-me a pensar melhor." As crianças e adolescentes aprendem muito pelo exemplo dos pais, mesmo quando parecem que não estão atentos.
- Ensinar algumas estratégias de regulação emocional como a respiração profunda (mostrar que respirar lentamente pode ajudar a acalmar), o criar pausas para refletir (afastar-se do problema alguns minutos para acalmar), contar até 10 (uma técnica simples, mas eficaz, para ganhar tempo antes de reagir), rasgar folhas de papel ou mesmo beber um copo de água.
- Ajudar os filhos a pensarem em formas alternativas de resolver ou aceitar o problema com perguntas do tipo “se isto não funcionou o que mais podes tentar”, “haverá outra forma de resolver isso?”. Com esta atitude está a encorajar-se a criatividade na procura de soluções.
- Muitas vezes, o que frustra as crianças é algo que pode ser resolvido. Então, deve-se conversar e tentar chegar a uma solução. É importante ressaltar que não se trata de resolver o problema pela criança ou adolescente. Ela precisa de aprender a enfrentar as dificuldades e aplicar soluções. E os pais podem ajudar a descobrir a melhor maneira de resolver a questão, juntos. Desse modo, quando surgir um novo problema, ele vai-se lembrar das orientações dadas pelos pais.
- Os filhos também costumam frustrar-se quando os pais dizem um não aos seus desejos, ou seja, se os pais decidiram que o seu educando não pode fazer algo, não volte atrás. Tenha em mente que ajudar a criança a lidar com a frustração não é dizer sempre sim. Dê o apoio que ele precisa nesse momento, mas não seja conivente só para que ele fique feliz de novo.
- Reforcem a paciência explicando que muitas vezes as coisas não acontecem exatamente como se gostaria, mas que é importante tentar novamente. Frases como: "Não há problema em errar, o importante é continuar a tentar" ou “paciência, logo farás melhor” ajudam a construir resiliência.
- É importante explicar que nem sempre as coisas acontecerão como desejam, é normal, para aprenderem a diferença entre o que podem controlar e o que está fora do limite pessoal.
- Ajudar os filhos a focarem-se no que correu bem ou no que já alcançaram, é uma forma de praticar a gratidão e a positividade. Perguntem: "O que podemos aprender com isso?" ou "o que de bom aconteceu hoje?".
- Jogos de tabuleiro, puzzles ou desportos são atividades que ensinam a paciência e a resiliência. Livros ou histórias com personagens que enfrentam desafios e superam dificuldades poderão ser bons exemplos educativos de modelagem comportamental.
- É muito tentador resolver tudo aos filhos, mas isso pode prejudicar o seu crescimento e a sua aprendizagem. Tente antes orientar e incentivar: "Eu sei que é difícil, mas acredito que tu consegues lidar com isso." É importante estar presente, dar apoio, mas não fazer pela criança ou pelo adolescente.
- Por fim: seja paciente. Os pais e educadores também têm de desenvolver muita resiliência.
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