O Psicólogo Responde: Como lidar com relações tóxicas?
Relação tóxica

O Psicólogo Responde: Como lidar com relações tóxicas?

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Tiago Pimentel
Membro da direção da Ordem dos Psicólogos Portugueses

Não será errado dizer que nós também somos as nossas relações. Aliás, elas cumprem na vida de cada um de nós um espaço fundamental, porque através delas cumprimos sucessos, fracassos, oportunidades de crescimento e aprendizagem. Ora, assumido que está o relevo que as relações ocupam no nosso dia a dia, importa refletir, em particular, em torno das relações que, a certa altura, se revelam pouco saudáveis e equilibradas. As designadas relações tóxicas.

Quando nos deparamos com relações tóxicas, sejam elas amorosas, familiares, profissionais ou de amizade, é importante, em primeira instância, ganharmos consciência do espaço físico, social e emocional que as mesmas têm em nós. Só assim, conseguiremos estabelecer o discernimento e agilidade mental para encetar esforços para desenvolver mecanismos de proteção.

Tentaremos, ao longo desta reflexão, explorar formas eficazes de lidar com relações nocivas para o nosso self, sem permitir que que elas drenem o nosso bem-estar.

Como identificar relações tóxicas

O reconhecimento de uma relação como tóxica depende muito da implicação emocional que temos na mesma. Esta implicação emocional é mediada pelo sentido de proximidade, cumplicidade, atenção, afeto, poder e respeito. Na interseção destas dimensões, pode por vezes ser difícil reconhecer o que nos é nocivo, como sejam dinâmicas de manipulação, controlo excessivo, desvalorização, exposição a críticas constantes, falta de empatia e desrespeito pelos limites pessoais. A exposição e vivência de uma relação tóxica conduz, na maioria das vezes, a um estado de espírito de desgaste, insegurança, ansiedade e angústia. Este quadro será, portanto, um bom indicador de reconhecimento de que estaremos perante uma relação tóxica e por isso tornar-se prioritário reavaliar a natureza e a dedicação a esse vínculo.

Criação de limites

Quanto mais presente estiver esta noção de que é importante criar limites claros, mais protegidos conseguiremos estar de relações e/ou ambientes tóxicos. Muitas vezes, pessoas com condutas tóxicas são pródigas em ultrapassar limites alheios, porque a experiência lhes transmite que o podem fazer sem risco de grandes consequências. Este tipo de atitudes pode e deve ser combatido, logo desde o

momento em que detetamos que existe uma possibilidade de se verificar algum dos sinais acima descritos, exibindo uma atitude firme e assertiva, deixando ciente o que aceitamos e toleramos.

Do ponto de vista prático, estabelecer limites pode significar dizer “não” com mais frequência, evitar determinados assuntos ou até mesmo reduzir o tempo de convívio. Importa ter presente que uma conduta assertiva deverá pressupor um alinhamento entre a comunicação verbal e não verbal, pelo que o nosso discurso verbal deve ser tão claro quanto a nossa atitude comportamental. Se eu comunico que “não aceito ser tratado(a) dessa forma” ou “discordo do que está a dizer e por isso prefiro terminar a conversa”, então a nossa atitude corporal e social tem de acompanhar esta intencionalidade.

Quebra do vínculo emocional

Um dos maiores desafios ao lidar com as relações tóxicas é reunir esforços para aprender a estabelecer o desvinculo emocional. Grande parte das vezes, as relações tóxicas têm lugar entre pessoas com uma forte proximidade e implicação na vida uma da outra, facto que facilita a interferência negativa e a diluição da toxicidade. A reação necessária será o desenvolvimento do desapego emocional. Isto não significa ser indiferente ou frio, mas sim aprender a não reagir emocionalmente às provocações e/ou manipulações.

Para este efeito, o contexto de terapia pode ser um espaço de ajuda assim como a consciência plena de que o comportamento do outro é um reflexo dele próprio, e não de nós.

Rede de influências positivas

Os nossos relacionamentos devem ser fontes de apoio e bem-estar e não de sofrimento. Investir na construção de relações saudáveis e positivas, interagindo com pessoas que nos respeitam, nos incentivam e nos fazem sentir valorizados, contribuem para mitigar os efeitos negativos das relações tóxicas.

Criar uma rede de apoio com amigos, familiares ou profissionais de confiança pode ser extremamente benéfico. Ter alguém com quem conversar, que possa contribuir com uma perspetiva externa sobre a situação, ajuda a fortalecer a nossa autoestima e a nossa capacidade para enfrentar desafios emocionais.

Promover o afastamento

Em alguns casos, a melhor solução pode ser o afastamento total da figura tóxica.

Isso pode ser difícil, especialmente quando estamos a considerar familiares próximos ou colegas de trabalho, mas, em certas situações, é a única forma de preservar o equilíbrio mental.

Na impossibilidade de radicalizar o corte do laço, a abordagem mais indicada será reduzir a frequência e a intensidade do contacto. Em contexto profissional, a comunicação a manter deve ser a estritamente formal e objetiva, por forma a minimizar o impacto e o conflito. Na esfera familiar, estabelecer limites rígidos sobre os temas das conversas e o tempo de convivência pode evitar desgastes emocionais.

Promoção da saúde mental

Lidar com relações tóxicas pode ser emocionalmente desgastante, por isso, cuidar da saúde mental deve ser uma prioridade. Praticar atividades que tragam prazer, como exercícios físicos, leitura, hobbies ou terapia, pode ser essencial para manter o equilíbrio emocional.

Adicionalmente, procurar ajuda de um profissional de saúde mental pode ser útil para desenvolver estratégias para lidar e enfrentar relações desta natureza. Um psicólogo pode ajudar a encontras as ferramentas certas para lidar com situações desafiadoras, sem que elas nos afetem de forma profunda.

Em suma, é um facto que as relações tóxicas podem ser extremamente prejudiciais para nosso bem-estar, mas é também seguro afirmar que existem formas eficazes para lidar com elas, garantindo a auto-preservação emocional.

A chave está em lembrar que temos controle sobre nossa própria vida e que merecemos relações que nos tragam felicidade e crescimento. Ao priorizarmos o nosso bem-estar e rodearmo-nos de pessoas que nos respeitam e valorizam criamos um ambiente mais saudável e positivo ao longo do nosso percurso.

Cinco ideias a reter

  • Estabelecer limites firmes. Defina o que aceita e o que não tolera. Seja assertivo ao colocar limites e não ceda à manipulação emocional.
     
  • Quebrar vínculos emocionais. Distancie-se percebendo que o comportamento é um reflexo do outro, e não seu.
     
  • Identifique e evite conflitos. Atitude e pensamento divergente face à provocação. Mantenha a neutralidade e foque-se num tema de outra natureza.
     
  • Invista em relações saudáveis. Fortaleça relações com pessoas que a apoiam e valorizam. Ter uma rede de apoio pode ajudar a reduzir o impacto de relações prejudiciais. 
     
  • Identifique e atue no momento de se afastar. Se a relação for insustentável, considere afastar-se ou reduzir o contacto. Por vezes, a melhor solução para preservar a saúde mental é anular o contacto com o estímulo tóxico. 

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