A ansiedade é, antes de mais, uma emoção natural de resposta antecipatória a uma situação geradora de medo. É perfeitamente adequada e desejável quando a situação é perigosa, uma vez que mobiliza a pessoa para a tentativa de resolução do perigo ou para o evitamento do mesmo. Contudo, é potencialmente perturbadora quando a pessoa sente medo perante uma situação que não o justifica por não ser perigosa. A ansiedade, neste caso, surge a partir da catastrofização de uma situação, ou seja, de uma antecipação negativa e altamente pessimista que vai mobilizar a pessoa para a resolução de algo que não será possível resolver, seja porque ainda não aconteceu, seja porque os fatores de risco existentes são difíceis de mitigar. Daqui resultará o agravar do quadro ansioso que começa, em si mesmo, a ser o problema da pessoa.
Temos, deste modo, que quando alguém vive uma crise financeira real, é natural que sinta ansiedade. Contudo, o seu foco estará centrado nas tentativas possíveis de resolução do problema, e não nas sensações decorrentes do aumento da ansiedade. Aliás, é natural que nem delas se aperceba, a não ser que não consiga a sua resolução num espaço de tempo razoável. Contudo, ainda assim, nesse caso, a sensação prevalente será a frustração, geradora de tristeza e não tanto de ansiedade.
Quando a ansiedade é sentida perante contextos antecipatórios não passíveis (ou muito difíceis) de serem controlados pela pessoa (como um ou vários acontecimentos catastróficos não prováveis) que podem incluir perda de emprego, agravamento de crises económicas ou conflitos, doenças, entre outros, a sensação de ansiedade poderá ter tendência a prolongar-se e agravar-se. Na verdade, para além de poder aumentar o controlo dos seus gastos, a pessoa não pode resolver situações antecipadas como possíveis, mas que não existem de facto. Deste modo, a ansiedade não se resolve, tornando-se cada vez mais consciente para a pessoa e geradora de ainda mais preocupação, tornando a sensação mais intensa, a preocupação maior e, por isso mesmo, mais perturbadora. Daqui pode resultar a adoção de comportamentos de controlo ou de evitamento, como a poupança excessiva ou, em contrapartida, um consumo impulsivo que visa o alívio momentâneo do desconforto. Estes comportamentos, ou outros equivalentes, não vão resolver o problema. Pelo contrário, poderão agravá-lo uma vez que tendem a intensificar o mau estar e a dificultar ainda mais a capacidade de tomar decisões financeiras racionais e equilibradas.
De todo o modo, a incerteza económica, a pressão social para manter determinados padrões de consumo, bem como a insegurança profissional são fatores que podem contribuir para que este fenómeno seja mais frequente. A origem desta ansiedade financeira, tal como em todos os problemas na área da saúde mental, é multifatorial. Contudo, os fatores sociais e culturais desempenham um papel importante. Na verdade, vivemos numa sociedade em que o sucesso é frequentemente medido pelo dinheiro e pelo poder, o que pode gerar uma maior pressão para acumular bens ou para manter padrões de vida elevados. Além disso, as sucessivas crises económicas e o aumento das desigualdades contribuem para uma sensação generalizada de incerteza e vulnerabilidade. Ainda, a pressão social para consumir em excesso contribui significativamente para o problema, pelo que a educação da população no sentido da promoção do consumo consciente deve ser uma preocupação. Do mesmo modo, investir em literacia financeira desde cedo pode também constituir-se como um contributo.
Do ponto de vista mais pessoal, uma tendência geral para a ansiedade pode também refletir-se a nível financeiro e catalisar dificuldades nas relações familiares, bem como noutras interações sociais, gerando tensões e desentendimentos, o que contribui para o agravamento do quadro.
Um passo importante para lidar com a ansiedade financeira será uma consciencialização do problema. Muitas pessoas sofrem em silêncio com as suas inseguranças financeiras por medo de julgamento ou estigma. É importante normalizar o facto de que todos, em algum momento, podem enfrentar desafios financeiros. Partilhar as dificuldades pode aliviar o peso da ansiedade e promover soluções mais racionais e ajustadas às circunstâncias e o estigma em relação a estes temas será sempre um obstáculo. Na verdade, reconhecer e identificar os pensamentos e comportamentos que contribuem para a perpetuação desse ciclo de ansiedade é fundamental para motivar a pessoa a desenvolver comportamentos que possam ser protetores. Uma adequada educação financeira pode ser importante. Adquirir competências básicas de literacia financeira, como aprender a fazer um orçamento, a poupar e a investir de forma racional, pode aumentar a sensação de controlo e reduzir a incerteza. Paralelamente, repensar a relação com o dinheiro e com as expectativas sociais associadas pode ser um passo relevante. O foco em relações saudáveis e em realizações pessoais pode ajudar a reduzir a pressão e a criar expetativas desafiantes geradoras de sensações positivas que facilitam a distração da pessoa em relação à ansiedade e aos focos que podem contribuir para a sua manutenção. A prática de exercício físico regular, uma boa higiene do sono e atividades indutoras de relaxamento são sempre importantes porque auxiliam a pessoa a reconhecer e potenciar uma relação positiva com a ansiedade. A intervenção psicológica pode ser uma alternativa válida, seja para ajudar a identificar outros fatores que possam contribuir para o quadro identificado como de ansiedade financeira, seja como forma de orientar a pessoa quanto à definição de objetivos realistas do ponto de vista financeiro. Introduzir o conceito de “segurança financeira suficiente” pode ser uma boa ajuda. Em vez de perseguir uma acumulação contínua de dinheiro como forma de tentar gerir a ansiedade, uma abordagem mais saudável é estabelecer um nível de segurança financeira com base em objetivos realistas e necessidades pessoais, o que pode ajudar a pessoa a canalizar energia para outras áreas de realização pessoal. Para além disso, o acompanhamento psicológico pode contribuir para monitorizar e, deste modo, ajudar a pessoa a sentir que está no caminho certo, o que pode contribuir para a sua tranquilidade. De todo o modo, quanto mais claro for que a ansiedade financeira surge no quadro de um conjunto de sintomas ansiosos mais amplo, mais importante será este acompanhamento.
Sugestões:
- A ansiedade em contexto financeiro é cada vez mais comum e normalmente decorre de uma visão catastrófica antecipatória que se torna fonte e consequência da ansiedade.
- A literacia financeira, o reconhecimento de uma valorização social excessiva em relação ao dinheiro, a partir da definição de um conceito de “segurança financeira suficiente”, e a procura de foco em relações saudáveis e realizações pessoais, serão ferramentas essenciais para o controlo da ansiedade financeira.
- Normalizar a vulnerabilidade financeira pode ser bastante protetor uma vez que facilita a partilha das dificuldades vividas ou imaginadas com terceiros, sejam pessoas próximas ou profissionais, o que pode ser um fator determinante para mitigar o problema.
- A intervenção psicológica pode ser importante, seja para uma maior consciencialização e identificação de fatores sociais e pessoais que possam estar a contribuir para o problema, seja para a definição de estratégias para o mitigar, seja ainda para monitorizar a evolução, aumentando a segurança da pessoa.
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