O Psicólogo Responde: Ataques de pânico no trânsito. O que devo fazer?
Trânsito

O Psicólogo Responde: Ataques de pânico no trânsito. O que devo fazer?

O Psicólogo Responde é uma rubrica sobre saúde mental para ler todas as semanas. Tem comentários ou sugestões? Escreva para opsicologoresponde@cnnportugal.pt

Sérgio Viana
Psicólogo e membro da direção da Delegação Regional Centro da Ordem dos Psicólogos Portugueses

“Sai da frente sua lesma” 

“A estrada não é toda tua!” 

“O verde é para andar!” 

Ataques de fúria na estrada... não são propriamente o título que me leva a escrever este artigo associado ao pânico, mas ... até que ponto não haverá algumas semelhanças na base do que os origina?  

Na realidade é no trânsito e em situações de pressão e ansiedade em que tendemos a ser mais reativos, sendo cada vez mais comum haver condutores que “se passam” no trânsito e reagem com quem o rodeia de formas desajustadas, havendo mesmo manifestações também consequentes de ansiedade e stresse, bem diferentes. 

Muitas vezes o facto de andarmos angustiados, stressados e a pensar em mil e uma coisas ao mesmo tempo, leva-nos a ter de gerir inúmeros estímulos em simultâneo, gerando um frenesim que intensifica os nossos níveis de ansiedade e stresse. 

Ora, é precisamente essa ansiedade e os elevados níveis de stresse que pode levar a que os ataques de pânico sejam mais prováveis de acontecer em quaisquer circunstâncias. E, naturalmente, é no meio do trânsito onde temos também muitas probabilidades de ter um ataque de pânico. 

Estar na VCI, na 2a Circular, nas ruas de Coimbra, no final da tarde de um dia de trabalho... o calor, o trânsito, o fumo, as obras, o barulho, o stress e a necessidade de chegar a tempo enquanto nos sentimos cada vez mais pressionados, parece que todos olham para nós, as buzinas que não param, os pensamentos numa escalada frenética e de repente, aparentemente do nada, a hiperventilação, o sufoco, a sensação de que o nosso coração pode acelerar de forma descontrolada e que podemos morrer. 

Portanto, naturalmente este não é um ataque de fúria ou de raiva em que parece que se quer levar tudo na frente ou numa versão mais agressiva como no “um Dia de Fúria” protagonizado por Michael Douglas.  

Então o que é e como é que sei que estou a ter um ataque de pânico? 

Sucintamente, um ataque de pânico é uma resposta exacerbada ao medo ou stresse em que temos a sensação de que vamos enlouquecer e que até pensamos que podemos morrer.  

O contexto em concreto reserva-nos sempre alguma estranheza porque à partida estamos num carro, se calhar até parados e aparentemente sem estímulos em redor que pudessem gerar qualquer tipo de reação. Mas será que é mesmo assim? Na realidade há sinais que indicam que se pode estar a iniciar um ataque deste género, tais como palpitações ou taquicardia, desconforto ou dores no peito, suores e sensação de sufoco, enquanto se sente dificuldades em respirar ou falta de ar. Além disso sentir tremores e alguma confusão. Podemos também sentir náuseas e desconforto gástrico, sensação de desmaio ou tonturas. Em paralelo podem ocorrer parestesias, com uma sensação de despersonalização, como se não fossemos nós a estar ali, como se num mundo paralelo e fora daquele contexto. Culmina numa sensação de estarmos a enlouquecer e até que podemos morrer a qualquer momento. 

Destes sintomas, importa referir que só com pelo menos 4 deles identificados se considera que se está a sofrer um ataque de pânico.  

O medo de estar a morrer deriva do facto de os sintomas serem por vezes tão súbitos e severos que podem-se assemelhar a um ataque cardíaco, daí ser importante assim que possível procurar ajuda profissional para um diagnóstico correto e intervenção ajustada.  

Felizmente na maioria das vezes estes episódios não duram mais de 30 minutos, mas se alguns não duram mais de 15 segundos, pode haver circunstâncias em que se podem prolongar por mais tempo, não havendo possibilidade de prever se e quando haverá um próximo.  Tudo depende das circunstâncias que se esteja a viver, a sentir.  No caso de vivenciar estes episódios mais duradouros é importante que procure um profissional especializado nesta área, de forma a encontrar uma resposta mais eficaz para a resolução do problema.  

O que pode causar um ataque de pânico neste contexto? 

Apesar de poder haver uma relação direta entre o ato de conduzir e stresse, há também questões inconscientes que à partida não associamos. Ou seja, se por um lado poderá ocorrer um ataque de pânico sem qualquer motivo aparente, é importante identificar variáveis que o poderão ter causado.  

Assim, se andarmos sob elevados níveis de stresse, há mais probabilidade de ter um ataque de pânico. Como o leitor pode imaginar, o frenesim diário a que estamos expostos pode ser uma variável importante que pode despoletar um episódio de pânico mesmo que não se tenha sofrido de qualquer acidente prévio que possa ter gerado trauma.  

Vários estudos fundamentam que o facto de se ter sofrido um acidente de viação previamente gera maiores probabilidade de se ter um ataque de pânico ao volante. As próprias condições da estrada, algo que em Portugal é especialmente paradoxal, porque tanto temos autoestradas amplas como vias rápidas que nos “envolvem” de betão e podem gerar uma sensação de prisão ou de não ter fuga. Estímulos como estes ou o receio de conduzir em túneis, ou passar em viadutos muito altos são fatores que podem ter influência e potenciar um ataque. Portanto, cada caso é um caso e cada um de nós tem vivencias muito especificas. Desta forma, generalizar é um erro e é importante que cada um de nós tenha em atenção as suas próprias características de personalidade e antecedentes traumáticos. Porque cada um de nós tem uma história e personalidade única. 

Como agir em caso de ataque de pânico? 

Algumas estratégias para lidar com o pânico se estiver no meio do trânsito: 

  • Perceção do Pânico
     
    • Encostar a viatura assim que possível e/ou mal se aperceba de alguns sinais de pânico colocar-se de forma segura, salvaguardando as condições de segurança para si e para os passageiros na sua viatura caso existam.  
       
    • Foco num “coping” adaptativo. É importante concentrar-se na sua respiração, focado no presente, praticando alguns exercícios de relaxamento que podem ajudar a apaziguar e a gerir melhor os sintomas. Importante estar informado sobre estas estratégias para, caso ocorram novos ataques, poder estar mais bem preparado para gerir estes episódios. 
       
    • Estratégias de distração. Nestes momentos é importante distrairmo-nos das emoções inerentes, mudando o foco e redirecionando para outros estímulos que não ponham em causa a segurança, tais como ouvir música ou um programa de entretenimento na rádio ou podcast, por exemplo. Cantar e interiorizar algum tipo de mensagens e pensamentos que induzam serenidade são também formas de empoderar a capacidade de superar esses momentos. E testar os nossos dotes vocais (no carro) é sempre saudável. 
       
    • Gestão dos pensamentos. Durante um ataque de pânico os nossos pensamentos andam num turbilhão que parecem não ter fim. É importante aceitar que tal está a acontecer e que é importante encontrar forma de gerir os pensamentos que são tendencialmente negativos. Fazer de conta que este episódio não está a acontecer pode agravar o problema. Por isso, em vez de dizer para si próprio “não penses assim” ou, “para lá com isto” ou “tem calma”, frases que até podem agravar a situação, tente utilizar “tu consegues gerir a situação”, “isto é um momento e vai acabar por passar”, “eu consigo superar isto”. 

Neste contexto importa sensibilizar para se evitar o consumo de substâncias prejudiciais. Apesar de temporariamente darem uma sensação de alívio e de até haver uma componente cultural associada, álcool ou outro tipo de drogas são meros paliativos temporários e poderão gerar outros problemas graves mais tarde. 

Se tiver medo de conduzir, uma nota: comece por praticar a condução em locais que considere mais seguros e que proporcionem a possibilidade de evoluir para maiores distâncias gradualmente. Pode começar por testar uma estrada regional sem trânsito e quem sabe se não acabará por fazer toda a lindíssima Estrada Nacional 2 que atravessa o País de Norte a Sul. 

Independentemente de quando ou onde possa ocorrer um ataque de pânico, é importante termos a noção de que há formas de cura. Na perspetiva de técnicas psicoterapêuticas neste âmbito, a maioria foca-se em estratégias de relaxamento tais como meditação, hipnoterapia clínica, respiração e atenção plena.  

As terapiasestratégias cognitivo-comportamentais, mais comuns para pânico e ansiedade, a terapia de exposição, terapia de aceitação e compromisso são já muito testadas e eficazes e com evidência científica. Psicofármacos prescritos por profissionais habilitados poderão também complementar as medidas de tratamento. 

No final de tudo não estamos “malucos” porque todos podemos ser vítimas de uma situação súbita em que tudo à nossa volta parece desmoronar, mas é importante sabermos que há várias estratégias que podemos adotar não só a curto prazo, mas também para superar o problema definitivamente.  

No que diz respeito à condução, e sempre que puder, procure as estradas à beira-mar ou no meio da serra para parar, contemplar a paisagem e respirar. Assim, já não correrá tantos riscos de se irritar com o condutor da frente nem de ter um ataque de pânico por sentir-se assoberbado de emoções negativas. 

Mas todos os dias podemos fazer a diferença com algumas mudanças de atitudes e do nosso estilo de vida. Por isso, cuide melhor de si, com mais tempo para as coisas que realmente lhe proporcionam bem estar. Mude de contexto, ria mais, esteja com pessoas com quem realmente se sente bem, pratique atividade física e desportiva. Sentirá uma redução nos seus níveis de ansiedade. Nunca esquecendo a importância de ter uma alimentação saudável e um sono reparador.  

E quando sentir que algo não está bem, não hesite ou adie, não conseguimos resolver tudo sozinhos e um Psicólogo pode ajudar!  

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