"Ninguém consegue cuidar se não for cuidado." Os cuidadores informais já têm estatuto, mas falta-lhes tudo o resto
Cuidadores informais. Foto: Matt Cardy/Getty Images

"Ninguém consegue cuidar se não for cuidado." Os cuidadores informais já têm estatuto, mas falta-lhes tudo o resto

Texto
Maria João Caetano

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Matt Cardy/Getty Images

O Estatuto do Cuidador Informal foi aprovado, após muita luta, em 2019. Mas os cuidadores continuam a queixar-se. As burocracias são muitas, os apoios são poucos. Ouvimos as histórias de quem cuida dos seus familiares - pais, irmãos, filhos, cônjuges. Cada história é diferente, mas há palavras que se repetem. Como estas: "Estou tão cansado"

A vida de Catarina Malheiro mudou no dia 16 de janeiro de 2013. Nesse dia, a mãe, com 77 anos, foi internada e foi-lhe diagnosticado um cancro no pâncreas. “Tive logo um mau pressentimento”, recorda. Apesar disso, não estava preparada para ouvir o que os médicos tinham para lhe dizer. “O risco de cirurgia era muito grande, não havia nada a fazer. Disseram-me que ela teria no máximo seis meses de vida.” O que se faz perante uma notícia destas? “Para-se tudo.” Catarina não hesitou um segundo. “A única coisa que havia a fazer era levar a minha mãe para casa e proporcionar-lhe o maior conforto possível no tempo que lhe restasse.”

Na altura, Catarina, que mora em Melgaço, distrito de Viana do Castelo, tinha uma loja, que fechou por tempo indeterminado. Na altura, tinha duas filhas, de 6 e 3 anos, que, de repente, a passaram a ver muito menos. Na altura, a mãe de Catarina era a cuidadora do marido, paraplégico há 30 anos, com necessidade de cadeira de rodas, e por isso, Catarina e a irmã tiveram de assumir o cuidado de ambos. Nos meses seguintes, tornou-se cuidadora da mãe praticamente a tempo inteiro e aprendeu tudo o que era necessário para tornar a sua vida melhor. Aprendeu a dar-lhe banho, a dar-lhe comida, a mudar-lhe a posição. Aprendeu a perceber-lhe os sintomas, as dores, os "ais". Aprendeu a mudar pensos, soro, sondas, a injetar insulina, a administrar morfina. Aprendeu a dormir sempre em alerta, com o intercomunicador ligado na cabeceira da cama ou, tantas noites, mudando-se para o quarto da mãe. “Estava tão focada no que tinha de fazer que não me custou absolutamente nada”, recorda. O mais difícil foi mesmo a parte emocional. “Via a degradação dela de dia para dia e isso custava-me imenso. Quando piorou, passei a viver por metas. Quero que ela viva até ao meu aniversário. Até ao Natal. Até…”

Os médicos estavam certos: a mãe de Catarina viveu cinco meses. Não se arrepende de nada do que fez, nem mesmo quando olha para trás e vê como aqueles cinco meses mudaram a sua vida. “Nunca mais fui a mesma. Entrei em depressão profunda e seguiram-se dois anos muito complicados. Ainda hoje, quando ouço uma ambulância ou se o telefone toca fora de horas, sinto o coração a acelerar”, diz. Há momentos em que nos sentimos atropelados pela vida. Foi isso que ela sentiu. Enquanto cuidava da mãe, Catarina engravidou. Viveu a gravidez e o luto ao mesmo tempo. Quando o filho nasceu, em vez de estar alegre, estava deprimida. “Não queria ver ninguém, não andava na rua. Emagreci imenso, não conseguia comer.” Entretanto, divorciou-se. Continuava a ter de cuidar do seu pai. Teve de admitir que não conseguia voltar a trabalhar e acabou por fechar a loja, ficando com imensas dívidas por pagar. E, aos cinco anos, confirmando as suas suspeitas, o filho foi diagnosticado com autismo.

A verdade é que Catarina Malheiro, que atualmente tem 43 anos, nunca mais deixou de ser cuidadora. Primeiro, da mãe. Depois, do pai. Agora, do filho. É aquilo a que a lei reconhece como "cuidadora informal", porque não é profissional. Mas ser cuidadora é o seu "trabalho" a tempo inteiro.

Estima-se que em todo o mundo existam 2 mil milhões de trabalhadores com uma jornada de trabalho equivalente a 40 horas semanais sem qualquer remuneração. Só na Europa, calcula-se que o número total de pessoas que prestam algum tipo de cuidado informal ascenda aos 125 milhões. Em Portugal, serão perto de 1,4 milhões, de acordo com um estudo, de 2020, do Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais.

Em 85% dos casos, os cuidadores informais cuidam dos seus familiares, sejam eles crianças, idosos, pessoas doentes ou com deficiência. Fazem-no sem qualquer remuneração, ou com direito a um pequeno subsídio, e cumprem uma função essencial - para a pessoa cuidada, mas também para a sociedade. Afinal, espera-se que em 2060 o número de pessoas dependentes e a precisarem de cuidados represente 13,4% da população portuguesa.

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A "obrigação" de cuidar dos familiares

Tal como Catarina, muitos dos que se tornaram cuidadores dos seus familiares sentiram que "não tinham opção". Mas será mesmo assim? "Não sendo necessária institucionalização, muitas pessoas preferem ficar na sua casa, porque é mais confortável. E os familiares preferem ser eles a cuidar porque há todo um lado afetivo e de garantia de sabermos como é que os idosos e doentes estão a ser cuidados", explica Liliana Gonçalves, presidente da Associação Nacional de Cuidadores Informais. Por outro lado, "há muitas pessoas que querem cuidar dos seus familiares, mas também há muitas que não se importariam de os colocar numa instituição. Só que as vagas são poucas e os preços são muito elevados, às vezes incomportáveis. E nem sempre, como se vê nas notícias, se pode confiar nas instituições", argumenta.

Além disso, "existe uma grande pressão social, as pessoas sentem que têm a obrigação de cuidar dos seus", reconhece a psicóloga Catarina Graça. "Se não o fizerem são acusados de serem maus filhos ou maus cônjuges. Às vezes são as próprias pessoas cuidadas que dizem que não querem ir para uma instituição e que fazem exigências. Temos de perceber que não é fácil ficar doente ou perder a autonomia, a nível psicológico é complicado, pode haver alguma revolta, claro, mas isto cria uma pressão acrescida no cuidador. O cuidado é sentido como um dever moral", explica a psicóloga. "É um peso muito grande e nem todas as pessoas estão preparadas para carregá-lo", alerta.

Durante muito tempo, o papel de cuidar foi atribuído às mulheres, que se mantinham fora do mercado de trabalho. "Em todas as famílias, havia sempre uma mãe, uma avó, uma tia, uma madrinha, uma mulher que tinha disponibilidade", recorda Palmira Martins, assistente social da Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla (SPEM) e membro do Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais. Mas os tempos mudaram. Vivemos mais tempo e com mais doenças crónicas. Temos filhos mais tarde e, logo, as exigências da geração "sandwich" são cada vez maiores. As famílias mudaram e já não são tão alargadas nem vivem tão próximas. As mulheres mudaram, foram estudar, têm carreiras, mais exigências profissionais e menos tempo. Mas as mentalidades demoram sempre mais a mudar.

"O papel da mulher mudou, deixámos de ter aquela presença física, sempre em casa, que movia este mundo e o outro. Esse trabalho de cuidar nunca foi validado porque era dado como certo. E é daqui que vem uma consciência social da obrigatoriedade do cuidar - que não devia existir. Ninguém é obrigado a cuidar. É um erro", diz, perentória, Palmira Martins.

Quer ser cuidador? Responda a três perguntas

Esta é uma mensagem que a assistente social procura transmitir nos muitos workshops para cuidadores que orienta por todo o país. "Numa situação em que são necessários cuidados, temos de fazer três perguntas: primeiro, se quero cuidar; depois, se consigo cuidar; terceiro, se tenho condições para cuidar. São três coisas fundamentais", diz, com a certeza de quem conhece bem o terreno.

"As pessoas têm de ser livres para escolher cuidar ou não, e temos de deixar de meter o bedelho na casa dos outros. Há uma chantagem emocional muito grande. Mas não há problema nenhum de pôr as pessoas num lar, onde têm bons cuidados, fisioterapia, toda a ajuda que precisam. Temos de deixar de sentir essa culpa", diz Palmira Martins. Até "porque não sabemos o que se passa nas outras famílias", ressalva. Não fala de cor, fala de casos, de pessoas com nomes. Uma filha que foi abusada pelo pai na infância. Uma mulher que era vítima de violência doméstica. "Quem é que a pode censurar se o marido tiver um AVC e ela pedir o divórcio?" Isto, claro, são casos extremos. Mas o que é um princípio básico é que "qualquer pessoa tem todo o direito de não querer cuidar de um familiar. A negligência e os maus-tratos podem surgir daí, de obrigar alguém a cuidar." Nem sempre a família é melhor do que uma instituição.

No caso de a pessoa escolher cuidar do seu familiar, há então que responder às duas outras questões: consigo cuidar? Tenho condições para cuidar? "Muitas vezes, as pessoas querem cuidar, mas precisam de ajuda porque não o conseguem fazer sozinhas. Precisam de acompanhamento de técnico, de aprender como se faz, de fazer alterações em casa, de ativar serviços de apoio domiciliário, de ajuda financeira... E é aqui que o Estado falha", diz a assistente social.

"Há muitas pessoas que querem cuidar dos seus familiares, mas também há muitas que não se importariam de os colocar numa instituição. Só que as vagas são poucas e os preços são muito elevados", salienta Liliana Gonçalves. Foto: Matt Cardy/Getty Images

"Dava tudo para ter uma rotina normal": os pais-cuidadores são verdadeiros super-heróis

"Já não posso ver hospitais." Vanessa Leitão baixa a cabeça e encolhe-se no sofá, como se, encolhendo-se, pudesse fugir à realidade. Tem 28 anos e está sozinha com os dois filhos: Dylan de cinco anos e Denzel de três. A chegada do primeiro filho foi uma felicidade enorme. "De tal maneira que quis logo ter outro", conta. "Estava a adorar ser mãe." Mas Denzel nasceu com Síndrome de DiGeorge, uma doença rara, complexa e grave, que provoca problemas cardíacos e uma série de outras dificuldades, deficiências (por exemplo no aparelho imunitário) e atrasos no desenvolvimento. Nos últimos três anos, a vida de Vanessa transformou-se num ir e vir constante entre a Quinta do Conde, onde mora, e os hospitais em Lisboa onde o filho é acompanhado em 16 especialidades diferentes, incluindo várias terapias, isto já sem falar dos internamentos e cirurgias.

"Nunca estamos preparados para isto, o ciclo da vida funciona ao contrário. É suposto os nossos filhos crescerem e ficarem cada vez mais autónomos. Adoro ser mãe, mas a Maternidade Atípica é muito pesada. Não vou pintar isto de uma maneira bonita porque não há nada de bonito para pintar. Cuidar é um ato de amor. Mas cuidar nestas circunstâncias é bem diferente. É uma sobrecarga constante, física e psicológica. É uma tarefa muito exigente, diria até sem limites. 24 sobre 24 horas, sem folgas, nem férias."

E, como se não bastasse, existem todas as outras dificuldades: a dificuldade em arranjar escolas que recebam o filho, a impossibilidade de encontrar um emprego onde possa faltar sempre que o filho precisa de ir a uma consulta, as burocracias para conseguir os apoios mínimos a que tem direito (foram quase três anos para conseguir uma coisa tão simples como um dístico para o carro!), as despesas enormes (só em gasolina e portagens, dá para imaginar?).

Que direitos deveria ter enquanto cuidadora? "Primeiro que tudo, que nos incluíssem na sociedade. Que tivéssemos acompanhamento permanente a partir do momento em que nos tornamos cuidadores, porque ninguém cuida de ninguém se não for cuidado", diz Vanessa.

Depois, "termos direito a ter uma carreira profissional, nem que seja a meio tempo. Não termos de anular os nossos sonhos, abdicar de tudo e mais alguma coisa para vivermos exclusivamente para isto". Ser mãe é bom, mas qualquer pessoa precisa de mais. "Podermos receber uma remuneração adequada e que supra todas as nossas necessidades enquanto cuidadores. Podermos descontar. Que sejam menos burocráticos, que não façam as pessoas esperar até desesperar, porque chega a ser sufocante. Implorar pelos nossos direitos é ridículo."

"Estou farta de passar o meu tempo todo em consultas”, admite. “É muito frustrante para o meu filho, mas também é para mim. Há uma angústia enorme de querer ajudá-lo e não conseguir, a única coisa que posso fazer é estar com ele. E depois há um cansaço enorme. Já não sou a mesma pessoa”. E como fica o filho mais velho? “Também está a ser prejudicado. Não tenho disponibilidade e cabeça para ele."

"Os pais que são cuidadores de filhos com deficiência são verdadeiros super-heróis", diz Palmira Martins. "Esses são os únicos que praticamente não têm escolha." "É quase como se fosse uma sentença", acrescenta a psicóloga Catarina Graça. Muitas vezes, os filhos têm longas vidas pela frente. E o problema só se vai agravando à medida que eles vão crescendo. Não há qualquer luz ao fundo do túnel. Pelo contrário: "Os pais são constantemente assaltados pelo medo: se me acontece alguma coisa, quem vai cuidar do meu filho?" Estes são, diz a psicóloga, geralmente os casos-limite. "A pessoa esquece-se de cuidar de si mesma. Deixa-se ficar para o fim. Por se chegar ao limite acaba-se por fazer e dizer coisas que não se quer. Os pais cuidadores deveriam ter muito mais apoio do que têm."

"Já não posso ver hospitais", desabafa Vanessa. "As pessoas dizem que não trabalho. Mas já trabalhei e era um trabalho pesado, numa fábrica, mas isto é muito pior”. O sonho de vanessa era ter uma rotina normal, com trabalho - casa, ir ao parque aos fins-de-semana, jantar com as amigas de vez em quando. Mas “isto é mais pesado do que um trabalho porque é impossível desligar, mesmo quando tentas descansar a cabeça está sempre lá."

Estatuto do Cuidador Informal: é importante, mas é só "um primeiro passo"

Cuidadora na família e cuidadora também profissional, uma vez que trabalha num lar, Liliana Gonçalves percebeu muito cedo a importância de haver um reconhecimento legal dos cuidadores. Em 2016, juntou-se ao movimento para angariar 14 mil assinaturas numa petição. Em 2018, foi criada a Associação Nacional de Cuidadores Informais que, com outras associações que foram surgindo no país, conduziu a luta pela criação do Estatuto do Cuidador Informal: "Reunimos com os partidos políticos, convocámos a comunicação social e até fizemos uma manifestação. Ao princípio ninguém nos levava muito a sério, mas acabámos por pôr o tema na agenda política".

O Estatuto do Cuidador Informal foi, finalmente, aprovado em setembro de 2019. "Não é o estatuto que desejávamos, mas é um primeiro passo", afirma Liliana.

Essa é também a expressão usada pela jurista Miriam Rocha, que diz que o estatuto é "um primeiro passo", dado "com muitos atrasos e constrangimentos": "Nós assumimos desde sempre, enquanto comunidade, o dever de cuidar dos outros. O que o estatuto procura fazer é, por um lado, reconhecer o papel social do cuidador, atribuindo-lhe direitos, e, por outro lado, reconhecendo a necessidade e a continuidade dos cuidados, estabelecer os deveres em relação à pessoa cuidada. Para garantir a qualidade dos cuidados prestados e também para que os cuidadores possam fazê-lo com condições e com recursos", explica a docente da Faculdade de Direito da Universidade do Minho e investigadora do JusGov.

Uma coisa boa, admite Palmira Martins, é "essa capacidade de distinguir o trigo do joio e de exigir uma responsabilização dos cuidadores". Se a pessoa tem o estatuto tem o dever legal de cuidar - e aí vai ter de ser chamada à atenção se abandonar um idoso no hospital ou se não assegurar o bem-estar da pessoa cuidada.

O essencial a saber sobre o Estatuto de Cuidador Informal é isto:

  • A pessoa cuidada tem de receber um complemento por dependência (de 1º ou 2º grau) ou um subsídio por assistência de terceira pessoa. Se não, não pode ter um cuidador informal.
  • A lei permite que seja considerado cuidador informal o cônjuge da pessoa dependente ou o unido de facto, assim como um parente ou afim (familiar do cônjuge) até ao quarto grau (primo, tio-avô, sobrinho-neto). Não poderá ser, por exemplo, um vizinho ou um amigo que viva em economia comum com a pessoa cuidada.
  • É considerado cuidador informal principal alguém que viva com a pessoa dependente e dela cuide de forma permanente. É cuidador não principal se a acompanhar regularmente, mas não de modo permanente.
  • Os cuidadores principais não podem ter remuneração oriunda de uma atividade profissional ou pelos “serviços” que prestam ao familiar. Mas podem ter direito a um subsídio.
  • Não é possível acumular este subsídio com subsídio de desemprego ou de doença ou pensões de velhice.
  • Para a atribuição do subsídio de apoio ao cuidador informal principal, o rendimento relevante do seu agregado familiar tem de ser inferior 624,56 euros (1,3 vezes o indexante dos apoios sociais (IAS) em vigor, ou seja: 480,43 x 1,3). São também tidos em conta outros fatores, como por exemplo se o cuidador principal tem bens imóveis.
  • O montante máximo do subsídio corresponde ao valor do IAS, que este ano é 480,43 euros.
  • O cuidador informal tem direito a ser acompanhado e a receber formação para prestar os cuidados, assim como informação por parte de profissionais das áreas da saúde e da Segurança Social.
  • Tem também direito a receber apoio psicológico.
  • E ainda tem direito a períodos de descanso, por exemplo através do acesso aos serviços de apoio domiciliário ou ao acolhimento da pessoa cuidada em regime de internamento.
  • Os cuidadores não principais terão direito a conciliar a prestação de cuidados com a vida profissional, em termos ainda a definir.
  • A lei prevê a criação de um Plano de Intervenção Específico (PIE), que define as necessidades de saúde e Segurança Social da pessoa cuidada, tendo em conta o diagnóstico dos profissionais.
  • O cuidador informal tem o dever de garantir o acompanhamento necessário ao bem-estar global da pessoa cuidada, prestar-lhe apoio e cuidados em articulação e com orientação de profissionais da área da saúde e pedir apoio no âmbito social, sempre que necessário.

"O que está previsto no estatuto está certo. Podia ser melhorado, claro, mas o essencial está lá. Só precisa é de ser implementado, porque algumas coisas não estão regulamentadas e outras não funcionam", critica Palmira Martins. Primeiro que tudo, "só para pedir o estatuto ou para pedir o subsídio é todo um filme", diz a assistente social. A burocracia é imensa e os serviços não facilitam. "As pessoas precisam de ajuda só para conseguirem ultrapassar esta barreira".

Depois de conseguir o estatuto, o que se tem? Um subsídio que não substitui um ordenado e a promessa de apoios que nem sempre chegam. "Uma pessoa não pode deixar de trabalhar para cuidar porque o dinheiro do subsídio não chega. Não chega para viver, quanto mais para fazer frente aos custos que se têm com o cuidado: terapias, transportes, medicação, fraldas, poliésteres, camas, cadeiras, eletricidade para máquinas que sejam necessárias..." Além disso, "falta apoio psicológico, falta a efetiva formação e capacitação dos cuidadores, falta a efetivação do descanso do cuidador, feito como deve ser, são poucos os que são acompanhados pela Segurança Social", criticam Palmira Martins e Liliana Gonçalves. Falta, no fundo, a compreensão do que é a situação individual daquele cuidador e respostas às suas dificuldades reais.

Os cuidadores informais "fazem este trabalho gratuitamente e com grandes esforços, e até riscos - para a sua saúde mental e física, porque o cuidado intensivo de outra pessoa é um trabalho muito pesado; para a sua vida laboral, porque é difícil conciliar, acabando por tantas vezes deixar os empregos, com consequências do ponto de vista financeiro, porque ficam muitas vezes na dependência da ajuda de outro, e para o futuro (porque isto afeta a sua pensão de velhice)", explica Miriam Rocha. "O Estatuto tenta resolver em parte estas questões, dando acesso a prestações da segurança social, mas fica aquém do objetivo de reconhecer o trabalho social. É limitado ao nível monetário, uma vez que a média não chega aos 300 euros e porque está sujeito à condição de recursos. Ou seja, o Estado desenhou este apoio como um apoio de solidariedade para pessoas em situação de pobreza e não para recompensar efetivamente o trabalho prestado."

De acordo com os dados divulgados em novembro do ano passado, em Portugal existem cerca de 11 mil cuidadores informais reconhecidos, mas apenas 2.689 têm subsídio atribuído. "A condição de recursos tem um balizamento muito baixo e muitos cuidadores ficam de fora", justificou na altura Helena Nogueira, técnica do Instituto da Segurança Social. "Não tem sido um processo fácil. Continuamos a trabalhar na simplificação. É uma aprendizagem contínua. É uma medida social recente, que carece de amadurecimento e de tempo para podermos continuar esta caminhada", disse a responsável sobre a medida publicada em 2019 e que, após um projeto-piloto em 30 concelhos, foi alargada no início de 2022 a todo o território continental.

E é por isso que já existe uma nova petição pedindo alterações ao estatuto. Pedem, por exemplo, que o cuidador não principal tenha direito a dias de baixa, remunerados, para assistência à família. E que em vez de termos cuidador informal principal e não principal se passe para cuidador a tempo completo ou parcial - permitindo assim que duas pessoas que trabalham se revezem para cuidar de alguém.

Para quando a conciliação entre o cuidado e o trabalho?

Rosa teve sarampo aos quatro anos. Da doença resultou uma encefalite e, como consequência, uma série de outros problemas. Rosa tem hoje 58 anos. Nunca foi autónoma. “Morávamos na Guarda, os meus pais eram professores. Viemos para Lisboa por causa da Rosa, porque era aqui que estava o neurologista e porque aqui podia ser mais bem acompanhada”, conta a irmã Manuela Gil, dois anos mais velha. Rosa andou no Colégio Claraparede até aos 18 anos e melhorou muito. Pouco depois, passou a fazer voluntariado num centro paroquial, é a sua ocupação diária. “Fisicamente é uma pessoa escorreita, a deficiência é sobretudo mental. Não conhece o dinheiro, por exemplo, não sabe apanhar um transporte público, precisa de orientação para escolher a roupa, não consegue tomar decisões. Não pode ficar sozinha.”

“Lá em casa sempre foi tudo em função da Rosa. Quando eu era miúda, na minha cabeça sempre esteve claro: a Rosa vai ser assim para sempre. E eu sabia que, mais tarde ou mais cedo, teria de ser eu a assumir essa responsabilidade." Quando os pais começaram a envelhecer, Manuela assumiu o cuidado da irmã. "Quando penso em alguma coisa, uma saída, as férias, o que seja, penso sempre e então a Rosa, como vai ser? Foi sempre assim, nunca foi de outra forma.”

Depois, aos poucos, Manuela passou a assumir a responsabilidade também pelo pai, que, entretanto, já faleceu, e pela mãe, que tem agora 90 anos e que há cinco começou a revelar os primeiros sintomas de Alzheimer. “A Rosa mora com a minha mãe, eu e o meu marido moramos muito perto”, conta Manuela, que tem 60 e é professora de português. “Tenho de me dividir, mas é muito complicado.” Manuela admite que, felizmente, a família tem possibilidades para contratar pessoas que ajudam a cuidar da mãe durante o dia e à noite. Mas, mesmo assim, é ela que tem de estar lá nos dias e nas noites de folga e nas férias e, no dia-a-dia, todos os dias, vai lá a casa, está com a mãe e a irmã, é ela que tem de organizar tudo e levar ao médico e responder a emergências e preocupar-se a tempo inteiro. O dinheiro ajuda, mas não é tudo.

“Na pandemia fiquei três meses sozinha, sem ajuda, com duas casas montadas, era tudo eu. Em 2021 a minha mãe caiu, fraturou o ombro e o colo do fémur. Foi muito complicado”, recorda. Nessa altura, teve de meter atestado para conseguir cuidar da mãe.  “Em quase 38 anos de carreira, nunca tinha metido um atestado." O que Manuela Gil queria mesmo era poder ter um horário reduzido sem ter penalizações no salário nem no tempo de serviço. “Estou muito cansada. Houve uma altura que tive de recorrer a uma ajuda psiquiátrica e tomar medicação, porque já não conseguia”, conta. "Este ano, tenho um horário arrumado e a segunda-feira livre para poder estar com a minha mãe quando as pessoas que tomam conta dela estão de folga. Já tenho o cartão de cuidadora informal não principal, mas até agora isso não me dá qualquer benefício em termos de conciliação da vida profissional com os cuidados a prestar. Até a legislação estar pronta vou sempre depender da boa vontade da direção da escola.”

Cuidar é um trabalho - que tem um valor económico e, por isso, também deve ser pago

A tendência é para que o número de cuidadores - formais e informais - aumente: segundo as projeções das Nações Unidas, cerca de 35% da população portuguesa terá 65 ou mais anos em 2050. Por isso, é legítimo perguntar: quem vai cuidar destas pessoas?

"Historicamente a assistência era uma incumbência das famílias (e continua a ser) e dentro destas cabe geralmente às mulheres", confirma a jurista Miriam Rocha. De acordo com o relatório do grupo de trabalho para o Estatuto do Cuidador Informal, 83% dos pedidos para estatuto foram feitos por mulheres. Os dados do relatório Eurocarers garantem igualmente que mais de 60% dos cuidadores informais são mulheres, com uma média de idade de 55 anos - frequentemente entre os 45 e os 75 anos - e que tentam conciliar esta obrigação com o emprego. Apenas cerca de 25% dos cuidadores o são a tempo inteiro.

"Há uma diferença etária muito reduzida entre cuidadores e pessoas cuidadas", destacou Helena Nogueira no 4.º Encontro Nacional de Cuidadores Informais, apontando para 60 anos a idade média de quem precisa de cuidados informais em Portugal. "Percebemos que temos muitas pessoas idosas a cuidar de pessoas idosas", acrescentou. Da análise feita pela Segurança Social, sobressaem "dados preocupantes sobre a sobrecarga dos cuidadores", avançou Helena Nogueira, revelando que 30% denotam sobrecarga intensa.

No entanto, seja no caso das crianças seja com idosos ou outros familiares que precisam de assistência, “partimos do princípio de que o trabalho dos cuidados familiares não é trabalho que realmente interesse, mesmo que seja essencial para a dignidade e bem-estar dos idosos e dos doentes e para o próprio desenvolvimento cerebral dos jovens”, acusa Anne-Marie Slaughter, autora do livro "Uma Questão em Aberto" (2016), que aborda os novos desafios do mundo do trabalho sobretudo para as mulheres.

"É um trabalho que não é valorizado porque sempre foi assegurado de forma gratuita pelas mulheres, era dado como adquirido, como algo que fazia parte das suas obrigações", explica Miriam Rocha. Mas, neste momento, já não é assim. Trazer os homens para o cuidado no seio familiar, diminuindo as desigualdades de género, e tentar estabelecer uma valorização financeira de um trabalho que até aqui não era remunerado (imaginando, por exemplo, se este trabalho não fosse feito por um familiar quanto é que teríamos de pagar a um cuidador formal?) são dois passos essenciais, diz a jurista. O reconhecimento deste trabalho tem vindo a crescer - e isso é muito visível no caso do cuidado dos recém-nascidos, com licenças pagas, mas ainda não acontece no caso de outros dependentes, por doença ou incapacidade.

É um caminho. "Tem havido uma consciencialização cada vez maior da importância deste trabalho e também do valor gerado por esse cuidado. Os cuidadores estão a gerar enormes ganhos e benefícios para a comunidade, e consequentemente para o Estado. Porque se alguém não tiver amparo, vai ter de ser o Estado a assumir essa responsabilidade", considera Miriam Rocha.

"O desafio que temos é imenso. Por um lado, o tipo de organização dos cuidados que herdámos do passado já não funciona do mesmo modo, nem queremos que se perpetuem, no futuro as suas divisões e hierarquias de género e de classe. Por outro, a mercantilização neoliberal do cuidado, que tenta aproveitar estas lacunas para criar nichos de mercado, nomeadamente através da chamada ‘economia grisalha’ ou da ‘indústria do bem-estar’, não constitui uma saída democrática para esta crise dos cuidados, porque não permite um acesso universal às infraestruturas de cuidados de que todos precisamos", afirmam os investigadores José Soeiro, Mafalda Araújo e Sofia Figueiredo, autores do livro "Cuidar de Quem Cuida" (2020).

Se estes serviços fossem realizados no plano formal da economia, qual seria o seu valor económico? Calcula-se que representaria mais de 4 mil milhões de euros anuais, o equivalente a 333 milhões de euros por mês. Este cálculo, sublinham os autores, permite realçar um ponto importante: “O facto de os cuidadores estarem, pelo menos parcialmente, a operar em substituição do Estado, prestando gratuitamente um serviço cuja responsabilidade deveria ser muito mais partilhada pelo conjunto da sociedade”.

"Fomos ao nosso limite, em todos os sentidos: físico, psicológico, financeiro"

Qualquer casal sabe como as prioridades mudam a partir do momento em que os filhos nascem. Para João e Cristina isso também aconteceu, mas de uma maneira extrema. A Sofia nasceu a 17 de junho de 2004. “Estava tudo bem e depois correu tudo mal.” “A Sofia apanhou uma septicemia [inflamação sistémica devido a uma infeção causada quase sempre por bactérias] a seguir ao parto, ainda no hospital. Só 28 horas depois, quando a obstetra foi vê-la ao quarto é que percebeu que a nossa filha não estava nada bem. Foi levada de urgência para neonatologia e o quadro era gravíssimo. Teve paragem multiorgânica, teve sequelas enormes, paralisia cerebral e uma série de outras situações muito complicadas. Os médicos disseram-nos que ela teria três ou quatro anos de vida. E nós decidimos que iríamos fazer tudo o que pudéssemos por ela, fosse o tempo que fosse. Com muito amor e muita entrega nossa, demos-lhe onze anos e meio de vida, só que isso custou-nos bastante caro”, conta o pai.

A entrega foi total. A menina precisava de cuidados permanentes. Comida, banho, várias consultas, terapias - “Foi como ter um bebé durante 11 anos e meio, mas pior, porque o corpo cresceu e fazia muita força, era muito difícil", recorda João Raposo. Os pais praticamente não dormiam. “Tínhamos um hospital montado em casa, máquinas a apitar, oxigénio. E depois as consultas, as terapias, tudo o que pudesse ajudar nós fazíamos. Íamos aprendendo umas coisas com os médicos e já a conhecíamos muito bem, sabíamos o que ela gostava, fazíamos tudo.”

Nos últimos dois anos de vida da filha, estiveram os dois a tempo inteiro a cuidar dela. “Tentávamos revezar-nos, mas era muito difícil.” Com um negócio de construção de móveis de cozinha, o casal geria três lojas e vários funcionários. Uma a seguir à outra, as lojas foram fechadas. "A Sofia piorou bastante e nós ficámos os dois, 24 sobre 24 horas a tomar conta da nossa filha. O cansaço começou a tomar conta de nós. Fomos ao nosso limite, em todos os sentidos: físico, psicológico, financeiro. Gastámos todo o dinheiro que tínhamos. Gastávamos com ela dois mil a três mil euros por mês”, garante João Raposo, que recorda o apoio de amigos e de empresas. “Houve uma fase em que ou pagava impostos ou pagava os tratamentos. A escolha é óbvia. Então o Estado bloqueou-nos a vida, penhorou contas, é uma pescadinha de rabo na boca.”

Nos momentos em que se sentia à beira de um esgotamento, pegava na moto e atravessava a Serra da Arrábida, de um lado ao outro, a gritar e a chorar. “Depois, voltava para casa e continuava, vamos à luta.” João não se arrepende de nada.

João e Cristina ficaram de rastos. “Quando a Sofia faleceu em 2016 eu e a minha mulher estivemos duas semanas em que o corpo praticamente desligou, ficámos duas semanas a dormir”, recorda. Depois de o corpo recuperar, veio o choque emocional. “Naqueles períodos a seguir ao falecimento da Sofia praticamente desistimos. Deixámos a situação nas finanças agravar-se, não resolvemos nada. Não conseguia dormir. Percebi que precisava de ajuda psiquiátrica. Tem sido um processo. Ao fim de um ano começámos a retomar a nossa vida. Tivemos de vender a nossa casa para pagar tudo o que devíamos. Voltei para casa dos meus pais. E começámos do zero. Um dia a seguir ao outro.”

O que os cuidadores pedem: "Um pouco de dignidade"

Boa tarde, eu sou a Joana e cuido do meu pai que teve um AVC há quatro anos. Ele não se consegue mover sozinho, tenho de lhe dar banho e de fazer tudo. Estou muito cansada. Eu sou o João e cuido da minha mãe que tem demência, tenho de trabalhar e não tenho dinheiro para pagar a ninguém que tome conta dela. Estou muito cansado. Eu sou a Cláudia e tomo conta do meu marido. Ele era uma pessoa incrível, um ótimo pai, um ótimo profissional. Fomos muitos felizes, agora ele não me conhece, não consegue conversar, às vezes nem sabe quem é. Estou muito cansada. Eu sou a Catarina e tomo conta da minha filha que tem autismo profundo. Ela tem 18 anos e depende completamente de mim. O que será dela se me acontece alguma coisa? Estou muito cansada.

Num dia frio de fevereiro, reúnem-se numa sala em Lisboa mais de 20 cuidadores informais. Homens e mulheres. Com 30 e poucos e com 70 e muitos anos. A conversa é orientada por duas psicólogas do Centro de Recursos e (In)Formação a Prestadores de Cuidados Informais, da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Para quem ali foi, aquelas quase duas horas servem quase como um grupo de autoajuda. "É bom poder desabafar e sentir que não se está sozinho", conclui uma das participantes. Partilham-se histórias, derramam-se lágrimas, estendem-se mãos. Cada caso tem a sua especificidade, mas há traços comuns: o desejo de cuidar do familiar, mas, ao mesmo tempo, o confronto com as dificuldades reais (o aumento de encargos financeiros, a necessidade de trabalhar, as dificuldades no cuidar) e o cansaço, físico e psicológico - um cansaço extremo acompanhado de uma enorme solidão.

Um estudo recente realizado pela Merck, com o apoio do Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais, revelou que 83,3% dos cuidadores informais admitem ter-se sentido em estado de ‘burnout’ e que 77,9% reconhece que precisa de apoio psicológico, mas menos de metade destes procura e usufrui desta ajuda. O inquérito mostra ainda que 78,5% consideram que o seu estado de saúde mental influência o desempenho do seu papel de cuidador informal e cerca de metade diz não ser capaz de rir e ver o lado positivo como antes.

"Na tentativa de cuidar daqueles que são os nossos próximos, às vezes é difícil fazer uma análise mais racional, há um atropelamento da vida", explica a psicóloga Catarina Graça. "É uma situação que afeta a vida pessoal, social e profissional daquele que cuida. Há uma degradação muito constante, o cansaço é psicológico e físico. Até que se chega a um momento em que se atinge um cansaço extremo. Já não se consegue cuidar mais porque se está esgotado. É preciso intervir antes, não deixar que se chegue ao limite", diz. É por isso que é tão importante que haja um acompanhamento do cuidador.

O cuidar começa por ser um ato de amor, mas à medida que o tempo passa e que o cansaço se acentua, é normal que se torne um fardo. "Tem de se desmistificar um bocadinho esta ideia de que temos de cuidar e fazer tudo sozinhos", diz a psicóloga. Não se está sozinho. Seria importante ter uma boa rede de apoio a nível familiar - ter irmãos, por exemplo. Mas se não se tem, é preciso procurar ajuda, por exemplo ajuda técnica, procurar os apoios e as soluções que existem no sistema."

Rita Tomás, técnica da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, sublinha, por um lado, a importância da formação dada aos cuidadores - em áreas como os cuidados de higiene, a nutrição, a prevenção de acidentes, a mobilidade e o posicionamento das pessoas cuidadas - que contribuem para a sua capacitação e também empoderamento; e, por outro lado, a criação de respostas para o autocuidado dos cuidadores: "Os tempos de descanso, as férias e folgas que eles podem gozar sem se sentirem culpados, sabendo que os seus familiares estão em boas mãos. A existência de uma rede de apoio, pessoas com quem eles podem falar, a quem podem pedir ajuda - durante o processo e depois, é preciso não esquecer os lutos. Os pequenos miminhos de que todas as pessoas precisam".

João Raposo tem agora 51 anos. Já não cuida da filha, mas continua a ser um cuidador, juntou-se à Associação Nacional de Cuidadores Informais, lutou pelo estatuto que já não chegou a tempo para ele, mas que sabe que pode fazer a diferença para outros, e dá o seu testemunho a quem precise de ouvir: sim, é difícil, mas não estás sozinho, nós estamos aqui. “Cuidar de filhos 24 horas por dia não é fácil, e há pais que fazem isto uma vida inteira. Porque os filhos crescem. São muitos anos sem ter uma vida própria. Uma pessoa anula-se completamente. Uma coisa que vimos muito nos hospitais é que muitos casais se separam, vimos muitas mães sozinhas, sobretudo mães. E isso é péssimo porque os cuidadores já se sentem muito sozinhos. Toda a gente tem a sua vida. E à medida que o tempo passa toda a gente se afasta."

“Os cuidadores só pedem um pouco mais de dignidade”, diz João Raposo. “Um cartão só não basta. Há um estatuto e é um princípio, mas está tudo por fazer, é uma mão cheia de nada” É preciso reduzir as burocracias, dar informação e facilitar a vida às pessoas que não podem perder o seu tempo a lutar por uma cama articulada ou por uma terapia importante. Para além de um subsídio decente, o que todos os cuidadores pedem é apoio e psicológico e descanso - isto é o essencial, o que todos os cuidadores deveriam ter, diz Catarina Malheiro. “Ser cuidador é um trabalho a tempo inteiro, 24 horas por dia. Não podemos ir jantar fora, ir às compras. Antes de tudo isto acontecer, gostava de ir dar um passeio à beira-mar. Agora, nem consigo ir a um centro comercial comprar roupa para as minhas filhas, quanto mais ter tempo para mim. Eu só gostaria de conseguir desligar.”

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