O Psicólogo Responde é uma rubrica sobre saúde mental para ler todas as semanas. Tem comentários ou sugestões? Escreva para opsicologoresponde@cnnportugal.pt
Sim, existe e devemos ser totalmente claros na resposta a esta importante pergunta. Viver em situação de pobreza e de exclusão, tantas vezes a ela associada, é um dos principais determinantes de doença, incluindo doenças mentais. Nesse sentido, a vulnerabilidade económica provoca stresse e sofrimento psicológico e afecta a saúde mental e o bem-estar.
Esta associação, que intuímos nas nossas relações e no nosso dia-a-dia, está hoje amplamente documentada por investigação que, inclusivamente, estuda impactos ao longo da vida e não apenas no presente. É por isso possível afirmar que o bem-estar financeiro, ou seja, a percepção de que temos condições materiais para satisfazer as principais necessidades e cumprir as principais aspirações, é um importantíssimo indicador de bem-estar. Já a sua ausência associa-se a problemas de saúde mental como a ansiedade, a depressão, o stresse, o uso abusivo de substâncias, problemas de sono e alimentares ou o isolamento.
Ter baixos recursos financeiros está também ligado a níveis menores de literacia em saúde mental. Resulta, também, em maior dificuldade em ter tempos de descanso, actividade física ou de lazer e, portanto, em menos oportunidades de autocuidado. Quem vive com dificuldades económicas tende a ter maior impulsividade, mais dificuldade em planear o futuro e a cometer mais erros, porque da escassez de recursos resulta um efeito túnel (concentração quase exclusiva numa necessidade premente que pode ser, por exemplo, o pagamento de uma conta, de uma dívida ou de uma renda) e, logo, menor disponibilidade emocional e cognitiva para a tomada de decisões e para a gestão do dia-a-dia.
Não se podendo dizer que viver em situação de vulnerabilidade económica resulta automaticamente no desenvolvimento de doença mental, importa ter presente que esta condição é um factor de risco. Como é, até, um dos factores de risco de suicídio.
Importa, porém, sublinhar que esta relação não é unidireccional, antes bidireccional. Ou seja, conforme a vulnerabilidade económica pode potenciar problemas de saúde mental, também problemas de saúde mental, como o stresse, a ansiedade ou a depressão, podem conduzir a uma maior probabilidade de se viverem situações de precariedade, desemprego ou pobreza. Nesse sentido, devemos ter presente a existência de uma relação cíclica entre estas duas dimensões de vida das pessoas. Quando uma piora a probabilidade da outra piorar aumenta.
Imaginemos uma corrida com outra pessoa e com diferentes séries em que se chegarmos em primeiro, partimos 100 metros mais à frente e se chegarmos em segundo 100 metros mais atrás. Imaginemos ainda alguém que parte atrás e perde a primeira série. Na série seguinte parte ainda mais atrás e a probabilidade de perder aumenta, aumentando também a possibilidade de na série a seguir partir ainda mais atrás e de voltar a perder. É um pouco assim com este ciclo dado que é ainda mais difícil a quem vive com vulnerabilidades económicas recuperar de um problema de saúde mental e a quem vive com problemas de saúde mental sair de uma situação de vulnerabilidade económica.
É por tudo isto que investir na promoção da saúde e da saúde mental também é garantir um mais eficaz combate à pobreza e à exclusão.
Sugestões
1. Se vive em situação de pobreza ou de exclusão recuse, activamente, sentir-se (ou que o façam sentir) culpado por essa circunstância. A pobreza não resulta, na grande maioria das situações, de erros ou falhas pessoais, mas de circunstâncias sociais que a determinam.
2. Partilhe as suas preocupações e sentimentos. Partilhar as nossas preocupações com alguém em quem confiemos, incluindo as financeiras, pode fazer-nos sentir menos sós, mais apoiados e, até, ajudar-nos a encontrar novas estratégias e formas de resolução de problemas ou a lidar melhor com as nossas preocupações e sentimentos.
A pobreza, colocando em perigo maioritariamente a saúde e bem-estar das pessoas que a vivem, afecta todas pessoas, venham ou não a viver nessa condição, pelo que o seu combate deve ser abraçado por todas as pessoas.
3. Se estiver numa situação em que sente que necessita de apoio psicológico solicite-o junto do centro de saúde ou da unidade de saúde mais próxima de si. Pode, também, em situação de crise, contactar o serviço de aconselhamento psicológica do SNS24 (808 24 24 24) a qualquer hora e em qualquer dia da semana (chamada gratuita) e em situação de emergência o INEM (112).
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