O ChatGPT já pode gerir os seus investimentos. Mas será isto uma boa ideia?

20 mai 2023, 15:00
Wall Street

O mundo da gestão de ativos está "a andar para a frente" e ferramentas como o ChatGPT já conseguem criar portfólios de investimento capazes de superar os gestores de conta. O potencial está lá, mas é preciso "alguma cautela"

Um portfólio fictício criado pelo ChatGPT teve um melhor desempenho do que alguns dos principais fundos de investimento do Reino Unido. Em causa está uma experiência em que analistas pediram ao ChatGPT para criar um fundo de mais de 30 ações, sendo que este valorizou 4,9% nas oito semanas seguintes. Em comparação, os 10 fundos mais populares da plataforma britânica Interactive Investors caíram em média 0,8%, relatou o Financial Times.

O projeto colocou os gestores de fundo em alerta para as potencialidades da inteligência artificial (IA), até porque este não é um caso isolado. Num outro artigo, da Investopedia, a IA da Microsoft (alimentada pelo ChatGPT) competiu contra o Bard, a IA da Google. A missão: cada um escolhe duas ações e acompanha a sua evolução ao longo de três semanas, em comparação com as escolhas de um humano.

Embora as bases de dados das respetivas inteligências artificiais só tenham dados até 2021, o desempenho do Bard foi o que apresentou melhores resultados. Todas as ações aumentaram em valor, mas os ganhos combinados das ações escolhidas pelo Bard ascenderam a 5,15% em três semanas, superando a IA da Microsoft e o oponente humano, e superando ainda o S&P 500.

Superar gestores não é difícil

A verdade é que a inteligência artificial não é, necessariamente, uma novidade nos mercados financeiros, já que a maioria das transações são feitas automaticamente por algoritmos. No entanto, a massificação da IA está a mudar o paradigma.

Ricardo Evangelista, analista de mercados financeiros, explica que ferramentas como o ChatGPT contam com um vocabulário muito grande e diverso, podendo passar pela linguagem humana (como o português ou inglês), mas também pelo código de programação. Uma das formas que a IA tem para escolher determinadas ações assenta na semântica, fazendo o rastreio dos média e, dependendo do resultado e em função do algoritmo, tomando decisões de negociação, explica.

Este tipo de serviços já se fazem há muito tempo, garante Ricardo Evangelista, mas ao contrário das ferramentas de outrora, que eram "muito sofisticadas e não estavam disponíveis para a generalidade do público", agora é, "praticamente grátis".

O analista considera que ferramentas como o ChatGPT podem acertar algumas vezes nas melhores ações a comprar, de forma a ter lucro dentro de um ano, por exemplo. No entanto, o analista considera que tal poderá ser um pouco arriscado.

Afinal de contas, continua Evangelista, "já foram feitas várias experiências em que se utilizaram chimpanzés, e estes escolheram melhores portfólios do que gestores de carteira profissionais. Escolhendo ao acaso, claro". Como tal, "há que tomar isto com alguma cautela", alerta o analista, embora admita não ter dúvidas de que a IA vai ter um papel muito importante, estando cada vez mais presente e substituindo as pessoas em algumas funções. No entanto, o analista considera que ainda estamos numa fase inicial.

Uma questão de parâmetros

Para Filipe Garcia, por sua vez, "qualquer trader é muito mais lento a reagir do que as máquinas, que estão programadas para ler o número, interpretar, olhar para uma outra série de variáveis e atuar diretamente no mercado”, explica Filipe Garcia.

Agora, com as ferramentas a mudar, o economista esclarece que a recriação e gestão de portfólios se prende com uma questão de definir parâmetros, sendo este o ponto que realmente interessa, na sua opinião. “O que é criar um portfólio melhor? É um que dá mais rentabilidade, mais rentabilidade por unidade de risco, menos volatilidade, menos volatilidade negativa?”. Neste sentido, o economista garante que estes devem ser os objetivos definidos previamente.

Filipe Garcia admite que, por vezes, o ChatGPT consegue descrever e resumir assuntos até com mais qualidade do que alguém com experiência, pelo que a IA irá colocar em questão todas as atividades e profissões. Contudo, no que toca ao desempenho na criação e gestão de portfólios, o economista refere que “só olhando para os estudos”, já que existem gestores que podem ser melhores numa determinada janela temporal (investimento a 10 anos, por exemplo), ou outros melhores noutra.

Depende muito da parametrização, reitera Garcia, mas o economista defende que haverá a hipótese de chegar a bons resultados depois de feita a devida parametrização de todas as variáveis, quanto possível. O economista vê a IA como mais uma ferramenta, “da mesma maneira que utilizar uma folha de Excel nos permite tomar, às vezes, decisões melhores do que se andarmos a fazer tudo com papel e caneta”, compara.

Garcia também considera que este tipo de ferramentas ainda estão numa fase inicial, mas como as outras inovações tecnológicas, "vai haver vencedores e perdedores, vai haver profissões que vão ser destruídas e vai haver criação de outras. Isto é o mundo a andar para a frente e na gestão de ativos é a mesma coisa".

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