Num total de dez demissões em nove meses, o Governo parece seguir um padrão de comunicação. Coincidência ou estratégia?
No Governo de António Costa parece haver horas para as demissões. Pelo menos a julgar pelas mais polémicas, todas oficializadas a horas tardias.
Os potenciais sucessores de Costa
Quando a ex-ministra da Saúde, Marta Temido, comunicou a sua demissão já passava das 01:00. Apontada pelo próprio António Costa como uma putativa sucessora no cargo de secretário-geral do PS, a governante acabou por não resistir a uma sucessão das polémicas que já transitavam do anterior Governo, e que tiveram o ponto mais baixo com a morte de uma grávida que foi transferida por haver falta de vagas na neonatologia do Hospital de Santa Maria.
Esse caso deixou Marta Temido sem “condições”, naquele que foi o primeiro de vários golpes no executivo. Com a ministra da Saúde caíram também António Lacerda Sales e Fátima Fonseca, que eram os secretários de Estado daquele ministério.
No caso do ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, a notícia soube-se já depois das 00:00. Também chegou a ser apontado como potencial sucessor de António Costa, mas uma série de polémicas, com ponto alto no caso do aeroporto, desgastaram a relação entre os governantes.
Defensor do projeto do Governo para a TAP desde o início, acaba por sair como vítima da empresa, depois do caso da polémica indemnização dada pela empresa a Alexandra Guerreiro, que veio a assumir o cargo de secretária de Estado do Tesouro, e que também acabou demitida.
A acompanhá-lo saíram também Hugo Mendes e Marina Gonçalves, secretários de Estado das Infraestruturas e da Habitação, respetivamente, sendo que a saída de ambos também foi conhecida pela mesma hora.
Os elefantes na sala
António Costa apelidou-o de "casinho", mas a polémica em torno do seu secretário de Estado Adjunto ainda deverá fazer correr muita tinta. Soube-se a 26 de outubro que Miguel Alves terá adiantado 300 mil euros para a construção de um pavilhão em Caminha na altura em que era presidente daquela autarquia. Só duas semanas depois, a 10 de outubro, e depois de muitos pedidos de esclarecimento, é que o governante se demitiu.
A oficialização aconteceu pouco depois das 19:00, depois de o Ministério Público ter acusado Miguel Alves do crime de prevaricação. "Face à acusação deduzida pelo Ministério Público, e mesmo não tendo conhecimento dos seus termos e pressupostos, entendo não estarem reunidas as condições que permitam a minha permanência no Governo de Portugal", disse governante. Algo que António Costa "percebeu bem".
Para a demissão de Alexandra Reis não foi preciso tanto tempo. Soube-se a 24 de dezembro do pagamento da indemnização de 500 mil euros, a secretária de Estado do Tesouro ainda deixou passar o Natal, mas o barulho em torno do caso foi ficando cada vez maior, levando à sua demissão. A 27 de dezembro o Ministério das Finanças anunciou a saída, num comunicado enviado por volta das 23:30.
"Solicitei hoje mesmo à Eng.ª Alexandra Reis que apresentasse o seu pedido de demissão como Secretária de Estado do Tesouro, o que foi por esta prontamente aceite", referia a nota assinada pelo ministro, Fernando Medina.
Polémica na Economia
As demissões aconteceram no Ministério da Economia e do Mar, mas foi o próprio primeiro-ministro a demitir os secretários de Estado da Economia e do Turismo. Embora não tenham sido esclarecidas as razões, sabe-se que havia divergências de fundo entre João Mendes e Rita Marques e o ministro que tutela a pasta, António Costa Silva.
Em causa terá estado uma medida defendida pelo ministro, a descida transversal do IRC, algo com que os secretários de Estado não concordaram, tendo mesmo contrariado António Costa Silva. As demissões foram conhecidas a meio da tarde de 29 de novembro.