Desde o anúncio da demissão, Governo fechou 12 acordos com impacto superior a 1,3 mil milhões de euros

ECO - Parceiro CNN Portugal , Joana Morais Fonseca e Salomé Pinto
8 dez 2023, 10:58
António Costa (António Pedro Santos/Lusa)

A legislatura, que deveria terminar em 2026, ficou pelo caminho. Desde então, o Executivo finalizou dossiês pendentes que terão um custo de mais de 1,3 mil milhões nos próximos anos.

Publicado o decreto de demissão pelo Presidente da República esta quinta-feira, o Governo, o último de António Costa, entra em modo de gestão, com poderes limitados. Mas antes disso, e no espaço de um mês desde que o primeiro-ministro apresentou a exoneração, o Executivo conseguiu fechar 12 acordos decisivos com vários setores da sociedade, nomeadamente com a Função Pública, que representam um custo de mais de 1,3 mil milhões de euros nos próximos anos. Resta saber se o futuro elenco governativo irá cumprir o que ficou gravado na pedra.

Foi precisamente há um mês, que, pela hora de almoço, António Costa falava ao país para comunicar que apresentava a demissão, na sequência da Operação Influencer, que investiga suspeitas nos negócios do lítio, hidrogénio verde e no centro de dados de Sines.

O terramoto político com epicentro no Governo – que conduziu, nomeadamente, à realização de buscas em São Bento, à casa do ex-ministro das Infraestruturas, João Galamba, e ao Ministério do Ambiente, bem como à detenção de Vítor Escária e de Diogo Lacerda Machado e à abertura de um inquérito autónomo ao chefe de Governo no Supremo Tribunal de Justiça – levou António Costa a considerar que já não tinha condições para chefiar o Executivo.

A legislatura deveria terminar em 2026, mas ficou pelo caminho e, desde então, o Governo tem vindo a fechar dossiês que estavam “pendurados”, com a campanha eleitoral na mira. Num mês, o Executivo fechou 12 acordos dos quais nove com impacto de, pelo menos, 1,28 mil milhões nos próximos anos. Sem surpresas, a maior fatura é com os aumentos salariais no Estado: são 847 milhões de euros, o que corresponde a 66% dos custos globais. Conheça os principais.

Governo aprova aumentos salariais de 52 euros e 3% na Função Pública para 2024

No rescaldo da crise política e horas antes de o Presidente da República comunicar ao país que iria dissolver a Assembleia da República e convocar eleições antecipadas, o Governo, aprovou, em Conselho de Ministros, as atualizações salariais para a Função Pública que vão entrar em vigor em 2024. Em causa estão aumentos que oscilam entre 52,63 euros até ordenados brutos mensais de 1.754,49 euros e 3% para remunerações superiores.

Tal como explicou o ECO, os aumentos nominais de 52,63 euros para remunerações até 1.754,49 euros correspondem a uma subida entre 6,8% e 3,1%, sendo que 22% ou 164 mil funcionários do total de 745 mil, e que estão na Base Remuneratória Única (vulgo salário mínimo do Estado), vão ter a atualização mais alta, de 6,8%, em termos percentuais. Estas subidas ficam, contudo, abaixo do reivindicado pelos sindicatos da Função Pública. Estes aumentos vão custar 847 milhões de euros aos cofres do Estado.

Novo sistema de avaliação avança já no ciclo avaliativo 2023/2024

O Governo estima gastar 150 milhões de euros por ano com a revisão do sistema de avaliação (SIADAP) da Função Pública que vai permitir que mais trabalhadores (60% em vez de 25%) progridam na carreira, com a correspondente valorização salarial, e com menos pontos (oito em vez de dez) já neste ciclo avaliativo 2023/2024, antecipando em um ano o que estava previsto.

A primeira fatura, de 98 milhões de euros, chega em 2025 e será referente ao atual período de avaliação, ainda bianual, mas que passará a ser anual. A partir de 2026, quando o novo SIADAP for totalmente implementado, abrangendo também os serviços e dirigentes e não apenas os trabalhadores, a despesa global irá ascender a 150 milhões de euros por ano.

O custo das medidas terá de ser suportado pelo futuro Executivo, e não o atual, mas a secretária de Estado da Administração Pública, Inês Ramires, afirmou, em meados de novembro, que “o Governo não está a dar um passo maior do que a perna” nem a tomar medidas que não tomaria sem eleições à vista. “Estamos a falar de passar para 2025, não estamos a falar de 2024. Considerar isto eleitoralista é desgarrado da realidade”, sublinhou.

Jackpot no acelerador de progressões com apenas seis pontos

O “acelerador de progressões” na Função Pública, que permite progredir na carreira a quem acumule apenas seis pontos, em vez dos atuais 10, desde que o trabalhador tenha sofrido os dois períodos de congelamento, vai abranger 350 mil trabalhadores e terá um impacto de mais de 128 milhões de euros. Neste mecanismo, destinado a compensar os funcionários públicos abrangidos pelos congelamentos, vão também ser abrangidos aqueles que trabalham nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde.

Esta medida incide sobre os períodos de congelamento que ocorreram entre 2005 e 2007 e entre 2011 e 2017, sendo que o objetivo é que os trabalhadores possam progredir com seis pontos na avaliação de desempenho (uma redução face aos dez atualmente exigidos).

Os trabalhadores que mudaram de carreira também vão beneficiar deste jackpot, como lhe chamou a Frente Comum, que ficou fora do acordo, assim como o pessoal dos hospitais EPE (entidades públicas empresariais).

O mecanismo aplica-se a partir de 2024, sendo que a “alteração do posicionamento remuneratório produz efeitos a 1 de janeiro do ano em que o trabalhador acumule o número de pontos necessários para a alteração obrigatória do posicionamento remuneratório”, segundo o Ministério da Presidência que tutela a Função Pública.

Técnicos superiores com salto adicional entre 52 e 210 euros e sem perda de pontos

Numa corrida contra o tempo, Governo e sindicatos fecharam o projeto de diploma que prevê uma valorização adicional dos cerca de 68 mil técnicos superiores do Estado, antes da publicação do decreto de demissão do Executivo, e que prevê um aumento extra entre 52 e 210 euros mensais.

Assim, e já a partir do próximo ano, 9,6 mil licenciados das carreiras gerais vão poder dar um salto remuneratório por via da redução do número de degraus que serão necessários percorrer para chegar ao topo. Esta valorização já não irá implicar a perda de pontos para efeitos de progressão como inicialmente tinha sido equacionado pelo Executivo.

Esta medida terá um impacto, no próximo ano, de 16,5 milhões de euros que, até 2030, irá chegar aos 90,3 milhões de euros. Se incluirmos as valorizações dos técnicos superiores especialistas do INE e das Finanças o custo global irá ascender aos 91 milhões de euros.

Em causa está a revisão da carreira geral de técnico superior da Administração Pública que reduz o número de etapas que terão de ser percorridas para chegar ao topo da carreira. “A tabela remuneratória dos técnicos superiores passa de 14 para 11 posições remuneratórias”, indicou Inês Ramires.

Com esta reformulação, é eliminada a primeira posição, que está no nível 12, com um ordenado de 1.122,84 euros, e que só serve para as situações transitórias de mobilidade intercarreiras. Na prática, os técnicos superiores licenciados já entram logo na segunda posição, de 1.333,35 euros, e que, no próximo ano, vai subir para 1.385,99 euros, pela atualização salarial.

Assim, “1.250 trabalhadores”, que estavam na primeira posição saltam, logo em 2025, para a segunda, o que dá um “aumento de cerca 210 euros”, porque os níveis remuneratórios avançam quatro degraus, do nível 12, com um vencimento de 1.122,84 euros, para o 16, com um salário de 1.333,35 euros.

Em pelo menos duas posições haverá também incrementos salariais na ordem dos 200 euros, por efeito da revisão da carreira. A nona posição, que está no nível 43, com um vencimento de 2.755,84 euros, passa para a oitava posição com um nível superior (46), que dá um ordenado de 2.916,89 euros. Trata-se de um aumento de 161 euros brutos por mês. Do mesmo modo, quem está na 13.ª posição, no nível 55, com um vencimento de 3.400,05 euros, passa para a 11.ª e última posição, no nível remuneratório 58, que corresponde a um ordenado de 3.561,11 euros brutos mensais. Isto significa um avanço de 161 euros.

Noutros casos, os aumentos serão entre 52 ou pouco mais de 100 euros, como é o caso dos trabalhadores que estão na terceira posição, no nível 20, com um ordenado de 1.543,88 euros, e que passam para o segundo patamar, no nível 21, com um vencimento de 1.596,52 euros, o que corresponde a um salto adicional de cerca de 52 euros. Já quem está na quarta posição, no nível 24, com um ganho mensal de 1.754,41 euros, passa para a terceira, mas o nível sobe para 26, com um ordenado de 1.859,67 euros, o que significa um aumento de 105 euros.

Técnicos superiores do INE e Finanças têm aumento extra com efeitos a janeiro

Nesse mesmo dia, o Executivo aprovou ainda um decreto-lei que prevê que os técnicos superiores do Instituto Nacional de Estatística (INE) e das Finanças tenham, ainda este ano, um aumento extraordinário de 52,64 euros brutos mensais com retroativos a 1 de janeiro.

Este diploma permite dar um salto extra na posição remuneratória em cada um dos 14 níveis existentes. Assim, o salário de entrada destes licenciados, que está nos 1.333,35 euros brutos mensais, vai subir 52,64 euros para 1.385,99 euros. Este aumento de cerca de 52 euros vai beneficiar os trabalhadores dos restantes patamares remuneratórios. Só na última posição, que está nos 3.775,83 euros, não haverá uma valorização salarial. Em declarações ao ECO, o secretário-geral da Federação de Sindicatos da Administração Pública (FESAP), José Abraão, adiantou que a medida vai beneficiar “cerca de 500 trabalhadores”.

Polícias municipais vão ter aumentos salariais de até 280 euros. PJ com suplemento de missão

A par destes, também os polícias municipais vão ter aumentos salariais, mas desta vez de até 280 euros, que incluem o pagamento de 52,63 euros mensais com retroativos a janeiro deste ano e um incremento adicional de até 228 euros, em 2024. Em termos médios globais, os ordenados desta carreira sobem cerca de 20%.

A medida, que foi conhecida na semana em que arrancou a discussão do OE2024 em sede da especialidade, vai abranger cerca de mil polícias municipais que existem no País, sendo que os encargos com as valorizações remuneratórias são da responsabilidade da Administração Local, isto é, das autarquias.

O Executivo aprovou também na semana passada um suplemento de missão para a Polícia Judiciária (PJ) que será pago em conjunto com o salário e, em alguns casos, pode representar um aumento de quase 700 euros por mês, de acordo com as contas do Executivo. A decisão causou desconforto nas forças de segurança, nomeadamente PSP e GNR.

Questionada sobre este desconforto, a ministra da Presidência afirmou, esta quinta-feira, no final do último Conselho de Ministros com o Governo em plenitude de funções, que este suplemento foi revisto entre “a ministra da Justiça e os sindicatos do setor”, mas sublinha, que, ao longo destes oito anos, o Executivo “reviu carreiras e melhorou as condições de todos os trabalhadores da Administração Pública” e que “essas revisões não acontecem todas em simultâneo”.

Além disso, Mariana Vieira da Silva, adianta que, na sequência da crise política, “procurou concluir processos na área da Administração Pública” e que a regulamentação do suplemento para a PJ era um dos processos “em curso”. Não obstante, a governante garante que nestes 8 anos, e nomeadamente no que concerne às forças de segurança, “foi possível fazer um significativo reforço dos salários”. E dado, que entra a partir de hoje, em gestão ” o que vier ser aprovado será pelo próximo Governo”, concluiu.

Governo cria nova carreira de técnicos auxiliares de saúde e chega a acordo com médicos

Pelo setor da Saúde, o Governo aprovou, a 23 de novembro, a nova carreira de técnico auxiliar de saúde (TAS), reivindicada há mais de uma década pelos sindicatos. A medida vai abranger mais de 24 mil assistentes operacionais do SNS que vão transitar para a nova carreira já no início do próximo ano e terá um custo de cerca de 23 milhões de euros, tal como revelou ao ECO o secretário-geral do SINTAP, José Abraão.

Em termos salariais, “a transição para a carreira de TAS, traduz-se num acréscimo salarial de cerca de 100 euros mensais, correspondente a um aumento de 13%”, segundo divulgou na altura o Ministério da Saúde.

E ainda na “reta final”, a tutela liderada por Manuel Pizarro conseguiu chegar a acordo intercalar com o Sindicato Independente dos Médicos (SIM) sobre a revisão salarial que vai vigorar no próximo ano, após 19 meses de negociações. Para o regime das 40 horas semanais (o mais comum na carreira médica), os médicos em início de carreira (os assistentes) vão ter um aumento de 14,6% em 2024, enquanto os assistentes graduados [a segunda categoria da carreira] terão um aumento de 12,9% e os assistentes graduados sénior de 10,9%.

Contas feitas, e de acordo com a tabela remuneratória divulgada pelo SIM, neste regime os aumentos variam entre 417,66 euros brutos (em inicio de carreira) e os 490,13 euros brutos (no topo da carreira). Contudo, de fora ficou a Federação Nacional dos Médicos, o que tem levantado dúvidas sobre a quem se aplicará o acordo. Ao ECO, a tutela liderada por Manuel Pizarro referiu que “o Ministério da Saúde está agora a ultimar os termos concretos da sua operacionalização”, pelo que não divulga, para já, o impacto orçamental da medida nem a quantos médicos se aplicará. Mas, perante as dúvidas dos sindicatos, fonte do Ministério da Saúde explicou ao ECO que o Executivo está agora a “avaliar a extensão da aplicação do acordo a todos os médicos”.

Professores em escolas portuguesas no estrangeiro vão vincular

Também na semana passada, o Executivo, aprovou, em Conselho de Ministros, o decreto-lei que “estabelece o regime de concursos destinados à seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário das Escolas Portuguesas no Estrangeiro da rede pública do Ministério da Educação e dos respetivos polo“, lê-se no comunicado.

Na prática, isto significa que os professores das Escolas Portuguesas no Estrangeiro vão poder entrar para os quadros do Ministério. Ao ECO, fonte oficial do Ministério da Educação, adianta que esta “medida tem um impacto financeiro de 313.726, 56 euros no ano de implementação”.

Além disso, este diploma vem também alterar o estatuto da carreira docente “no sentido de ser reconhecido o tempo de serviço prestado por docentes com qualificação profissional para a docência em regime de contrato em funções públicas a termo resolutivo, para efeitos de conclusão do período probatório“. Decreto-lei também alarga a estes professores o tempo de serviço “legalmente exigido para a progressão ao escalão seguinte, no caso de aquisição de mestrados e de doutoramentos, tal como acontece com os docentes do quadro”.

Senhorios vão ser compensados pelas rendas antigas

Já pelo setor da habitação, o Executivo recuou no que tinha sido transmitido pela ministra responsável pela pasta no dia anterior e aprovou também na semana passada uma compensação aos senhorios de “até ao limite de 1/15 do valor patrimonial tributário” para os contratos de arrendamento celebrados antes de 18 de novembro de 1990.

 

Em causa estão cerca de 124.083 contratos de arrendamento com proprietários privados e a medida tem um custo de 26,6 milhões de euros anuais, de acordo com o estudo pedido pelo Governo, que apontava três cenários diferentes para atribuir compensação aos proprietários. E estes números resultam num subsídio mensal médio de cerca de 17,85 euros por cada contrato, de acordo com as contas da Associação Lisbonense de Proprietários. Esta é, aliás, a solução que consta do relatório que implicava o menor impacto orçamental.

Transportes públicos vão receber apoio de 16,2 milhões para combustíveis

E no plano da mobilidade, o Executivo decidiu voltar a atribuir um apoio extraordinário de 16,2 milhões de euros ao setor dos transportes públicos de passageiros, para atenuar os efeitos do aumento de preços do combustível no segundo semestre do ano, avançou ao ECO fonte oficial do Ministério do Ambiente. O apoio será pago até 31 de março de 2024, tendo como fonte de financiamento o Orçamento do Estado.

Este apoio, também aprovado em Conselho de Ministros na semana passada, segue os mesmos moldes do aplicado nos primeiros seis meses do ano. É calculado “com base num valor de dez cêntimos por litro para os veículos que utilizem combustíveis fósseis que não o gás natural e de 30 cêntimos por litro para os veículos pesados que utilizem gás natural, assumindo consumos de 2.100 litros por mês por autocarro”. A referência é agora “o período entre 1 de julho e 21 de dezembro”, apontou a mesma fonte.

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