Montenegro segura Ana Paula Martins, a ministra "rija" que os portugueses quiseram demitir

4 jun, 16:29
Luís Montenegro e Ana Paula Martins, ministra da Saúde, à chegada ao debate da moção de confiança (LUSA)

Somou críticas da oposição, nem sempre teve a confiança dos portugueses, avançou com remodelações inesperadas e viu o seu ministério envolvido em algumas das mais tensas polémicas do último ano

Luís Montenegro decidiu manter Ana Paula Martins, a “rija”, segundo palavras do próprio, a liderar o Ministério da Saúde. Mas o seu ano de governação somou polémicas atrás de polémicas e críticas de todos os partidos.

O primeiro teste de ferro começou com a aceitação do pedido de demissão de Fernando Araújo da Direção-Executiva do SNS - o eleito de Pedro Nuno Santos para a pasta da Saúde em caso de vitória dos socialistas -, uma pessoa de quem é próxima, mas que ainda assim aceitou que se afastasse do cargo, elegendo António Gandra d’Almeida, que meses depois desrespeitou as regras de lista de espera para cirurgia para ser submetido a uma operação plástica

‘Tirar do cargo’ foi uma das tarefas mais executadas pelo seu ministério, muitas vezes acusado de estar a levar a cabo um purgatório nas Unidades Locais de Saúde (ULS), afastando administração por terem “lideranças fracas”, que, numa boa parte dos cargos, passaram a ser lideradas por autarcas do PSD.

As falhas no Plano de Emergência e Transformação na Saúde - cujas medidas urgentes não foram todas executadas -, a inexistência de um plano de verão atempado no ano passado e o encerramento das urgências de ginecologia e obstetrícia, levando a que muitas mulheres tivessem os seus filhos dentro de ambulâncias em plena estrada - são outros exemplos que marcam negativamente o primeiro ano de Ana Paula Martins como ministra da Saúde, um ano que ficou, sobretudo, marcado pela greve do INEM, que resultou na morte de 12 pessoas e cujas causas e consequências ainda estão por apurar. Ana Paula Martins garantiu que assumiria “total responsabilidade”.

A retoma das parcerias público privadas foi uma das mais recentes medidas anunciadas, mas também das mais criticadas, com Ana Paula Martins a ser acusada pela oposição de querer privatizar o SNS.

Apesar de todas estas polémicas - e os muitos pedidos de demissão feitos pela oposição foram além da própria ministra -, Ana Paula Martina conseguiu superar a votação da Aliança Democrática (AD) em Vila Real, onde era cabeça de lista. A agora reconduzida no cargo de ministra da Saúde já esteve num Governo de Cavaco Silva como adjunta de António Couto dos Santos, Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares entre 1992-1993 e Adjunta do Ministro da Educação em 1993 e 1994. É discreta e por isso poucos sabem da sua carreira política, que recentemente até a colocou no lugar de vice-presidente do partido, entre dezembro de 2021 e junho de 2022, quando Rui Rio era líder do PSD.

A mulher que se diz dos consensos, mas que pouco consenso conseguiu

Quando fala, gosta de citar grandes nomes. E quando lhe perguntam a frase favorita não hesita: “A coragem é a maior das virtudes… todas as outras dependem dela”, Winston Churchill.  Ana Paula Martins, 59 anos, é a nova ministra da Saúde. Social-democrata há 23 anos, liderou o Hospital de Santa Maria, em Lisboa, entre fevereiro de 2023 e janeiro de 2024, onde lhe caiu nas mãos a polémica do tratamento feito às duas gémeas luso-brasileiras uns anos antes. Foi ela quem ordenou a realização de um inquérito interno que acabou por revelar a “cunha” na marcação da primeira consulta que acabou por dar acesso ao tratamento com o medicamento mais caro do mundo. 

Gosta de consensos e por isso tem amigos próximos do PS, como Maria de Belém, a antiga ministra da Saúde socialista ou António José Seguro. Quem trabalhou com ela garante que é uma pessoa pacífica e nada conflituosa, mas às vezes demasiado preocupada com consensos. Mas ficou aquém nesta matéria, somando críticas da oposição e até dos portugueses. Em fevereiro, um barómetro da Pitagórica para o JN, TSF e TVI dava conta que Ana Paula Martins era, aos olhos dos eleitores, a ministra menos popular do Governo de Luís Montenegro. Foi mesmo apontada pelos inquiridos como o elo mais fraco, a governante a ser demitida.

Farmacêutica, filha e neta de farmacêuticos, nunca teve uma farmácia, mas sonha com uma instituição 

Ana Paula Mecheiro de Almeida Martins Silvestre Correia nasceu na Guiné-Bissau, onde o pai trabalhava como farmacêutico e a mãe, também farmacêutica, era na altura professora primária. Veio para Portugal com oito anos, onde ficou a viver desde então. A área da farmácia é uma herança familiar. Além dos pais, também os avós eram farmacêuticos; e ela seguiu-lhes as pisadas. Formou-se na Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa em 1990. Mas nunca teve uma farmácia sua. Quando lhe perguntam, explica que nunca teve dinheiro para tal. Mas trabalhou como estagiária numa farmácia durante um tempo.

Especializou-se em epidemiologia na Faculdade de Ciências Médicas, em 1995, e depois tirou o doutoramento em farmácia clínica na Faculdade de Farmácia de Lisboa, em maio de 2005. Nesse mesmo ano, começou a dar aulas como professora auxiliar. E nunca mais largou os corredores universitários, garantindo sempre aos mais próximos que “adora aprender com os alunos”. Foi a dar aulas na Faculdade de Farmácia que conheceu Odete Santos Ferreira, a investigadora que foi pioneira na luta contra a Sida. Aos mais próximos não esconde que um dos seus sonhos é criar uma instituição com o nome de Santos Ferreira. 

É casada com um militar e tem dois filhos.

Foi bastonária dos Farmacêuticos entre fevereiro de 2016 e fevereiro de 2022 e trabalhou em alguns laboratórios farmacêuticos.  

Nos tempos livres gosta de ler, viajar e não resiste a um animal abandonado. Já acolheu cães e gatos, contam os amigos. Nos tempos em que esteve a liderar o Santa Maria decidiu dar-se como voluntária e trabalhou nas urgências. Durante muito tempo não acreditou que fosse o nome escolhido para a pasta da Saúde e só depois de Marcelo Rebelo de Sousa aprovar, realizou.

 

Notícia corrigida às 18:17 para deixar claro que o plano de resposta sazonal de verão para 2025 já se encontra em vigor.

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