Poder e opositor em Moçambique desencontram-se em visita dupla a Portugal

6 jul, 21:33

Há divergência entre Daniel Chapo e Venâncio Mondlane, que falaram com a CNN Portugal

O presidente de Moçambique está em Portugal. O ex-candidato presidencial e principal opositor do presidente também. “Eu não sei se é coincidência ou não”, diz Daniel Chapo, mas Venâncio Mondlane garante que sim. O último diz que veio a “convite dos coordenadores do nosso projeto político na diáspora europeia” feito há mês e meio, que só não se concretizou mais cedo por “aspectos organizacionais, logísticos e financeiros”. E garante que “não tem nada a ver com tentar fazer uma espécie de sobreposição com Daniel Chapo, de forma absolutamente nenhuma”. 

Numa entrevista à CNN Portugal um dia depois da tomada de posse do novo presidente, Venâncio Mondlane assumia que poderia vir a ser um governo sombra. Quase seis meses depois, Daniel Chapo garante: "Não existe este governo sombra, eu pessoalmente não sinto nem um pouco este governo sombra”.  

Se até aqui os dois estão de acordo, é justamente sobre um acordo que ambos divergem. “Com Venâncio Mondlane não há nenhum acordo. E onde não há acordo, não há nada a cumprir”, diz Daniel Chapo. “Em Moçambique só existe um acordo, que foi assinado com os partidos políticos. O senhor Venâncio Mondlane não tem partido político”.   

Para contornar este condicionamento, Venâncio Mondlane submeteu o pedido de registo do partido a que chamou Anamalala, que significa “acabou” em macua, mas diz que o governo moçambicano está em falta depois de terem sido notificados “para sanar algumas irregularidades” que foram feitas e, por isso, ficou do lado do governo concluir o processo. “O prazo era dia 1 de julho, então estamos fora do prazo, sem notificação. Para não cair do risco do indeferimento tácito, submetemos um ofício ao Ministério da Justiça e o recurso para o Conselho Constitucional para saber porque razão passou o prazo.” 

Venâncio Mondlane quer “resgatar o sentimento de pertença ao país, dos valores patrióticos, cívicos”, quer “combate à corrupção e ao saque público” e “uma reforma da política fiscal que vai permitir a descentralização dos dividendos fiscais dos recursos naturais para aplicação ao nível das políticas públicas localizadas onde os projetos das indústrias extrativas estão localizados”.

Por isso, veio a Portugal, para “consolidar as bases políticas na Europa", já que "Portugal é a nossa porta de entrada para o espaço europeu". Veio também para "consolidar as nossas alianças políticas”. Tem reuniões marcadas com o PSD, IL e Chega. Aguarda resposta do CDS e quer reunir-se também com Marcelo Rebelo de Sousa. “Nós submetemos um oficio para o presidente da República. Um pouco tardiamente, reconheço, mas ontem chegou um ofício ao gabinete do presidente e tenho esperança que nos quase dez dias que tenho aqui em Portugal eu consiga ter uma resposta atempada do presidente”. 

Quanto ao acordo, o opositor político garante, “houve acordo, houve consenso”. Invoca testemunhas “com muita credibilidade em Moçambique”, nomeadamente o bastonário da Ordem dos Advogados, o filósofo Severino Ngoenha, a figura histórica do partido FRELIMO Óscar Monteiro, entre outros. “Testemunharam este ato em que nós chegámos a pontos essenciais de acordo, inclusivamente a Presidência da República emitiu comunicados que em parte, de forma sucinta, falavam dos consensos alcançados”. Por isso, Venâncio Mondlane levanta a hipótese de pressões internas dentro da FRELIMO: “Eu penso que há algum problema dele ao nível do partido, de gestão de conflitos e de diferenças internas do partido que externamente, em público, acaba resvalando para estas manifestações de inconsistências e duplicidades de posições”. Ou então, diz o opositor, “estamos a resvalar para o campo da desonestidade intelectual”.  

Na entrevista exclusiva à CNN durante a sua primeira visita oficial a Portugal enquanto chefe de Estado de Moçambique, Daniel Chapo chama a atenção para o acordo de pacificação com os partidos “que culminou na assinatura de um compromisso político para um diálogo nacional inclusivo em que todos os moçambicanos são convidados para participarem neste debate”. O líder quer envolver “a sociedade civil, a academia, as lideranças religiosas, comunitárias, a juventude e as mulheres, toda a comunidade sem exceção” para “chegar à conclusão se existe realmente alguma coisa que leva as pessoas a pautarem pela violência”. Recolhidas as opiniões, o presidente diz que “podem levar à alteração de certas leis e se for possível, até da Constituição da República”. 

No entanto, Daniel Chapo garante que Moçambique está mais estável desde a forte agitação social após as eleições de Outubro de 2024 que se prolongaram durante cerca de três meses, causando centenas de mortos e milhares de feridos e detidos, de acordo com as organizações não governamentais no terreno. E relativiza. “Desde 94 em Moçambique sempre que terminam as eleições há mortes. A diferença é que de 1994 até 2019 as mortes aconteciam principalmente na zona centro. Isto é, Sofala, Manica, Tete e Zambézia. E sempre morreram pessoas. Portanto, estas não são as únicas eleições, daí a necessidade deste compromisso que fiz de referência. Se não, fica-se com a sensação que foram as primeiras manifestações violentas, que foram as primeiras mortes, foram os primeiros feridos. Não são. Sempre em Moçambique houve mortes”.  

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