Presidente da República falou de confiança várias vezes para se referir ao caso que desencadeou a crise política
Uma questão que se tornou mais ética ou de moral que de política, mesmo que ao início tenha parecido apenas política. Foi desta forma que o Presidente da República apresentou a leitura final ao caso Spinumviva, que provocou a queda do Governo e, sabe-se agora, a marcação de novas eleições legislativas.
Depois de um Conselho de Estado que foi unânime a apontar a necessidade do terceiro ato eleitoral em três anos, Marcelo Rebelo de Sousa fez questão de fazer saber que não concordou com a moção de confiança apresentada pelo Governo.
“Porque é que o Governo anunciou e apresentou a moção de confiança e as oposições rejeitaram essa moção?”, referiu num discurso com cerca de 10 minutos, repetindo a ideia que já tinha deixado clara aos conselheiros, entre os quais o primeiro-ministro, Luís Montenegro.
E foi sobre o primeiro-ministro que o chefe de Estado fez o seu discurso, dando claramente a entender que esta foi uma questão muito mais pessoal que de outra índole, até porque estava em causa - e Marcelo Rebelo de Sousa disse-o duas vezes - a confiança na figura do chefe do Governo.
“Para uns a confiança ética ou moral era óbvia, para outros a desconfiança moral ou política era óbvia”, reiterou o Presidente da República, apontando que “não havia meio caminho”, já que “não se pode ao mesmo tempo confiar e desconfiar do primeiro-ministro”.
Tudo isto num “panorama” único na história da democracia portuguesa. E é o próprio Marcelo Rebelo de Sousa quem o entende, numa saída que, mesmo que não desejada, opta pela “realidade”, até porque o “choque de juízos” faria com que fosse “impossível continuar a governar”.
“Este choque, não apenas legal nem político, mas sobretudo de juízo ético e moral sobre uma pessoa e a sua confiabilidade, suscitou uma questão nova: todos os esforços de entendimentos, mesmo mínimos, se revelaram impossíveis”, acrescentou, reforçando que “ninguém esperava nem queria” chegar aqui.
Olhando para a frente, Marcelo Rebelo de Sousa exige agora um “debate eleitoral claro, frontal, esclarecedor, mas sereno, digno, elevado, tolerante”, mas que garanta também o respeito pela “diferença e pluralismo” e que “fortaleça e não enfraqueça a democracia” e “não abra ainda mais a porta a experiências que se sabe como começam e se sabe como acabam”.
O Presidente da República pede, assim, que se possa chegar a um cenário de estabilidade, para que não voltemos a passar por algo semelhante no futuro. Um debate que “dê força a quem nos vier representar”, mas também “à democracia”.
“E com ela e a sua capacidade de enfrentar e superar crises, que só a democracia tem, não a ditadura.”