Depois de tentar unir o PS na Comissão Nacional, António Costa passou ao ataque quando chegou junto dos jornalistas. Ninguém ouviu o que disse lá dentro, mas cá fora, as palavras tinham destinatários escolhidos. O Presidente da República foi um deles
A meio da Comissão Nacional do PS, que foi fechada aos jornalistas, António Costa não se poupou nas palavras para os que o aguardavam. Marcelo Rebelo de Sousa, a PGR, a Justiça e o Chega. Foram duras e com direção escolhida as suas respostas.
António Costa criticou Marcelo por "divulgação de conversas" e queixa-se mesmo de quebra de confiança por parte de Marcelo Rebelo de Sousa. O primeiro-ministro mostrou-se incomodado pelo Presidente da República ter divulgado que foi António Costa que pediu para chamar a Procuradora-Geral da República a Belém e que o próprio o tinha admitido.
Perante os jornalistas, começou por acentuar uma questão de princípio: “Em oito anos como primeiro-ministro, tenho o princípio que nem por mim, nem por heterónimos que escrevem nos jornais, dizer o que acontece nas conversas entre mim e o senhor Presidente da República – e agora não vou alterar seguramente esta prática”.
“As conversas entre o Presidente da República e o primeiro-ministro não são conversas entre duas pessoas que se conhecem, mas entre dois titulares de órgãos de soberania. No dia em que um começa a achar que pode dizer o que o outro disse, ou o que o outro não disse, seguramente as relações entre órgãos de soberania correrão com menor fluidez”, advertiu António Costa. Além de que nunca se lembra de ter falado sobre esse assunto publicamente.
Mas houve mais recados. António Costa criticou também a falta de "bom senso" que levou a esta "crise política irresponsável" e garantiu que não sabia nada "do que existe na Justiça a não ser um parágrafo". Mesmo assim, sublinhou que mantém a sua velha máxima do "à Justiça o que é da Justiça".
O secretário-geral socialista caracterizou mesmo como uma irresponsabilidade a abertura de uma crise política, apontou instabilidade na direita e afirmou esperar que o Presidente da República não seja forçado a dissolver mais vezes o parlamento. Apontou ainda eventuais consequências negativas da crise política numa conjuntura complexa no plano internacional.
“O PS tem todas as condições para ganhar as eleições, já que a direita apresenta uma alternativa de instabilidade. Mesmo uma maioria parlamentar aritmética de direita dependente do Chega nunca será uma maioria governativa, porque o Chega não é um partido igual aos outros”, defendeu.
O ainda líder do executivo referiu-se, não apenas à ideologia no Chega, de extrema-direita, mas também ao comportamento dos dirigentes desta força política, razão pela qual, na sua perspetiva, este partido “será um fator permanente de instabilidade”.
“Aquilo que todos desejamos, seguramente, é que esta tenha sido a última dissolução do atual Presidente da República e que o chefe de Estado não fosse ainda fosse confrontado com a necessidade de fazer novas dissoluções no futuro”, advertiu.
Para António Costa, esta dissolução da Assembleia da República “foi totalmente despropositada e desnecessária, mas – pronto – está feita”.
Deixou ainda outro recado, este dirigido ao PSD: “Que ninguém pense que lá por fazer um acordo com o Chega e ter uma maioria na Assembleia da República cria condições de governabilidade”. “Não cria. Pelo contrário, é um fator de enorme ingovernabilidade”, sustentou.
“Cabe ao PS não se intrometer no tempo da justiça, mas concentrar-se no tempo dos portugueses"
O secretário-geral socialista advertiu os dirigentes do partido que não devem intrometer-se no tempo da justiça até às eleições legislativas, mas, antes, devem concentrar-se no tempo dos portugueses, respondendo aos seus problemas.
António Costa falava aos jornalistas a meio da Comissão Nacional do PS, ocasião em que voltou a defender a tese de que o seu partido não deve ficar preso no processo judicial que conduziu à sua demissão das funções de primeiro-ministro na semana passada.
“Cabe ao PS não se intrometer no tempo da justiça, mas concentrar-se no tempo dos portugueses. E o tempo dos portugueses exige resposta aos problemas que estão em curso, num cenário internacional que é muito pesado e que em tudo recomendava que tivesse havido bom senso em não ter desencadeado esta crise política”, declarou.
Uma vez desencadeada a atual crise política, de acordo com o secretário-geral socialista, “o PS tem de fazer como nas últimas eleições legislativas”.
“O PS tem de falar aos portugueses e mobilizar os portugueses. Tal como os portugueses resolveram a última crise política irresponsável, agora devem também resolver a nova crise política irresponsável”, frisou.
Em relação aos três candidatos à sua sucessão no cargo de secretário-geral do PS, António Costa elogiou por igual Pedro Nuno Santos e José Luís Carneiro e salientou que não irá interferir nesta luta interna.
“O PS deve aproveitar este debate interno para renovar ideias, corrigir erros e apresentar-se aos portugueses de forma unida e capaz de assegurar uma vitória nas eleições de 10 de março".
"Não me ficava bem, estar agora a intervir na escolha de quem me vai substituir. Além do mais, dos três candidatos, houve dois com quem trabalhei com grande proximidade”, observou.
“A melhor solidariedade em relação a mim é uma vitória do PS no dia 10 de março”
Antes, lá dentro, o secretário-geral do PS, António Costa, afirmara que a melhor solidariedade que o seu partido pode dar em relação à sua situação pessoal é uma vitória nas eleições legislativas antecipadas de 10 de março.
Esta posição, segundo fontes socialistas, foi transmitida no discurso inicial que António Costa proferiu à porta fechada perante a Comissão Nacional do PS, durante o qual não se referiu ao processo judicial que o envolve e que causou a sua demissão das funções de primeiro-ministro na semana passada.
“A melhor solidariedade em relação a mim é uma vitória do PS no dia 10 de março”, declarou, citado por dirigentes socialistas presentes na reunião.
Na sua intervenção inicial, o ainda líder dos socialistas elogiou por igual dois dos três candidatos à sua sucessão no cargo de secretário-geral do PS, cujas eleições diretas internas estão marcadas para os dias 15 e 16 de dezembro.
António Costa assinalou que, tanto Pedro Nuno Santos, como José Luís Carneiro, trabalharam consigo. Nesta referência, deixou de fora Daniel Adrião, que se candidatou contra si nas eleições diretas internas de 2016, 2018 e 2012.
No final do seu discurso, de acordo com as mesmas fontes, foi aplaudido de pé pela maioria dos membros da Comissão Nacional do PS.
Na semana passada, durante uma reunião a Comissão Política Nacional do PS, António Costa já tinha pedido aos militantes socialistas para que não caíssem na “armadilha” de entrar em confronto com o Ministério Público por causa do processo judicial que levou ao fim do seu Governo suportado no parlamento por uma maioria absoluta, estando eleições legislativas marcadas para 10 de março.
O primeiro-ministro disse então que ele próprio vai tratar “bem” do processo judicial em que o seu nome foi envolvido e que o levou a pedir da demissão do cargo, no passado dia 07, ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.