No dia em que se votaram duas moções de censura ao governo, Sébastien Lecornu sobreviveu a ambas. A primeira, apresentada pela extrema-esquerda, reuniu 271 votos - abaixo dos 289 necessários para derrubar o executivo -, enquanto a segunda, apresentada pela extrema-direita, teve apenas 144 votos a favor
O primeiro-ministro francês, Sébastien Lecornu, sobreviveu esta quinta-feira a duas moções de censura no parlamento, depois de prometer suspender a polémica reforma das pensões, uma das principais bandeiras do presidente Emmanuel Macron.
A primeira moção, apresentada pela ala radical da esquerda, reuniu 271 votos, abaixo dos 289 necessários para derrubar o governo. A segunda, proposta pela extrema-direita, teve ainda menos apoio, com apenas 144 deputados a votarem a favor.
A decisão de Lecornu, anunciada na terça-feira, de suspender a reforma foi interpretada como uma tentativa de conquistar o apoio da esquerda e garantir a sua sobrevivência política. A estratégia parece ter resultado: os socialistas, peça-chave no xadrez parlamentar, confirmaram que não votariam a favor de nenhuma das moções.
Mesmo assim, a margem de sobrevivência do executivo foi curta e expôs a fragilidade da maioria presidencial. Vários deputados rebeldes, tanto dos socialistas como dos republicanos (direita conservadora), admitiram ter ponderado votar contra o governo.
“Se fosse deputada, votaria a favor da moção. O governo apresenta-nos um orçamento socialista, e eu não sou socialista. Os nossos eleitores esperam que tenhamos valores”, afirmou Florence Portelli, vice-presidente dos republicanos.
A suspensão da reforma representa um duro golpe político para Macron, que via nela um dos principais legados do seu mandato. O projeto previa aumentar gradualmente a idade mínima de reforma de 62 para 64 anos até 2030, aproximando a França dos restantes países da União Europeia.
No entanto, mexer nas pensões tem sido “criptonite política” para sucessivos governos. Desde que François Mitterrand reduziu a idade da reforma para 60 anos em 1982, qualquer tentativa de reversão tem provocado protestos e instabilidade.
Atualmente, a idade média efetiva de reforma em França é de 60,7 anos, bem abaixo da média da OCDE (64,4).
Crise política e incerteza orçamental
Apesar de ter sobrevivido às duas moções, Lecornu enfrenta agora semanas de negociações tensas para aprovar o orçamento de 2026, durante as quais poderá voltar a ser alvo de novas moções de censura.
Os socialistas, encorajados pela concessão do primeiro-ministro, já exigem a introdução de um imposto sobre os mais ricos no novo orçamento, sinal claro da fragilidade do executivo.
Lecornu prometeu apresentar em novembro uma emenda à lei de financiamento da segurança social para formalizar a suspensão da reforma das pensões.
Contudo, vários deputados de esquerda alertam que o primeiro-ministro pode estar a preparar uma armadilha política. A medida, dizem, poderia obrigá-los a aceitar outras disposições orçamentais com as quais discordam.
“Foram enganados!”, criticou o deputado da ala dura da esquerda, Manuel Bompard, em declarações à TF1.