Num momento em que a informação nunca foi tão acessível, as crianças absorvem o lado mais duro do mundo, sem filtros nem pausas. Cabe-nos a nós filtrar essa realidade e proporcionar-lhes ferramentas para a compreenderem. Ensinar a ver o “copo meio cheio” é mais do que uma metáfora, é um ato de cuidado e esperança, para proteger a saúde mental infantil.
Ligamos a televisão e vemos imagens de guerras e conflitos, com cidades destruídas e milhares de vidas em risco. Os miúdos veem, nós também. Mudamos de canal e assistimos a um episódio de violência doméstica. Os miúdos veem, nós também. Insistimos em procurar notícias mais leves e positivas, mas deparamo-nos com bombeiros exaustos, depois de horas intermináveis a tentar salvar famílias que, de um momento para o outro, perderam tudo. Os miúdos veem, nós também. Continuamos a saltar de canal em canal, em busca de algo positivo, e damos por nós a assistir a mais uma tragédia, sem saber como reagir a uma realidade que já não é ficção. Os miúdos veem, nós também.
E então, surge a pergunta inevitável: o que pensarão e sentirão as nossas crianças e jovens, quando são confrontados, diariamente, com este mundo que lhes entra em casa sem pedir licença?
A verdade é que esta realidade se cruza, hoje, com uma disponibilidade de informação quase ilimitada. Tanto na televisão, como na rádio e nas redes sociais, vemos imagens e relatos que chegam de forma imediata e, muitas vezes, sem qualquer filtro. A intensidade e a duração desta exposição variam, mas os efeitos no bem-estar e na saúde mental das crianças e jovens são reais.
Cada criança é única e absorve o que vê e ouve de forma diferente e própria. No entanto, no estado de arte disponível sobre o assunto, a exposição repetida a imagens de violência e catástrofes tem impacto na saúde mental dos mais novos, com relatos de sintomatologia como a ansiedade e incerteza sobre o futuro, o humor deprimido e a angústia. Filtrar e mediar esse consumo de informação é, por isso, um verdadeiro ato de cuidado. E começa em casa.
Cabe-nos a nós, pais, educadores e todos os que, de alguma forma, influenciam o crescimento de crianças e jovens, ajudar a equilibrar esta perceção. Não se trata de esconder a realidade, mas sim de a adaptar, preparar e de a tornar compreensível a cada criança. Aos adultos cabe a responsabilidade de escolher o canal, de moderar a exposição, de ajudar a interpretar as situações e de abrir espaço para conversas abertas e tranquilizadoras. Ensinar a distinguir e selecionar fontes fiáveis de informação, moderar o tempo de ecrã, equilibrar notícias negativas com exemplos positivos, estar atentos a sinais de alerta e, se necessário, procurar ajuda profissional. Porque proteger a saúde mental das crianças não é limitar o seu acesso ao mundo, é dar-lhes as ferramentas certas para o compreender e enfrentar.
Ao mesmo tempo, é fundamental mostrar o outro lado da vida, aquele que não passa nas aberturas dos telejornais. Um jantar em família, uma conversa sem pressa, uma história contada ao deitar, uma gargalhada num jogo improvisado. Pequenos momentos que constroem memórias felizes e ajudam a equilibrar o peso das imagens duras que chegam do exterior. Esse equilíbrio é, em si mesmo, uma medida de saúde mental.
No fundo, trata-se de mudar o foco e ensinar a ver o “copo meio cheio”. Lembrar que, apesar das contrariedades que possam surgir no caminho, há sempre um lado bom em tudo o que vivemos e sentimos. Cabe-nos, a nós, mostrar e passar às próximas gerações que vale a pena acreditar, sonhar, construir e viver. Porque viver vale muito a pena.