"Se alguma vez vos disserem que não há vaga, [é] mentira, tem que haver, tem que se criar extravaga", explicou Ana Mendes Godinho
Todas as crianças sinalizadas como estando numa situação de perigo têm entrada direta numa creche, haja ou não vaga disponível, garantiu esta segunda-feira a ministra Ana Mendes Godinho, no primeiro encontro nacional sobre acolhimento familiar de crianças e jovens.
Perante uma plateia de várias dezenas de responsáveis dos centros distritais do Instituto de Segurança Social com intervenção em matéria de acolhimento familiar, a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social explicou que a gratuitidade das creches inclui uma “medida especial”.
“Qualquer criança que tenha sido sinalizada como estando em perigo tem entrada direta numa creche, independentemente de haver capacidade da creche. É extravaga”, anunciou Ana Mendes Godinho, para quem esta é uma forma de “eliminar a exclusão que estava a acontecer a muitas crianças”.
Segundo a ministra, crianças que já sofriam por estarem numa situação de pobreza ou exclusão social “estavam em dificuldade acrescida de entrar na creche, agravando a sua situação de exclusão”.
“Deixo este alerta: Se alguma vez vos disserem que não há vaga, [é] mentira, tem que haver, tem que se criar extravaga”, enfatizou.
Ana Mendes Godinho defendeu que é preciso “acelerar mesmo muito” o foco no acolhimento familiar, apontando que muito ainda falta fazer quando há mais de 6.200 crianças institucionalizadas, apesar de esse valor representar uma descida de cerca de 50% em 12 anos.
Apontou que, a continuar a este ritmo, serão precisos mais 18 anos para retirar todas as crianças do acolhimento institucional, tendo em conta as que se mantêm e as que vão entrando de novo no sistema.
No entender da governante, apesar do caminho já percorrido e de sucessos alcançados, há fenómenos que mostram “a falência do sistema”, como por exemplo quando “muitas das pessoas que estão em situação de sem-abrigo são ex-jovens acolhidos”.
“Não há nada que nos deva incomodar mais (…). Isto é a falência do sistema, desculpem que vos diga, porque não só não conseguimos dar àquelas crianças e jovens uma alternativa de vida que os integrasse, como quando saíram do sistema de acolhimento não houve uma capacidade de lhes dar uma viragem para a autonomia”, criticou.
Para a ministra, casos como estes são demonstrativos de que é preciso “investir brutalmente” em soluções de pré-autonomia e garantir que todas as crianças e jovens “têm um ‘backup’ que as ajuda quando saem do ambiente familiar”, tal como acontece com qualquer criança que tem família.
O acolhimento familiar é uma medida de promoção e proteção de caráter temporário, que é decidida ou por tribunal ou pelas comissões de proteção de crianças e jovens, e que consiste em entregar uma criança retirada à família biológica a uma pessoa singular ou agregado até que estejam reunidas as condições para a criança regressar a meio natural.
De acordo com os dados do relatório anual da atividade das comissões de proteção de crianças e jovens para 2021, o acolhimento familiar representava apenas 0,9% das 883 medidas de promoção e proteção a título cautelar, contra 8,5% em acolhimento residencial.