"Suisse Secrets." Ditadores, o “Misha Banana” e mais: quem está no mais recente escândalo financeiro

21 fev 2022, 18:23
Credit Suisse (AP)

Há dinheiro obtido por cartéis de droga e ligações pouco claras a Vladimir Putin. Pelo meio, muitos ditadores e figuras de Estado com contas recheadas num banco suíço. Há também um arcebispo destituído pelo Papa Francisco

Mais de 18 mil contas e 100 mil milhões de dólares (cerca de 88 mil milhões de euros) partilhados por ditadores, traficantes, empresários condenados e outras figuras mundiais. O "Suisse Secrets" é o mais recente escândalo financeiro expõe dúvidas sobre muitas fortunas que estavam no banco Credit Suisse.

Os dados, que foram divulgados pelo Organized Crime and Corruption Reporting Project (OCCRP) e pelo jornal alemão Süddeutsche Zeitung, revelam que aquele banco suíço, até então um dos mais respeitados do mundo, abriu várias contas, desde a década de 1940, não apenas para os muito ricos mas para algumas pessoas que tinham sido condenadas à vista de todos. Entre as várias pessoas analisadas há dois portugueses.

As duas maiores fortunas que constam na lista divulgada pelo consórcio de jornalistas são de duas figuras que nasceram na antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. A maior delas é a de Saodat Narzieva, obstetra que chegou a ter 1,8 mil milhões de euros em apenas uma das dez contas, das quais três permanecem abertas. Irmã de Alisher Usmanov, esta cidadã do Uzbequistão foi condenada por fraude na década de 1980 e esteve ligada a uma transação de seis milhões de dólares (cerca de cinco milhões de euros) entre uma empresa do irmão, um poderoso oligarca, e Valentin Yumashev, alto conselheiro de Vladimir Putin.

Do Cazaquistão chega Timur Kulibayev, marido da filha do antigo homem forte do país, Nursultan Nazarbaev, e que foi investigado por lavagem de dinheiro e subornos. Tinha mais de 812 milhões de euros em apenas uma das nove contas, todas fechadas em 2010 ou depois desse ano, em que Timur Kulibayev foi investigado na Suíça por lavagem de dinheiro.

Timur Kulibayev (Nikita Bassov/AP)

Ditadores com dinheiro

Os laços políticos estão longe de terminar na Rússia. Do mundo árabe chegam várias contas, seis das quais ligadas a Gamal e Alaa Mubarak, filhos de Hosni Mubarak, que foi presidente do Egito durante 30 anos, até ter sido deposto pela revolta da Primavera Árabe. Os dois homens foram acusados em vários casos de corrupção e até manipulação de mercado. Chegaram a ter mais de 266 milhões de euros numa conta só.

Já o rei da Jordânia, Abdullah II, partilhou sete contas com a mulher, a rainha Rania al Abdullah, uma delas com mais de 221 milhões de euros. A página da investigação jornalística destaca o monarca como alguém que utilizou poderes para “mandar abaixo a liberdade de expressão e a oposição”. Os nomes de ambos já tinham aparecido nos Pandora Papers.

Rei Abdullah II, da Jordânia (Hannah McKay/Pool Photo via AP)

Já da Guiné Equatorial, país que faz parte da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, chega-nos a família Obiang, cujo patriarca, Teodoro, é o conhecido ditador daquele Estado, que lidera desde 1979, estando ligado a vários casos de tortura e de repressão.

São mais de 668 mil euros depositados por uma família de quem o OCCRP lembra que vive às custas do petróleo encontrado no país, ao mesmo tempo que 70% da população vive em pobreza. Teodoro dedica-se a essa gestão, enquanto a mulher e filhos gerem a conta.

Vaticano não escapa

Antigo aliado do Papa, Giovanni Angelo Becciu tem uma conta com mais de 243 milhões de euros, com o seu nome a aparecer menos de um ano depois de Francisco o ter destituído, depois de se ter sabido que o Reino Unido ia avançar com uma investigação na sequência de um escândalo imobiliário no qual o italiano é acusado de crimes de abuso de poder, extorsão, branqueamento de capitais, fraude, falsa escritura e peculato.

Giovanni Angelo Becciu (Gregorio Borgia(AP)

Um barão da droga entre as contas

É o caso de Rodoljub Radulović, descrito como um “barão da droga” que terá utilizado, durante anos, o banco para traficar cocaína a favor de um cartel sérvio liderado por Darko Šarić. Conhecido como “Misha Banana”, está fugido à justiça, nomeadamente à americana, onde é procurado por fraude. Nas duas contas que manteve entre 2005 e 2010, o sérvio teve mais de 3,3 milhões de euros naquele banco. De acordo com o OCCRP, pelo menos 2,5 milhões de euros terão sido lavados através daquelas contas.

A mesma sorte não tiveram Roberto Enrique Rincón Fernández ou Ronald Li Fook-shiu, que tiveram mesmo de cumprir pena de prisão por crimes financeiros. De resto, o primeiro, de nacionalidade venezuelana, continua preso nos Estados Unidos, depois de ter admitido subornos para beneficiar a empresa de petróleo que geria a partir do Texas. Tinha quase 66 milhões de euros espalhados por sete contas, algumas das quais ainda abertas. Já o segundo, nascido em Hong Kong, cumpriu quatro anos de prisão na década de 1990, também por subornos. Tinha mais de 56 milhões de euros em apenas uma conta.

Entre os vários nomes há ainda o da família ucraniana Guta, que chegou a ter mais de 214 milhões de euros em várias contas, depois de ter ficado ligada à falência da Mriya Agro Holding Public Limited, empresa agrícola que acabaria por deixar prejuízos superiores a mil milhões de euros aos credores.

São ainda referidos nomes fortes da espionagem de países como Egito, Jordânia ou Paquistão.

Estas são apenas algumas das revelações feitas pelo consórcio internacional de jornalistas, liderado pelo OCCRP, que promete novidades para breve.

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