Apesar de mais transmissível, a nova variante é menos agressiva? Cinco perguntas e respostas sobre a Ómicron

19 dez 2021, 09:00
Nova variante da covid-19, Omicron

A CNN Portugal falou com dois especialistas para esclarecer cinco questões relacionadas com a nova variante Ómicron, detetada em novembro, na África do Sul, e que tem feito soar os alarmes por todo o mundo

São cada vez mais os dados que indicam que a nova variante da covid-19 está a propagar-se a grande velocidade na Europa e no mundo. Um ritmo que gera apreensão entre a população e que levanta novas questões relacionadas com a Ómicron: será esta uma variante mais perigosa? A vacinação e a máscara continuam a ser soluções para travar a pandemia? A CNN Portugal falou com dois virologistas para esclarecer todas as dúvidas.

Apesar de mais transmissível, a nova variante é menos agressiva?

Em relação à transmissibilidade da nova variante Ómicron, o virologista Paulo Paixão confirmou à CNN Portugal que “já não sobram grandes dúvidas” nesse sentido. “Realmente, é mais transmissível, e as projeções apontam, por exemplo, que entre janeiro e fevereiro deste ano, será [a variante] dominante na Europa”, uma previsão que já foi, aliás, salientada pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.

Os estudos que têm vindo a ser feitos sobre a nova variante mostram que "há aparentemente cerca de 30% de menor severidade em populações que são altamente seroprevalentes". Na África do Sul, por exemplo, que apresenta uma taxa de vacinação muito baixa (com menos de 30% da população vacinada), 98% das novas infeções são da variante Ómicron.

Mas porquê? De acordo com um estudo preliminar da Universidade de Hong Kong, a Ómicron poderá ser mais transmissível do que a variante Delta devido à sua replicação, que é 70 vezes maior nos brônquios, enquanto nos pulmões a carga viral é dez vezes inferior, o que sugere menor letalidade. Pedro Simas refere que esta pode ser uma explicação para o facto de a Ómicron ser menos virulenta: replica-se melhor na nasofaringe, mas menos no pulmão e isso torna-a mais contagiosa.

O virologista explica ainda que a Ómicron terá igualmente capacidade de se replicar a uma temperatura ligeiramente mais baixa do que a Delta.

"A partir do momento em que é mais eficaz a replicar-se, é mais contagiosa, mas isto ainda é especulativo. Mas transparece tendência de que a variante, apesar de ser mais contagiosa, causa menos doença severa.

Tendência essa que deverá ser consolidada nas próximas semanas, estima Pedro Simas: "Em termos do que é a evolução natural destes vírus, é natural que apareçam variantes que são mais competentes a disseminarem-se mas causam menos doença. É a entrada para a situação de endemia, o problema maior é que pode causar muitas infeções porque as pessoas estão sincronizadas nas suas imunidades e sabemos que ela ao longo do tempo vai baixando, por isso precisamos da terceira dose da vacina". 

O que se está a verificar na África do Sul é que há mais pessoas a recuperar em casa, a permanência nas enfermarias dos hospitais reduziu de oito para três dias e mais de metade das pessoas em cuidados intensivos não são vacinadas. 

Se é menos agressiva, porque diz a OMS que aumenta mortalidade?

De acordo com Paulo Paixão, ainda há “muitas dúvidas” quanto à gravidade da Ómicron. “Os dados preliminares sugerem que não será mais grave do que a variante Delta”, mas é necessário mais tempo para perceber esta questão, ressalvou o virologista, até porque o pico da mortalidade surge “mais tardiamente”, ou seja, o período entre o agravamento do estado de um infetado e o óbito “normalmente não é imediato”. Isto significa que, se o número de infeções está a aumentar, o pico da mortalidade "não se fez sentir ainda", explicou.

O virologista alertou para a possibilidade de aumento do número de casos graves, isto é, de casos que necessitem de internamento e que possam conduzir à mortalidade, mesmo que a nova variante tenha uma percentagem de gravidade mais reduzida. Isto porque “se for mais transmissível e se causar mais casos, inevitavelmente também o número de casos graves vai aumentar”, explicou.

Por sua vez, Pedro Simas salientou a "assimetria" entre as taxas de vacinação no mundo e na Europa. Em Portugal, por exemplo, podemos ter um comportamento epidémico de crescimento do número de infeções da Ómicron, mas temos 90% da população vacinada. Assim, "este crescimento exponencial há de ter um teto, vai bater na barreira da imunidade de grupo", frisou.

É certo que a subida do número de infeções pode provocar uma sobrecarga e uma letalidade proporcional, mas a situação portuguesa não é comparável, tendo em conta a taxa de vacinação no país, explicou o especialista. "Somos únicos na taxa de vacinação e estamos rapidamente a construir uma terceira dose, que tem um efeito muito grande na mitigação da taxa de reinfeção", referiu.

Também o virologista Paulo Paixão salientou a importância da terceira dose para reforçar a proteção contra a Ómicron: "Tudo indica que a terceira dose aumenta significativamente a proteção contra a nova variante. Também temos de perceber até que ponto esta terceira dose vai bloquear este aumento do número de casos graves; nós acreditamos que sim, mas temos de ver."

Vacinar crianças pode ajudar a travar contágios?

A vacinação com a terceira dose continua a ser a melhor forma de mitigação do aumento de infeções e do aumento de hospitalizações. O virologista frisa que tem de se começar sempre pelos grupos de risco, que são sempre os mesmos. Estão bem protegidos com duas doses contra a doença severa, e tal é inequívoco mesmo para a Ómicron.

"É preciso começar sempre com hierarquia a pensar na proteção dos mais vulneráveis" e ir acrescentando faixas etárias mais novas, realça. No caso dos mais jovens, "vacinar crianças não aumenta muito em termos de imunidade de grupo", a estratégia, considera, deve ser começar pelos idosos. Mas qualquer criança de grupo de risco deve ser vacinada, independentemente da idade, acrescenta.

"O efeito protetor das vacinas deverá evitar uma sobrecarga do SNS", frisou.

Para o virologista Paulo Paixão, a vacinação das crianças “vai seguramente ajudar” a diminuir o número de contágios de covid-19, mas não terá um “impacto tremendo” nessa redução. “Penso que vai ter papel importante, mas não exageradamente importante”, vincou o virologista, apontando que a solução está sim “num conjunto de medidas” que incluem o reforço da vacinação na população mais vulnerável, aliado à vacinação das crianças, bem como o aumento da testagem.

A máscara continua a ser crucial na proteção? 

Pedro Simas reforça que os estudos mostram que as medidas de contenção funcionam: "Temos sempre a bazuca, ou o martelo, que é o confinamento total e funciona para qualquer variante, porque os vírus precisam das pessoas para se disseminarem".

Mas o especialista defende que as medidas implementadas até agora são suficientes: "Temos uma situação bastante equilibrada ainda, temos de monitorizar". "Se conseguimos controlar a Delta, também vamos controlar a Ómicron. A situação é completamente diferente, há uma variante que é mais contagiosa mas que aparentemente é menos virulenta e uma população com taxa de vacinação muito alta", explicou.

"A terceira dose e a máscara são as melhores medidas de contenção prudente", vincou.

Por sua vez, o virologista Paulo Paixão salientou que "a utilização da máscara, em termos de efeitos protetores, é exatamente igual" mesmo perante a nova variante, reforçando a importância de utilizar as máscaras corretamente.

Como controlar o pânico perante o aumento do número de infeções?

Face ao aumento do número de casos de infeção e de mortalidade devido à covid-19, é natural que as pessoas fiquem mais preocupadas e ansiosas. Como controlar então essa ansiedade? Para o virologista Paulo Paixão, é importante lembrar que "a situação deste ano, embora grave, é claramente melhor do que a do ano passado", quando o número de contágios e de mortes era muito superior ao registado agora.

É necessário, por isso, pedir "mais resiliência à já resiliente população" para cumprir com as medidas de proteção no sentido de evitar a propagação do vírus e ter "esperança" de que "estes serão os últimos meses em que teremos de passar por esta situação".

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