Corredor de Suwalki. O lugar mais perigoso do mundo fica na Europa

21 jun 2022, 13:17
Janek Skarzynski/AFP via Getty Images

É o calcanhar de aquiles da NATO na fronteira com a Bielorrússia e, apesar de vários anos de alertas e pedidos de reforço, o medo do início de um conflito neste estreito pedaço de terra está agora mais vivo que nunca

“A situação é mais do que grave. Será necessária uma análise aprofundada para elaborar respostas”, disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov. A resposta de Moscovo à notícia de que a Lituânia restringiu o tráfego ferroviário que abastecia o enclave russo de Kaliningrado fez soar os alarmes e aumentou ainda mais as tensões que se fazem sentir no estreito corredor de Suwalki. 

“Há quem pense que não há motivo para nos atacarem, mas é preciso sublinhar que nós somos uma rota direta para Kaliningrado. Se eles conseguirem derrotar a Ucrânia, é possível que o próximo golpe russo caia aqui”, alerta Ramūnas Šerpetauskas, o comandante de uma companhia da União dos Fuzileiros da Lituânia, milícia voluntária com mais de um século de história, em declarações ao jornal norte-americano Politico.

O grupo de militares que chefia está destacado na pequena cidade termal lituana de Druskininkai, junto à fronteira com a Bielorrússia. A calma e a normalidade com que os 12 mil habitantes desta localidade agem no dia a dia contrastam com a atenção e seriedade com que Ramūnas e os seus homens monitorizam a situação. Para já, tudo está calmo “no calcanhar de Aquiles” do ocidente, mas os mais recentes desenvolvimentos podem vir a mudar tudo.

Na mira de Putin

Vários especialistas militares ocidentais alertam que esta região pode ser um dos primeiros alvos de Putin, caso o conflito com o Ocidente continue a escalar e acabe por se transformar num conflito armado. A aplicação de sanções por parte da Lituânia, impedindo o trânsito de vários produtos russos para Kaliningrado, pode contribuir para o aumento das hostilidades.

Enclave de Kaliningrado e o corredor de Suwalki (CNN Portugal)

Com os planos de expansão territorial de Vladimir Putin cada vez mais visíveis, aumenta a preocupação de que este cenário possa ser cada vez mais uma realidade. Tal como a liderança russa parece disposta a arriscar tudo para criar uma ponte terrestre com o território ocupado da Crimeia, e com a possibilidade de fazer o mesmo com a Transnístria, a vontade de conectar a Rússia ao enclave de Kaliningrado é vista pela NATO como uma forte possibilidade. O facto de Mikhail Kasyanov, antigo primeiro-ministro na Rússia de Putin, ter afirmado que, após a queda da Ucrânia, os estados do Báltico “serão os próximos” faz antever o pior. Um ataque russo nesta fronteira com menos de 100 quilómetros cortaria por completo o contacto do Ocidente com os países do Báltico.

“A única resposta para este desafio é um aumento da presença da NATO aqui. Nós sabemos o quão obcecados são em fechar corredores terrestres”, afirmou Margiris Abukevicius, vice-ministro da Defesa.

Se por um lado o facto destes países pertencerem à NATO poder atuar como um fator dissuasor, por outro lado há quem tema que a irrelevância deste território possa levar a que Washington não queira arriscar um conflito nuclear com Moscovo e acabe por não interferir.

Uma cidade que nada teme

Mas neste pequeno corredor de terreno com menos de 100 quilómetros de comprimento que liga a Polónia e a Lituânia, ninguém pensa em guerra. Danukas, que não revela o seu último nome para evitar possíveis represálias, garante que ali “ninguém vive com medo” de uma invasão russa.

“A nossa comunidade confia no exército da Lituânia, na NATO e na capacidade de garantir a nossa segurança. Se isso acontecer, sim, as pessoas vão questionar-se [sobre o que fazer], mas agora não é realmente o caso”, conta o proprietário de um dos vários spas da cidade de Druskininkai.

O nome do “corredor de Suwalki” foi criado pelo antigo presidente da Estónia Toomas Hendrik Ilves minutos antes de uma reunião com a então ministra da Defesa alemã Ursula von der Leyen, em 2015, de forma a chamar a atenção para essa lacuna na defesa do Ocidente.

Um porta-aviões impossível de afundar

Mas porque é que Kaliningrado importa para a Rússia? Kaliningrado só passou a fazer parte da Rússia em 1946. Anteriormente Konigsberg, a cidade foi capturada à Alemanha Nazi pelo Exército Vermelho em abril de 1945 e cedido à União Soviética após a Segunda Guerra Mundial. Após a ocupação, as autoridades soviéticas expulsaram a parte da população alemã e colonizaram a cidade costeira.  A região recebe produtos da Rússia por via ferroviária e de gasodutos através da Lituânia.

O enclave é descrito pelas autoridades russas como “um porta-aviões impossível de afundar” no mar Báltico e que permite atrapalhar os planos militares da NATO naquela região. Desde os primórdios da ocupação soviética que a cidade se tornou num importante polo militar russo, com várias unidades militares destacadas permanentemente na cidade, que também serve como casa da frota do mar Báltico. Segundo as autoridades da Lituânia, a Rússia tem armas nucleares no território do enclave e Moscovo tornou público a existência de uma unidade militar especializada em mísseis capazes de disparar ogivas nucleares.

Com o final da Guerra Fria, as autoridades russas tentaram tornar o território do enclave numa zona económica especial, com um regime fiscal mais favorável e com taxas alfandegárias muito baixas, de forma a estimular o investimento.

Agora, Moscovo diz que Vilnius introduziu restrições ao trânsito por caminho-de-ferro de mercadorias atingidas pelas sanções europeias no estratégico enclave que está separado do resto do território russo pela Bielorrússia e pela Lituânia.

"Exigimos o levantamento imediato destas restrições", disse a diplomacia russa em comunicado em que classificam estas medidas como "hostis".

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