Nas contas de uma ONG estão em Baku quase 1.800 pessoas ligadas aos combustíveis fósseis, mais “delegados do petróleo” do que dos 10 países mais vulneráveis ao aquecimento global
A primeira semana da cimeira do clima de Baku centrou-se em financiamento mas sem avanços e foi ainda marcada por acusações entre a França e o anfitrião Azerbaijão, sem que nada de substancial fosse decidido sobre o clima.
As negociações da conferência anual das Nações Unidas sobre o clima, a COP28, deverão terminar no dia 22 com um acordo financeiro, centrado no apoio aos países mais pobres e que irá substituir o anterior compromisso de 100 mil milhões de dólares por ano 2020-2025.
Em 2022, o último valor fornecido pela OCDE, os países ricos forneceram 116 mil milhões de dólares em ajuda climática, cumprindo a sua promessa com dois anos de atraso.
No novo objetivo de financiamento para os países em desenvolvimento (“Novo Objetivo Coletivo Quantificado” ou NCQG), que substitui o atual no próximo ano, os países pobres pedem que o objetivo seja multiplicado por mais de dez, para 1.300 mil milhões, valor essencialmente da responsabilidade dos países ricos.
Um projeto sobre o novo financiamento preparado durante um ano pelo Egito e pela Austrália foi rejeitado liminarmente pelos países pobres e para já ainda não há um acordo. Países como a França ou a Alemanha têm invocado dificuldades orçamentais para se conterem nos apoios, e os Estados Unidos deverão sair da Organização das Nações Unidas para o Clima com a vitória nas presidenciais de Donald Trump.
E também se tem levantado a necessidade de rever a lista dos países que contribuem. A ministra do Ambiente e Energia de Portugal, Maria da Graça Carvalho, disse em Baku defender o alargamento dos países que contribuem para o financiamento global da mitigação do aquecimento global.
"Não se compreende que países como a China ou a Arábia Saudita continuem a ser considerados países em desenvolvimento, com direito a receber ajudas para as alterações climáticas", disse.
Numa semana de negociações lentas, de dificuldade de os ativistas se expressarem, não faltaram também criticas contra o regime político e a economia petrolífera do país anfitrião. Mas as criticas que mais marcaram a semana envolveram o Presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, que retomou “guerras” com a França envolvendo territórios ultramarinos, nomeadamente a Nova Caledónia, o que levou a ministra francesa da Transição Ecológica, Agnès Pannier-Runacher, a cancelar a participação na COP29.
Outra frase do Presidente que levantou polémica foi quando disse, logo na abertura da COP, que os recursos naturais são uma “dádiva de Deus”, seja o petróleo, o gás, o vento, o sol ou o ouro.
Numa cimeira com poucos chefes de Estado ou de Governo presentes, a reunião serviu também para líderes ocidentais declararem abertamente em Baku que pretendem aplicar o travão e não o acelerador na questão da luta climática (primeiros-ministros italiano e grego).
Apesar de terem sido adotadas as novas regras da ONU para o controverso mercado dos créditos de carbono, logo no primeiro dia, o que marcou também a cimeira foi a presença e as palavras do secretário-geral da ONU, António Guterres, que pediu “muito mais dinheiro” para o Fundo de Perdas e Danos, criado há dois anos e destinado a apoiar os países vítimas de catástrofes naturais.
E em Baku apelou também a novos impostos sobre o transporte marítimo e de aviação para ajudar os países pobres a financiar a transição climática.
“Os poluidores devem pagar”, disse Guterres no seu discurso de abertura da COP29.
Segundo a organização na cimeira de Baku estão inscritas 66.000 pessoas, metade delas delegados e 30.000 observadores. Três mil são jornalistas.
Nas contas de uma ONG estão em Baku quase 1.800 pessoas ligadas aos combustíveis fósseis, mais “delegados do petróleo” do que dos 10 países mais vulneráveis ao aquecimento global.
Numa carta aberta um ex-secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, entre outros responsáveis, denunciou a perda de eficácia das cimeiras do clima.