Cobiçado pelos «grandes», estuda contabilidade e brilha num histórico português

14 nov 2022, 23:53
Jota Silva

Jota Silva fez testes no Sporting e no Benfica e ainda despertou o interesse do FC Porto, mas cumpriu todo o percurso da formação na região de Aveiro. É aluno universitário e regressou esta época ao Beira-Mar, onde se destacou com cinco golos nos primeiros sete jogos.

"Conto direto" é a rubrica do Maisfutebol que dá voz a protagonistas dos escalões inferiores do futebol português. As vivências, os sonhos e as rotinas, contados na primeira pessoa.

Jota Silva, 20 anos, avançado do Beira-Mar

«Antes de entrar no futebol, os meus pais diziam que eu estava sempre a pedir para ir para o jardim jogar futebol. A minha mãe queria ensinar-me a andar de bicicleta e todas essas coisas consideradas normais, mas eu nunca queria, só queria brincar com uma bola. Quando fiz cinco anos, os meus pais inscreveram-me no Beira-Mar e foi aí que começou tudo.

Em janeiro de 2013, fui para o Gafanha. Depois, voltei para o Beira-Mar mais uma época e, mais tarde, fui de vez para o Beira-Mar, durante dois anos. Fui para o Gafanha porque era o meu último ano de futebol de 7, ia passar para infantil A e disseram-me que podia jogar um escalão acima - iniciados B - e assim já ia conseguir jogar futebol de 11. Fui intercalando entre futebol de 11 e de 7. Chego ao Tabueira em janeiro quando já era iniciado A.

Tive a sorte de ir a muitos testes a clubes grandes. Passei em dois ou três, queriam que ficasse lá e até negociaram com o meu pai. O que teve mais interesse foi o Sporting. O Benfica também quis que fosse lá treinar e fui uma vez. O FC Porto também quis, mas nunca cheguei a ir lá. Mas fui à Academia do Sporting e passei nos testes. Tentaram negociar com o meu pai, mas eu era demasiado novo e as negociações nunca foram para a frente. Iria ficar muito longe de casa e sugeriram que treinasse no Beira-Mar e jogasse ao fim de semana no Sporting, o meu pai achou que seria uma falta de respeito para o Beira-Mar e não queria fazer isso. Se tivesse de ser, iria acabar por acontecer.

Em iniciados e juvenis foi quando tive mais dificuldades, porque cresci demasiado tarde em relação aos outros, tinha menos força do que eles. Deixei de ser um jogador rápido, tinha passadas mais pequenas. Talvez, se estivesse na formação de um grande, poderia acontecer-me como a muitos e, como não amadureci rápido, teria de voltar para casa. Vi isso a acontecer com alguns amigos. Nunca vou saber o que aconteceria, podiam esperar que amadurecesse ou não, mas é completamente diferente fazer a formação nesses clubes, mesmo para o currículo. Tem prós e contras, mas como tive várias dificuldades nos clubes da zona de Aveiro, também as ia ter lá, embora também pudesse ter evoluído de outra maneira.

Jota terminou o percurso na formação com as cores do Taboeira (arquivo pessoal)

A minha alcunha sempre foi JP até chegar a sénior. Quando entrei no futebol sénior, no Alvarenga, começaram-me a chamar Jota e meteram o nome Jota em todo o lado. Acabei por aceitar a alcunha, mas até os meus amigos fora do futebol me perguntam, às vezes, porque me chamam isso. Mas até gosto.

A transição para sénior foi uma altura difícil. Já tinha crescido, voltei a ter confiança, até porque desci do campeonato nacional com o Gafanha para os distritais com o Taboeira. Nos juniores estava bem, o treinador Paulo Barros apostou em mim e é meu amigo até hoje, mas foi um ano complicado por causa da covid-19. No meu primeiro ano de juniores, embora fosse mais novo, já era titular. Estávamos a lutar para subir aos nacionais e o campeonato acabou a meio. No ano seguinte, tive algumas propostas em Aveiro, mas fiquei no Taboeira e criou-se uma competição sub-22. Competi pelo Taboeira, foi um ano sem muita piada, porque a competição parava algumas vezes.

Depois, quiseram-me ajudar a entrar num clube do Campeonato de Portugal, porque viram que tinha qualidade. Ia fazer uns treinos de captação no Marinhense, mas não sucedeu e o Taboeira falou com o treinador do Alvarenga e fui lá treinar uma semana antes do campeonato começar, nem tinha feito pré-época. O treinador gostou de mim, assinei na primeira semana de campeonato e até marquei na primeira jornada.

Foi um ano difícil, era um plantel muito jovem. Sou amigo de todos, éramos uma equipa muito unida e que jogava bem, independentemente dos jogos. Mas tive muitas dificuldades, o ritmo de sénior é completamente diferente, tive jogos bons e outros em que nem aparecia. O treinador deu-me confiança e aproveitei para dar tudo. Nunca perdemos por mais de um golo e os meus colegas que estavam há mais tempo no futebol sénior ajudavam-me. Um dos meus melhores amigos fora do futebol também estava lá e dava-me muitos conselhos. Tentei ganhar experiência. Mesmo sendo difícil destacar-me, foi bom noutros aspetos.

Ao serviço do Alvarenga, onde começou a carreira como sénior (arquivo pessoal)

Acabou a época, fui de férias e não sabia qual seria o meu futuro. Disse ao meu empresário que gostava de ficar por aqui porque estudo na Universidade de Aveiro. Mas, se não desse, tinha de arriscar. Este verão, apareceu a proposta do Beira-Mar e aceitei sem pensar duas vezes. Foi perfeito, ainda por cima é o clube onde comecei a jogar.

Estudo contabilidade. Não é muito complicado conciliar os estudos com o futebol. O mais difícil para mim é estudar. Os treinos são ao final do dia e as aulas de manhã ou ao início da tarde, por isso é fácil de conciliar. Costumo acordar de manhã e ir para a universidade, gosto de estar com os meus colegas, não gosto de ficar em casa e, ao final do dia, chega a melhor parte. Às 17h30 entro no complexo e treino às 18h30, depois acabo o treino e vou para casa descansar.

Por enquanto, o meu objetivo principal é ir atrás do meu sonho de ser jogador de futebol. Corro atrás disso. Ainda não estabeleci nenhuma meta de idade para escolher um dos dois caminhos. Cada vez mais há exemplos de jogadores que aparecem com mais idade. Não vou forçar nada. Quando sentir que já não estou a evoluir, vou refletir e pensar. Até lá, tenho mesmo muito para evoluir. Comparativamente com o ano passado, sinto que já cresci imenso e vou acreditar sempre, sem querer dar um passo maior que a perna, que tenho qualidade para chegar a um patamar superior.

Os golos no início de época deram confiança, mas também trouxeram responsabilidade. No Alvarenga, marquei nas duas primeiras jornadas e, depois, estive sem marcar quase até ao fim. Este ano, fui mais constante, consegui cinco golos em sete jogos e já estou há quatro sem marcar. O meu objetivo é não prolongar esta fase, estou mais maduro, mais responsável e acredito que vou voltar a marcar e fazer boas exibições. Quero aprender com os erros do passado e já vi que tenho capacidade para começar bem a época, mas tenho de manter ou aumentar o nível até ao final.

Na Taça de Portugal, todas as equipas têm o objetivo de ir o mais longe possível, ou apanhar um grande e, se der, ganhar. Vamos jogar contra o Académico de Viseu, já é um grande clube, de II Liga, vai ser um jogo bom, contra uma equipa de dois escalões acima. Vai ser um bom teste e vamos estar com a motivação de que podemos apanhar o FC Porto na eliminatória seguinte, que é em casa.

No campeonato, queremos voltar a ter maior regularidade e andar lá em cima. Se der para ir à fase de subida, era incrível. Primeiro, queremos manter, mas acreditamos nos dois primeiros lugares.

Jota Silva com a camisola do Beira-Mar, na formação (arquivo pessoal)

Já joguei a ponta de lança e extremo, onde me sinto mais confortável, nunca fui ponta de lança na formação, a primeira vez foi no ano passado. Mas só quero entrar dentro de campo e dar tudo. Já me safo melhor, mas gosto mais de jogar a extremo esquerdo ou atrás do avançado. Sou um jogador rápido, que pode desequilibrar e tenho faro de golo.

Temos uma brincadeira de balneário. Quando passam música no balneário, costumo fazer aquelas danças populares do Tik Tok. Gosto de dançar e brincam comigo por causa disso. Sou uma pessoa de quem costumam gostar. Sou tímido, não costumo chegar a algum lado e falar muito. Até me sentir à vontade, sou muito respeitador, até perceber que posso passar uma certa linha com as pessoas e ser mais engraçado. Em todos os clubes onde estive fiz amigos e dei-me bem com toda a gente.

O meu objetivo é conseguir fazer vida apenas do futebol, I ou II Liga. Ainda não sei onde quero parar, vou ver até onde tenho potencial para chegar, mas não quero chegar a altos patamares e ver que afinal não tenho nível para lá jogar. Quero ir subindo, estar num plantel onde possa jogar e divertir-me sempre. Com certeza, ficarei feliz com a carreira que irei fazer.»

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