Angelo Becciu provocou um rombo de 139 milhões de euros com a compra de um edifício de luxo em Londres. O Papa Francisco teve mão pesada, mas o clérigo não aceita
O Conclave, o evento onde cardeais se reúnem para eleger um novo Papa, não é apenas um momento de grande solenidade para a Igreja Católica, mas também um terreno fértil para controvérsias internas. E, como era de se esperar, a próxima reunião, que ainda nem começou, não será exceção.
O cardeal italiano Angelo Becciu quer participar na eleição papal, mas isso coloca à prova uma importante decisão do Papa Francisco, que anos antes tinha ordenado o seu afastamento do cargo.
Becciu, de 76 anos, não aparece na lista oficial dos cardeais com menos de 80 anos aptos a votar. Em 2020 o cardeal viu-se envolvido num escândalo financeiro sem precedentes no Vaticano, relacionado com a compra de um edifício de luxo em Londres que causou um rombo de 139 milhões de euros nas finanças da Santa Sé. A gravidade da situação levou o Papa Francisco a tomar uma atitude severa: não só demitiu Becciu do cargo de cardeal, como também lhe retirou o direito de participar em futuros conclaves.
A decisão radical foi considerada uma das muitas atitudes mais controversas do pontificado de Francisco, que procurava corrigir falhas graves na administração da Igreja.
Becciu, no entanto, não aceitou o afastamento de braços cruzados. Esta terça-feira, o italiano compareceu à primeira assembleia de cardeais e deu uma entrevista ao jornal italiano L'Unione Sarda, argumentando que o Papa não tinha o direito de o excluir da eleição papal, uma vez que o próprio não havia renunciado explicitamente ao cargo.
"Ao convocar-me para o último consistório [assembleia de cardeais por ocasião da nomeação de novos cardeais], o Papa reconheceu as minhas prerrogativas cardinalícias, na medida em que não houve nenhuma vontade explícita de me excluir do conclave, nem houve qualquer pedido explícito por escrito de minha renúncia. A lista [dos eleitores do conclave] publicada pela Santa Sé não tem qualquer valor e deve ser considerada como tal", afirmou.
Segundo Becciu, a própria lista publicada pela Santa Sé, que o excluía do Conclave, “não tem valor” e deveria ser considerada como tal. O cardeal insiste na sua inocência e acredita que a sentença de prisão que recebeu em 2023, por fraude fiscal, é uma acusação injusta, a qual está a recorrer.
O cardeal italiano, que durante sete anos foi o número três da hierarquia do Vaticano, era visto como um forte candidato à sucessão de Francisco. No entanto, a sua ascensão foi interrompida abruptamente após o escândalo financeiro que abalou as estruturas da Igreja.
Becciu não é o único cardeal a ter sido afastado por Francisco. Juan Luis Cipriani, arcebispo emérito de Lima, foi forçado a aposentar-se após acusações de abuso sexual a menores e, embora tenha sido silenciado pelo Vaticano, o seu veto à participação em futuros conclaves foi decidido em segredo.
A decisão sobre a eventual participação do italiano Angelo Becciu terá de ser agora tomada pelo decano do Colégio Cardinalício, Giovanni Battista Re, que é uma das autoridades do Vaticano até à nomeação de um novo Papa.